Neste romance de “várias geografias”, erramos pelas ruas de Buenos Aires, de Berlim, de Marselha, de Beirute, de Lisboa onde os dois protagonistas se reencontram dez anos mais tarde e de Maputo.
No reencontro que dura dez dias, em Lisboa, os dois desenovelam memórias, nem sempre coincidentes, (“Ao sexto dia fiz esta experiência: seria a incompatibilidade das nossas recordações uma questão de distância? Geográfica, temporal, emocional?”(p. 199)), e, nesse recordar, a autora é exímia na narração dos acontecimentos vividos e inventados. Misturando tempos e açcões passados e presentes, o leitor deixa-se conduzir página após página e acompanha “os percursos que preenchem dez dias” definidos por Joana, a protagonista ou a escritora? É difícil discernir se acompanhamos a personagem ou a própria autora, já que ambas se chamam Joana, têm o prazer da escrita e da deambulação por geografias diversas e denotam preocupação ecológica. Pelo que as fronteiras entre realidade e ficção poderão ser muito ténues. Mas isso é importante? Não, não é.
O importante mesmo é apreciar a escrita e deixar-se inebriar pela história narrada, a história de amor vivida por um casal jovem e moderno “Ele e eu fomos próximos da forma desapegada e intermitente que é a única que tenho de ser próxima de alguém.”; pela forma como a narradora nos revela a sua decisão de não ser mãe, uma “não-mãe” por questões ambientais: “É fácil encontrar estudos que defendem que a maior contribuição para a redução da emissão de carbono de um indivíduo num país industrializado é não ter filhos” (p. 197); pela forma como se agarra à inevitável questão “Como foi que o nosso amor anoiteceu?”.
A História de Roma é um livro com várias camadas entrelaçadas que levanta imensas questões e nos faz reflectir sobre o mundo, a sociedade em que vivemos.
É um livro que revela uma história de amor (anagrama de roma) que, de lugar em lugar, descreve vivências, emoções, desejos, fantasias, encontros e desencontros, buscas obsessivas, mas é também a história da filha que nunca tiveram, ela, Joana, e ele, o rapaz e artista suíço que conheceu nas ruas de Buenos Aires.
“(…) acreditava que, se um dia fosse mãe, lhe daria o nome de lugar. (…) Odessa ou Roma, se rapariga”. (p. 11)
É, em suma, uma história de relações, de identidades, de lugares, de pessoas recuperada pelas memórias verídicas e imaginadas de Joana. Joana que até podia chamar-se Lisboa.
Recomendo muito a leitura deste livro, deste e de todos os que a autora já publicou.