Autora: Alice Walker
Título: A cor púrpura
Tradutora: Tânia Ganho
N.º de páginas: 340
Editora: Suma de Letras
Edição: Outubro 2018
Classificação: Romance epistolar
N.º de Registo: (3318)
OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐
A Cor Púrpura, romance epistolar de Alice Walker, dá voz a Celie, uma rapariga “negra de uma família pobre do sul rural dos Estados Unidos”, órfã de mãe. Escreve cartas a Deus. Escreve como fala. Como sabe. A sua linguagem é pobre, ingénua, crua. Reflecte miséria, escravidão, crueldade, indiferença. O marido fecha-lhe o mundo. “Olha pra ti. Tu é preta, pobre, feia, tu é mulher. Possa, tu não é nada!” (p. 246)
A partir de certo ponto, entram as cartas de Nettie. A irmã mais nova que fugiu de casa. O leitor divide-se: crueldade nos Estados Unidos, missão em África. Duas vozes, dois mundos. Feminismo, liberdade, violência, racismo, colonialismo — tudo pulsa no contraste.
Celie aceita o que lhe coube: solidão, traição, violência. Mas nas cartas há uma fissura — um desejo de liberdade. Quando conhece Shug Avery, essa fissura abre-se em horizonte. O livro cresce com ela. A menina de 14 anos, submissa e violentada, transforma-se. No fim, é uma mulher independente. Admirável. E não está só: Sofia e outras mulheres, a sororidade que resiste.
Na tradução para português, Tânia Ganho arriscou ao manter erros, marcas de oralidade, abreviaturas. Na nota introdutória, confessa o desafio: “O romance oscila, assim, entre dois níveis de linguagem muito diferentes, um pautado pelas marcas de oralidade da comunidade negra rural e pelos erros de quem teve pouca instrução primária, e o outro regido pelas normas rígidas da língua que é, neste contexto, assumidamente a língua do colonizador.”
Publicado em 1982, A Cor Púrpura valeu a Alice Walker o Prémio Pulitzer de Ficção (1983) e inspirou adaptações para cinema e teatro musical, confirmando a sua relevância cultural.
A Cor Púrpura é resiliência. É esperança. Escrita simples. Violência profunda. Camadas que nos obrigam a reflectir sobre os Direitos Humanos. Hoje, mais do que nunca, continua a ser necessário. Um livro que nos convoca a escutar vozes silenciadas. E a reconhecer a força transformadora da narrativa.