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14 abril, 2025

Mario Vargas LLosa (1936 - 2025)

 





Morreu, aos 89 anos, em Lima, o escritor Mario Vargas Llosa. Prémio Nobel da Literatura em 2010 e "imortal" da Academia Francesa (2023), o autor peruano-espanhol confessou que gostaria de ser lembrado pela sua escrita.

Nascido em Arequipa, a 28 de março de 1936, Jorge Mario Pedro Vargas Llosa foi também político, jornalista, ensaísta e professor universitário.

Além do Nobel da Literatura, foi distinguido com vários outros prémios como o Rómulo Gallegos (1967), Princesa das Astúrias (1986), Planeta (1993), Miguel de Cervantes (1994), Jerusalém (1995), National Book Critics Circle Award (1997), PEN/Nabokov (2002) e Prémio Mundial Cino Del Duca (2008). Recebeu vários graus de doutor 'Honoris Causa'.

Em 2024, já depois de ter regressado ao país natal, publicou o seu último romance, Dedico-lhe o meu silêncio. 


18 setembro, 2024

𝑫𝒆𝒔𝒈𝒓𝒂ç𝒂, de J. M. Coetzee

 



Autor: J. M. Coetzee
Título: A Desgraça
Tradutor: José Remelhe
N.º de páginas: 234
Editora: D. Quixote
Edição (7.ª): Maio 2023
Classificação: Romance
N.º de Registo: (3484)


OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐⭐


Dizem que é a sua obra-prima. Se é a “sua obra-prima”, não o posso confirmar porque ainda não li todos os seus livros. Mas que é uma obra-prima, é com toda a certeza.

Desgraça narra a história de sobrevivência de David Lurie, um professor de Literatura na Universidade Técnica da Cidade do Cabo, África do Sul e retrata o conjunto de tragédias que ocorrem ao longo da obra, numa sociedade decadente.
É pela voz de um narrador colado à pele do protagonista, que nas duas primeiras linhas nos é apresentado David Lurie “Para um homem de sua idade, cinquenta e dois anos, tem resolvido bastante bem, segundo ele, o problema do sexo”.

Desde logo, Coetzee antecipa o problema que conduzirá o professor universitário a uma auto-destruição que por razões óbvias não vou divulgar. Posso, contudo, referir que num país que enfrenta uma tensão sócio racial, pós-apartheid, os preconceitos dominam, a vingança estabelece-se e as acusações sobrepõem-se à realidade. O professor de poesia romântica, homem branco, culto e grande entusiasta da cultura europeia, vai passar por um processo complexo de exoneração. Humilhado perante os seus colegas e alunos decide não se defender e abandonar o ensino. Sai da cidade e vai viver com a sua filha Lucy, numa pequena propriedade rural. A relação não é fácil entre eles. E a situação agrava-se quando David e Lucy são assaltados e agredidos de forma inominável por três homens de raça negra. A partir daqui Coetzee é sublime na exploração dos conflitos raciais marcados pela segregação e pelos costumes geracionais.
(…) foi isso que os invasores conseguiram; foi isso que fizeram a esta jovem confiante e moderna. Tal como uma nódoa, a história espalha-se pela região. Não a história dela, mas sim a deles: eles é que mandam. Como a colocaram no seu lugar, como lhe mostraram aquilo para que serve uma mulher.” (p. 125)

Coetzee, numa escrita incisiva, sóbria e sincera, coloca o leitor numa situação ambígua que, ora sente compaixão pela personagem, ora o critica pelas atitudes e decisões que toma. Ao longo da narrativa e à medida que os problemas se vão avolumando, Lurie não consegue resolvê-los, não consegue resolver-se. Tudo isto faz que o leitor anseie pelo final. E que final. Que metáfora da vida.

Recomendo muito. Para além da força das palavras nos assuntos abordados, gosto sobremaneira da forma como estruturou a narrativa e do recurso ao discurso indirecto livre e aos diálogos curtos e secos que colocam a narrativa num patamar superior.

