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03 fevereiro, 2022

𝑨𝒖𝒔𝒄𝒉𝒘𝒊𝒕𝒛, 𝑪𝒊𝒅𝒂𝒅𝒆 𝑻𝒓𝒂𝒏𝒒𝒖𝒊𝒍𝒂, de Primo Levi

 

Autor: Primo Levi
Tradutores: Diogo Madre Deus e Maria do Rosário Pedreira
Título: Auschwitz, Cidade Tranquila
N.º de páginas: 166
Editora: D. Quixote
Edição: Setembro 2021
Classificação: Não ficção
N.º de Registo: (BE)


OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐⭐


Auschwitz, Cidade Tranquila integra dez contos e dois poemas. Mais uma obra de não-ficção que nos conta o que aconteceu com o rigor que Primo Levi já nos habituou e que deve ser lido para que a memória não se apague. A verdade dos factos aqui relatada foi vivida, sofrida e observada. O autor, após a libertação, para se redimir da dor que as memórias dos campos de concentração lhe causam, tenta escrever, tenta testemunhar tudo o que viveu, tudo o que observou. Foi um período difícil, as consequências da sobrevivência foram devastadoras.

Estes contos percorrem um tempo de cerca de 30 anos. Há contos que narram de forma inequívoca o que viveu em Auschwitz, outros mais ficcionados, dizem-no também, mas é nas entrelinhas que descortinamos os factos ocorridos no Lager.
“A trinta anos de distância torna-se difícil reconstituir a espécie de exemplar humano que correspondia, em novembro de 1944, ao meu nome ou melhor ao meu número174517.”      (p. 97, Cério)

O conto que dá o título à obra, é um paradoxo. Com tudo o que sabemos, e com tudo o que Levi viveu e presenciou, como justificar o epíteto de “cidade tranquila”? Levi ajuda-nos a compreender: se para uns foi o inferno, para outros, os que colaboraram, os que não quiseram ver foi efectivamente uma cidade tranquila.

A apresentação de Fabio Levi e Domenico Scarpa, responsáveis pela organização do livro, é clara quanto à intenção de Primo Levi ao escrever (e muito) sobre o Lager: “Vítima, espectador e testemunha, Levi também sente que as suas descrições, a sua narração e a sua pesquisa nunca chegam a ser suficientes: por mais transparentes, precisas e perspicazes que elas sejam, é sempre pouco face à demasiada dor, à dor excessiva daquele lugar. É por isso que ao longo dos anos experimentará tantos pontos de vista sobre Auschwitz: a fim de o restituir no modo mais absoluto possível.” (pp.15 e 16)


É por isso que o leio. É por isso que recomendo as suas obras.



27 janeiro, 2022

Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto

 


Holocaust Encyclopedia - United States Holocaust Memorial Museum
(La selección de judíos húngaros en el campo de exterminio de Auschwitz-Birkenau, mayo de 1944.)



Fila Escura

Será possível escolher-se um percurso mais absurdo?
No Corso San Martino há um formigueiro
A meio metro dos carris do elétrico,
E precisamente na cabeça do carril
Estende-se uma longa fila escura,
Toca-se uma com outra formiga,
Talvez a espiar a sua vida ou fortuna.
Enfim, estas estúpida irmãs 
Obstinadas lunáticas obreiras
Escavaram na nossa a sua cidade,
Traçaram sobre os nossos os seus carris,
E percorrem-nos sem receio
Apressadas atrás dos seus subtis afazeres
Sem se preocuparem com
        Não quero escrevê-lo,
Não quero escrever sobre esta fila,
Não quero escrever sobre nenhuma fila escura
                     
                                                                     13 de agosto de 1980

Primo Levi,  Auschwitz, Cidade Tranquila



20 janeiro, 2020

Os que Sucumbem e os que se Salvam, de Primo Levi



OPINIÃO

Com este livro concluí a leitura da trilogia de Auschwitz. Quarenta anos depois de ter escrito Se Isto é um homem, Primo Levi aborda de novo a problemática do Holocausto. Desta vez, tenta dar resposta às muitas questões que se lhe colocam constantemente sobre o extermínio causado pelos nazis. 

“Teremos sido capazes, nós sobreviventes, de compreender e de fazer compreender a nossa experiência?” (p.41)

Temos uma análise muito lúcida e dolorosa sobre os acontecimentos no Lager, sobre as atrocidades praticadas, sobre a desumanização, a humilhação e a “violência inútil” exercidas sobre os prisioneiros. No último capítulo “Cartas de alemães”, e no seguimento da tradução e publicação do seu livro Se Isto é um homem, na Alemanha (1959), Primo Levi, aborda também a questão da culpa em relação à opressão nazi. Nas várias cartas que recebeu e nas que transcreveu verifica-se que foi sentida e assumida por alguns, ignorada e negada por outros. 
Como o autor tem receio que estes factos caiam no esquecimento quer por parte dos sobreviventes como forma de atenuar a dor, quer por parte dos opressores para se distanciarem dos factos e assim aliviarem a culpa e a vergonha (se é que alguma vez as sentiram), então lega-nos o seu testemunho, nos dois primeiros livros, e as suas reflexões neste último para que a “memória colectiva” permaneça viva e passe de geração em geração. 