 


29 agosto, 2024

𝑼𝒎 𝑶𝒖𝒕𝒓𝒐, Imre Kertész

 

Autor: Imre Kertész
Título: Um Outro 
Tradutor: Ernesto Rodrigues
N.º de páginas: 97
Editora: Editorial Presença
Edição: Junho 2009
Classificação: Não ficção
N.º de Registo: (3613)



OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Um outro é ao mesmo tempo o diário de um escritor em busca de uma identidade criativa e existencial; a crónica de um país também em busca de uma orientação; um conjunto de observações sobre o seu percurso literário, a civilização europeia, e o seu país, a Hungria; notas para futuros romances; lembretes de memórias fugazes de algumas viagens em trabalho; lembranças dos campos de concentração (esteve em dois); reflexões sobre o anti-semitismo, o sentimento nacional, o extermínio, a verdade e a mentira.

Após ter sobrevivido ao Holocausto, Kertész foi basicamente condenado ao silêncio durante quarenta anos pelo partido comunista que na altura acedeu ao poder, tendo os seus livros sido ignorados. Com a queda do muro de Berlim, deixa o seu país e, e vai viver para a capital alemã.
“Abriu-se, assim, a porta da cela em que me fecharam durante quarenta anos, e pode dar-se que seja bastante para me perturbar. Não se pode viver a liberdade onde se viveu o cativeiro”. (p. 10)

Por isso, neste livro Kertész está “numa relação de reciprocidade com a minha (sua) vida. Esta relação tem um nome: sujeição – Se fosse só isso, até ia bem. Mas que fragmento desta vida estilhaçada diz “eu”?” (p. 13) . É um autor em busca de um outro “eu”, isto é, em busca da sua identidade e da compreensão da sua realidade. “Eu, um outro” é um verso de Rimbaud (Je, est un autre) que o autor cita várias vezes ao longo dos seus textos e consta também como epígrafe. Aliás, as quatro epígrafes selecionadas remetem claramente para a problemática do “Eu”.

Ao longo das páginas, os seus apontamentos, apresentados como um caleidoscópio, reflectem claramente a ideia de alteridade. O autor apresenta-nos o seu entendimento do mundo quer através das suas vivências presentes, das suas memórias quer ainda da sua natureza criativa, questionando-se sempre sobre quem é, o que foi a sua vida (“o que é a vida perfeita?”), as suas obras, a sua qualidade como escritor.

Kertész foi considerado de forma crítica por alguns como sendo o “autor do Holocausto”. É um facto que os seus livros desenvolvem essa temática, mas vão muito para além disso. Como já referi, e neste livro fica bem claro, a sua preocupação é o questionamento das ideologias, das ditaduras, do horror, da sua interpretação do mundo.

Posso concluir que Kertész é um homem amargurado e sofredor que vive em constante questionamento, que duvida do que pensa, que não compreende a sua vida, que se autocritica (“ o eu estranho enraizado em mim o moralista que se autojustifica, o criador de fábulas mentiroso.” (p. 75)), que não se interessa pelo ser que é, que não sabe quem é. Mas uma coisa é certa e é ele próprio que a confessa “ tenho uma só identidade, a identidade da escrita.” (p. 46)
Felizmente, que esta identidade existe, pois só assim podemos desfrutar da sua obra. Não é uma leitura fácil. O texto não é cronológico, encontra-se entrecortado (em jeito de apontamentos) e saltita no tempo e nos espaços.

Vou procurar outros livros do autor.



29 dezembro, 2023

Nobel da Literatura | 2001 - 2020

 





2001 - Sir Vidiadhar Surajprasad Naipaul (1932–2018) | Reino Unido | Romance, Ensaio

“Por ter unido narrativa perceptiva e escrutínio incorruptível em obras que nos obrigam a ver a presença de histórias suprimidas”


2002 - Imre Kertész (1929–2016) | Hungria | Romance

“Pela escrita que defende a frágil experiência do indivíduo contra a bárbara arbitrariedade da história”


2003 - John M. Coetzee (1940–) | Austrália | Romance, Ensaio, Tradução

“Que em inúmeras formas retrata o surpreendente envolvimento do estranho”


2004 - Elfriede Jelinek (1946–) | Áustria | Romance, Drama

“Pelo seu fluxo musical de vozes e contra-vozes em romances e peças que com extraordinário zelo linguístico revelam o absurdo dos clichês da sociedade e o seu poder subjugador”


2005 - Harold Pinter (1930–2008) | Reino Unido | Drama, Roteiro

“Que nas suas peças desvenda o precipício sob a tagarelice quotidiana e força a entrada nos quartos fechados da opressão”


2006 - Orhan Pamuk (1952–) | Turquia | Romance, Roteiro, Ensaio

“Que na busca da alma melancólica da sua cidade natal descobriu novos símbolos para o choque e o entrelaçamento de culturas”


2007 - Doris Lessing (1919–2013) | Reino Unido | Romance, Drama, Poesia, Conto, Memórias

“Aquela epicista da experiência feminina, que com ceticismo, fogo e poder visionário submeteu uma civilização dividida ao escrutínio”


2008 - Jean-Marie Gustave Le Clézio (1940–) | França | Romance, Conto, Ensaio, Tradução

“Autor de novas partidas, aventura poética e êxtase sensual, explorador de uma humanidade além e abaixo da civilização reinante”


2009 - Herta Müller (1953–) | Alemanha | Romance, Poesia

“Que, com a concentração da poesia e a franqueza da prosa, retrata a paisagem dos despossuídos”


2010 - Mario Vargas Llosa (1936–) | Peru, Espanha | Romance, Conto, Ensaio, Drama, Memórias

“Pela sua cartografia das estruturas de poder e pelas suas imagens incisivas da resistência, revolta e derrota do indivíduo”


2011 - Tomas Tranströmer (1931–2015) | Suécia | Poesia, Tradução

“Porque, através das suas imagens condensadas e translúcidas, nos dá um novo acesso à realidade”


2012 - Mo Yan (1955–) | China | Romance, Conto

“Com realismo alucinatório mescla contos folclóricos, história e contemporaneidade”


2013 - Alice Munro (1931–) | Canadá | Conto

“Mestre do conto contemporâneo”


2014 - Patrick Modiano (1945–) | França | Romance

“Pela arte da memória com a qual evocou os destinos humanos mais inapreensíveis e desvendou o mundo da vida da ocupação”


2015 - Svetlana Alexievich (1948–) | Bielorrússia | História, Ensaio

“Pela sua escrita polifónicos, um monumento ao sofrimento e à coragem em nosso tempo”


2016 - Bob Dylan (1941–) | estados Unidos | Poesia, Composição musical

“Por ter criado novas expressões poéticas dentro da grande tradição da canção americana”


2017 - Kazuo Ishiguro (1954–) | Japão | Romance

“Que, em romances de grande força emocional, descobriu o abismo sob o nosso sentido ilusório de ligação com o mundo”


2018 - Olga Tokarczuk (1962–) | Polónia | Romance, Poesia, Ensaio

“Por uma imaginação narrativa que com paixão enciclopédica representa o cruzamento de fronteiras como forma de vida”


2019 - Peter Handke (1942–) | Áustria | Romance, Drama

“Por um trabalho influente que com engenho linguístico explorou a periferia e a especificidade da experiência humana”


2020 - Louise Glück (1943–2023) | Estados Unidos | Poesia, Ensaio

“Pela sua inconfundível voz poética que com austera beleza torna universal a existência individual”




28 julho, 2023

𝑶 𝑷𝒐𝒍𝒂𝒄𝒐, de J. M. Coetzee

 

Autor: J. M. Coetzee
Título: O Polaco
Tradutor: J. Teixeira de Aguilar
N.º de páginas: 149
Editora: D. Quixote
Edição: Maio 2023
Classificação: Romance
N.º de Registo: (3460)



OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Este romance está dividido em seis capítulos e a história é narrada por entradas numeradas. Passo a explicar:

Capítulo UM
“1. A mulher é a primeira a causar-lhe problemas. Para pouco depois se lhe seguir o homem.
2. No início ele tem uma ideia perfeitamente nítida de quem é a mulher.

(…)”
Esta estrutura atribui à narrativa uma cadência como se de uma partitura se tratasse, como se fosse composta por andamentos curtos ou longos e pausas; e torna-a aparentemente, simples. Porém, à medida que o leitor avança, intui que a complexidade, apesar da escrita concisa e simples, das personagens vai num crescendo, que o carácter reflexivo se adensa e que a história de (não) amor narrada é cada vez mais desconcertante. “Há qualquer coisa de contranatura em amar sem esperar ser amado.” (p.85)

O Polaco, pianista, de setenta e dois a os, é convidado a actuar em Barcelona. Aí conhece e apaixona-se pela organizadora do evento, Beatriz, uma mulher casada, de cinquenta anos. É este relacionamento que Coetzee vai magistralmente desenvolver.
Vai manipular os sentimentos e as emoções das duas personagens causando no leitor ora empatia, ora incompreensão. E é este jogo que torna sedutora e, simultaneamente, desconcertante a relação destas duas personagens. O leitor curioso com o desfecho, não despega e diverte-se, primeiro, com a perplexidade de Beatriz perante a paixão do pianista, e, depois, com a capacidade como impõe as suas vontades, como marca os encontros e os desencontros.
Coetzee é singular na abordagem às diferenças de idade e de cultura. Usa com mestria a ironia e o sentido de humor para realçar comportamentos e emoções.
O capítulo SEIS é composto exclusivamente de cartas e a última termina com um post scriptum: “P.S: Voltarei a escrever.” E eu prometo que voltarei a ler J. M. Coetzee.