“À distância de quarenta anos, a minha tatuagem tornou-se parte do meu corpo. Não me vanglorio nem me envergonho dela, não a exibo nem a escondo. Mostro-a de má vontade a quem mo pede por simples curiosidade; prontamente e com ira a quem se declara incrédulo. Os jovens muitas vezes perguntam-me porque é que não a mando apagar, e isto espanta-me: porque havia de fazê-lo? Não somos muito no mundo a trazer este testemunho.” (p.138)



20 janeiro, 2019

A Trégua de Primo Levi


SINOPSE

Primo Levi inscreveu o seu nome entre os maiores escritores do século XX, a partir da experiência de prisioneiro e sobrevivente do campo de extermínio de Auschwitz. A sua prosa literária tem a força expressiva das narrativas em que a voz da testemunha se alia ao trabalho da memória e da recriação da vida nos limites máximos da dor e da destruição.

A Trégua, continuação de Se Isto é um Homem, é considerado por muitos críticos a sua obra-prima: diário da viagem rumo à liberdade, depois de dois anos de internamento no lager nazi, este livro, mais do que uma simples evocação biográfica, é um extraordinário romance picaresco.

A aventura movimentada e pungente por entre as ruínas da Europa libertada - desde Auschwitz, através da Rússia, da Roménia, da Hungria e da Áustria, até Turim -, desenrola-se ao longo de um itinerário tortuoso, pontilhado de encontros com pessoas pertencentes a civilizações desconhecidas e vítimas da mesma guerra: desde Cesare amigo de toda a gente, charlatão, trapaceiro, temerário e inocente, até aos bíblicos comboios do Exército Vermelho desarmado. 

A epopeia de uma humanidade reencontrada, que procura uma nova vontade de viver depois de ter atingido o limite extremo do horror e da miséria.



OPINIÃO

Neste segundo livro da trilogia de Auschwitz, Primo Levi narra o que ele e muitas outras pessoas viveram durante dez longos meses: de 27 de Janeiro de 1945 (libertação do campo pelos russos) até 19 de Outubro (chegada a casa em Turim). Foram meses de alegria (num primeiro momento), dor, sofrimento, fome, angústia e ansiedade. Num relato duro e cru e descritivo da realidade ficamos surpreendidos, ou não, pelo caos e pela miséria existentes nos países que os ex-prisioneiros atravessaram ao longo da viagem (Rússia, Eslováquia, Roménia, Hungria, Áustria, Alemanha e Itália). É incompreensível que numa Europa semi-destruída ainda prevalecesse o absurdo das formalidades e o fechar de olhos à situação destes “passageiros” que tão urgentemente necessitavam de regressar a casa, a uma vida normal. 
Se bem que de forma diferente em relação ao primeiro livro, Se Isto É Um Homem, porque nada iguala o sofrimento vivido num campo de concentração, o autor, neste livro, continua a testemunhar magistralmente o horror da guerra e o desrespeito da dignidade humana. 

“ Após o ano de Lager, de sofrimento e de paciência; após o gelo e a fome e o desprezo e a arrogante companhia do grego; após as doenças e a miséria de Katowice; após as transferências insensatas, por que nos sentíamos condenados a errar eternamente através dos espaços russos, como inúteis astros apagados; após o ócio e a nostalgia acerba de Stárie Dorogui, estávamos de novo em subida, portanto, em viagem para cima, a caminho de casa. “ (pág. 248) 

“Cheguei a Turim a 19 de Outubro… Reencontrei uma cama larga e limpa, que à noite (instante de terror) cedeu macia debaixo do meu peso. Mas só ao cabo de muitos meses se desvaneceu em mim o hábito de caminhar com o olhar fixo no chão, como que à procura de alguma coisa para comer ou para embolsar rapidamente e vender por pão; e não cessou de me visitar, a intervalos ora curtos ora espaçados, um sonho pleno de terror.” (pág. 285)


04 fevereiro, 2018

Se Isto é um Homem de Primo Levi




Livro autobiográfico e primeiro de uma trilogia. Primo Levi narra o período que passou num campo de concentração alemão, o Lager. De forma objectiva e rigorosa descreve os comportamentos do homem submetidos a condições de extrema violência, os modos de vida, as “actividades” praticadas como meio de sobrevivência, as doenças, a “selecção”, a gestão dos campos. Ao longo destas páginas, Primo Levi, magistralmente, revela-nos a maldade humana e o horror do extermínio, mas ressalva também a presença de alguma bondade humana. 
De leitura obrigatória, este livro levanta questões que hoje, estão de novo presentes na nossa sociedade. Afinal, qual é o valor do ser humano? Se isto é um Homem está, de novo, ou nunca deixou de estar, na ordem do dia.