Recomendo vivamente.





27 março, 2023

𝑫𝒖𝒂𝒔 𝑺𝒐𝒍𝒊𝒅õ𝒆𝒔. 𝑶 𝑹𝒐𝒎𝒂𝒏𝒄𝒆 𝒏𝒂 𝑨𝒎é𝒓𝒊𝒄𝒂 𝑳𝒂𝒕𝒊𝒏𝒂, de Gabriel García Márquez e Mario Vargas Llosa

 


Autores: Gabriel García Márquez e Mario Vargas Llosa
Título: Duas Solidões. O Romance na América Latina
Tradutor: J. Teixeira de Aguilar
N.º de páginas: 175
Editora: D. Quixote
Edição: Outubro 2021
Classificação: Conversa/testemunhos
N.º de Registo: (3371)


OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Duas Solidões. O Romance na América Latina é a transcrição do interessantíssimo embate comunicacional de dois vultos da literatura - Gabriel García Márquez (Gabo) e Vargas Llosa, ocorrido em setembro de 1967, em Lima, no Peru. Os dois escritores, já nomes promissores da literatura latino-americana, estavam em início de carreira e tinha acabado de sair o famosíssimo Cem anos de solidão.
Trata-se de uma conversa amena, elegante, esclarecedora e emocionante.
Fala-se da utilidade dos escritores, “Para que achas que serves tu como escritor?” (p. 41) perguntou Llosa logo no início da conversa; dos métodos de escrita; de convicções; do boom do romance latino-americano; do “boom de leitores”; de leituras, de influências; das próprias obras e daquilo a que se viria a chamar mais tarde de “realismo mágico”.

Para além desta conversa entre os dois Nobelizados (duas partes), a edição conta com três textos introdutórios e uma Nota preliminar. No final, conta ainda com quatro testemunhos, duas entrevistas e algumas fotografias.

Num dos textos introdutórios, Juan Gabriel Vásquez descreve desta forma brilhante os dois protagonistas: “Aqui está esse Vargas Llosa: o romancista-crítico, senhor de uma consciência exacerbada do seu ofício, sempre com o bisturi na mão. Ao lado, García Márquez faz grandes esforços para defender a sua imagem de narrador instintivo, quase selvagem, alérgico à teoria e mau explicador de si mesmo ou dos seus livros. (…) Ora bem, o diálogo é também uma encenação de duas maneiras diferentes de entender o ofício de romancista; (…) Por um lado, a generosidade intelectual de Vargas Llosa (…) e, por outro, a timidez de García Márquez” (pp. 20-21)

Penso que este livro destaca a importância da conversa quer para os leitores quer para futuros escritores e é revelador da genialidade dos seus autores, da amizade e do respeito entre ambos. É bonito perceber que entre os dois há uma enorme cumplicidade apesar das divergências existentes, como é natural.

Termino com uma resposta de Gabo a Llosa que se tornou numa das suas máximas principais: “Escrevo para que os meus amigos gostem mais de mim.”



27 junho, 2022

𝑨𝒔 𝒎𝒊𝒏𝒉𝒂𝒔 𝒍𝒆𝒎𝒃𝒓𝒂𝒏ç𝒂𝒔 𝒐𝒃𝒔𝒆𝒓𝒗𝒂𝒎-𝒎𝒆, de Tomas Tranströmer

 


Autor: Tomas Tranströmer
Título: As minhas lembranças observam-me
Tradutor: A.P.
N.º de páginas: 101
Editora: Sextante Editora
Edição: Setembro 2012
Classificação: Memórias e Poesia
N.º de Registo: (2741)



OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Trata-se de um pequeno livro de memórias do autor galardoado com o Premio Nobel da Literatura 2011. Para além do texto em prosa, a edição inclui fotografias do autor e de alguns dos seus textos manuscritos, dez poemas inéditos (os primeiros que escreveu) e um posfácio de Pedro Mexia.
As suas memórias, escritas quando tinha sessenta anos, incidem sobretudo sobre a sua infância e juventude, a sua educação, os seus hábitos e gostos e o despertar para a poesia.

Na sua narrativa, organizada em breves capítulos e sem ordem cronológica, perpassa uma certa humildade e sensibilidade ao relatar apenas pequenas lembranças, pormenores aparentemente sem muita importância para o leitor, mas que para o autor foram marcantes na sua formação. Não se registam grandes feitos, apenas recordações mais ou menos fiáveis, mais ou menos adulteradas quer pela memória quer pela emoção de reviver. E a sua primeira memória não é um facto, mas sim um sentimento.
“As primeiras vivências são, na sua maior parte, inacessíveis. Histórias recontadas, recordações de recordações, reconstituições que assentam na erupção de um estado de espírito.
A minha recordação datável mais antiga é a recordação de um sentimento. Um sentimento de orgulho. Fiz três anos, e disseram-me que isso era muito importante, que agora eu era grande.” (pp 11 e 12)

Percebemos com esta memória que se trata de uma pessoa sensível. Esta característica irá reforçar-se com a ausência da figura paterna ditada pelo divórcio dos pais e com a necessidade de se defender da hostilidade de alguns colegas e professores.
A vida recordada por Tranströmer é descrita com “rastos de luz”, como um cometa. Ele tenta recordar, mas há “regiões muito condensadas” que tornam a tarefa difícil. Assim, foca-se nos momentos de maior brilho e revela-se a criança curiosa, fascinada por museus, bichos, colecções de insectos, livros e bibliotecas; um garoto (9 anos) empenhado “ de alma e coração!” durante a guerra, “debruçado sobre o mapa da guerra que vinha no jornal” (p. 37) facilmente percebeu que ser nazi era mau “Os nazis eram tão desumanos como eu imaginava.” (p. 40); o adolescente que criou amizades com professores e que se refugiou nas traduções dos clássicos nas aulas de Latim.

“Já os meus professores, «os velhos», como nós lhes chamávamos, mantêm-se velhos na minha memória, embora os mais velhos tivessem então a mesma idade que eu tenho agora, no momento em que escrevo estas memórias. Sentimo-nos sempre mais novos do que somos. Trago em mim os meus rostos anteriores, como a árvore tem os anéis da sua idade. O que eu sou é a soma de todos esses rostos. O espelho só vê o meu rosto mais recente, mas eu conheço todos os anteriores. (p. 55)

Foi pela via da tradução de Horácio que o autor despertou para a poesia. Tanto trabalhou de forma metódica e rigorosa os versos do clássico que ficou deslumbrado, ao ponto de escrever os seus primeiros poemas que publicou no jornal da escola.
“Esta alternância entre o medíocre e trivial e o vigoroso e sublime ensinou-me muito. Era a condição da poesia. Era a condição da vida. Através da forma (da Forma!) era possível elevar uma coisa a um estádio superior.” (p. 74).

Gostei da prosa. Gostei dos seus primeiros poemas. Falta ler a poesia que lhe valeu o Nobel.



13 fevereiro, 2022

𝑪𝒂𝒔𝒂 𝒅𝒆 𝑫𝒊𝒂, 𝑪𝒂𝒔𝒂 𝒅𝒆 𝑵𝒐𝒊𝒕𝒆, de Olga Tokarczuk

 



Autora: Olga Tokarczuk
Tradutora: Teresa Fernandes Swiatkiewicz
Título: Casa de Dia, Casa de Noite
N.º de páginas: 347
Editora: Cavalo de Ferro
Edição: Junho 2021
Classificação: Romance
N.º de Registo: (BE)


OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐⭐

Para quem já conhece um pouco a obra da autora, não estranha a estrutura deste livro. Como se de um puzzle se tratasse, a narrativa desfila em histórias que se vão alternando, cruzando, completando. Fica a ideia que tal como para as fotografias tiradas por R. será necessário “compor com todas elas um só céu”, (p. 347) as suas histórias também só farão sentido depois de todas lidas.

É um livro que levanta sobretudo questões e que raras vezes dá respostas, que propõe reflexões, que inquieta e obriga a interiorizar certas vivências e que abre novas perspectivas sobre temáticas como a relação do ser humano com o seu próximo, com os animais, com a natureza e sobre a inevitável passagem do tempo, a imortalidade, a contemplação, o silêncio, …

A narradora vai descrevendo os poucos habitantes de Nowa Ruda, “Cidade do vale, das encostas e dos cumes. (…) Cidade onde o anoitecer chega subitamente vindo das montanhas e desaba sobre as casas como uma monstruosa rede de borboletas. (…) Cidade silesiana, prussiana, checa, austro-húngara e polaca. Cidade de periferias. (…) Cidade onde o tempo anda à deriva, as notícias chegam com atraso e os nomes confundem.” (pp. 338 e 339).

A sua descrição incide na singularidade de certas personagens e nas suas histórias fabulosas; nos vários enredos anedócticos e por vezes incompletos; nos relatos oníricos e transcendentes; na explanação de várias matérias históricas, sociais, cosmológicas e ambientais.

Toda a sua escrita revela um estilo e um olhar muito próprio do mundo, uma sensibilidade por outras formas de vida, por outras formas de encarar a existência. É uma escrita que apresenta as coisas de uma forma inabitual, que faz pensar e que provoca imensas dúvidas.
“ - o nosso mundo é povoado de pessoas adormecidas que morreram e sonham que estão vivas.” (p. 166)

Há histórias de uma beleza estonteante das quais sublinhei e retirei imensas passagens.


29 dezembro, 2021

𝑼𝒎𝒂 𝑽𝒆𝒍𝒉𝒂 𝒆 𝒐 𝒔𝒆𝒖 𝑮𝒂𝒕𝒐 𝒆 𝒂 𝑯𝒊𝒔𝒕ó𝒓𝒊𝒂 𝒅𝒆 𝒅𝒐𝒊𝒔 𝒄ã𝒆𝒔, de Doris Lessing

 



Autores: Doris Lessing
Título: Uma Velha e o seu Gato e a História de dois cães
Tradutora: Ana Falcão Bastos
N.º de páginas: 94
Editora: Bertrand Editora
Edição: Abril 2016
Classificação: Contos
N.º de Registo: (BE)



OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Dois pequenos contos devastadores e que muito significam. Doris Lessing escreve o que lhe vai na alma, livremente, sem se preocupar com o politicamente correcto. O tema predominante nos dois contos é a liberdade. A liberdade dos que rejeitam uma sociedade preconceituosa, uma sociedade normalizadora.
Num estilo directo, cru, por vezes cruel, mas também comovente, brota, no primeiro conto, uma crítica manifesta ao abandono dos idosos pelos filhos, facilmente esquecidos ou despachados para um lar e, no segundo, uma crítica mais subtil às opções, preferências e formas de ser e de viver.
Na conquista pela liberdade quer de Hetty, quer do gato Tibby, quer ainda dos dois cães, Jock e Bill, há lutas tremendas de subsistência, mas há também manifestações de afecto e de gratidão dos animais para com os seus donos. Nas duas narrativas registam-se momentos de extrema dureza, crueldade até, mas também de ternura. Hetty e Tibby tornam-se ambos sem-abrigo e vadios, mas livres. Hetty recusou todas as démarches do estado para a fecharem num lar, preferiu viver na errância, na companhia do seu gato leal que a aquecia do frio e caçava pombos para se alimentarem.
Se na primeira narrativa a opção de viver em liberdade é clara, na segunda, ainda o é mais. Dois jovens irmãos, a mando dos pais, tentam treinar e domesticar dois cães, mas não conseguem. E a crítica que subjaz neste conto é que devemos aceitar as pessoas, no caso, os animais sem alterar as suas características, a sua forma de ser. A liberdade é mais importante do que qualquer redução à domesticidade.
“O meu pai queixava-se de que os cães não obedeciam a ninguém. Exigia treino sério e sem tréguas. O meu irmão e eu ficávamos a ver a nossa mãe a afagar Jock e a ralhar com Bill e estabelecemos um acordo tácito. Partíamos para o Grande Vlei, mas, uma vez lá chegados, andávamos de um charco para o outro, enquanto os cães faziam o que lhes apetecia e descobriam as alegrias da liberdade.” (p. 73)

Ora, nos dois contos o final não é nada simpático, é triste e devastador, Dir-se-á que é o preço da liberdade! Mas será que tem de ser sempre assim? Fica a pergunta em jeito de reflexão.



01 janeiro, 2021

Iniciar 2021 em poesia...


                                  



Tinha nevado. Lembro-me
de música saindo de uma janela aberta.

Vem a mim, dizia o mundo.
Não significa
que o fizesse com frases
mas era assim que eu intuía a beleza.
Aurora. Uma película de humidade
sobre cada ser vivo. Poças de luz fria
formavam-se nas sarjetas.

Eu esperava
na soleira,
por mais ridículo que pareça agora.

O que outros encontravam na arte,
encontrava eu na natureza. O que outros encontravam
no amor humano, encontrava eu na natureza.
Muito simples. Mas não havia nenhuma voz ali.

Louise Glück, Averno



04 novembro, 2020

A Mulher Canhota, de Peter Handke

 


OPINIÃO


Este livro, também adaptado ao cinema por Wim Wenders (1978), retrata o desejo de uma mulher, Marianne, de se libertar da companhia do marido. A narrativa começa com um jantar a dois, seguido de uma noite íntima. Aparentemente, o casal vivia momentos de cumplicidade e de felicidade. Porém, essa felicidade é de curta duração porque ao acordar, a mulher tem “uma revelação” e diz ao marido: “Vai-te embora, Bruno. Deixa-me.” (p.19)

Assim, de forma abrupta, Marianne toma uma decisão, rompe a relação e passa a viver sozinha com o filho. E Handke centra-se na sua história. Recorre a frases curtas para nos descrever os seus actos quotidianos, as brincadeiras com o filho, os seus pensamentos, os seus encontros com o marido, o seu trabalho e relacionamento com uma amiga e outras personagens que desfilam nesta fase da sua vida (não são muitas). Algumas destas descrições poderiam ser dispensáveis porque são meras banalidades como, por exemplo, uma ida ao supermercado. Contudo, é no modo como o autor narra estes pequenos detalhes, estas banalidades que melhor entendemos a solidão e o desamparo da protagonista, bem como a sua forma de pensar e de sentir. 

Handke é exímio em retratar as relações humanas.



08 outubro, 2020

Louise Glück vence Prémio Nobel da Literatura 2020

 



A poeta norte-americana Louise Glück é a vencedora do Prémio Nobel da Literatura de 2020. O galardão foi-lhe atribuído pela sua “voz poética inconfundível que, com beleza austera, torna a existência individual universal”, justificou a Academia Sueca.

Louise Glück é a 16ª mulher a vencer o Nobel da Literatura desde a sua criação, em 1901, e uma das poucas norte-americanas a recebê-lo.

Louise Glück, de 77 anos, é uma das mais celebradas poetas norte-americanas. A escritora nasceu a 22 de abril de 1943, em Nova Iorque, e estreou-se no mundo da literatura em 1968, com a coletânea de poemas Firstborn, sendo desde logo apontada como uma das vozes mais fortes da nova geração de poetas dos Estados Unidos da América. Temas como a infância e vida familiar ou as relações estreias entre pais e irmãos destacaram-na de outros autores, e continuaram presentes na sua obra, constituída hoje por 12 volumes de poesia e alguns ensaios.



Paisagem/3

Nos fins do outono uma rapariga deitou fogo
a um trigal. O outono

fora muito seco; o campo
ardeu como palha.

Depois não sobrou nada.
Se o atravessávamos, não víamos nada.

Nada havia para colher, para cheirar.
Os cavalos não compreendem –

Onde está o campo, parecem dizer.
Como tu ou eu a perguntar
onde está a nossa casa.

Ninguém sabe responder-lhes.
Não sobra nada;
resta-nos esperar, a bem do lavrador,
que o seguro pague.

É como perder um ano de vida.
Em que perderias um ano da tua vida?

Mais tarde regressas ao velho lugar –
só restam cinzas: negrume e vazio.

Pensas: como pude viver aqui?

Mas na altura era diferente,
mesmo no último verão. A terra agia
como se nada de mal pudesse acontecer-lhe.

Um único fósforo foi quanto bastou.
Mas no momento certo – teve de ser no momento certo.

O campo crestado, seco –
a morte já a postos
por assim dizer.


19 março, 2020

Conduz o teu arado sobre os ossos dos mortos, de Olga Tokarczuk




OPINIÃO:

Conduz o Teu Arado sobre os Ossos dos Mortos é um romance desconcertante, é uma mescla de géneros e de assuntos já que aborda crimes, política, intervenção ambiental, astrologia, e também literatura. 
Numa povoação rural na Polónia junto à fronteira checa, onde o inverno é longo e bastante rigoroso, a professora reformada, Janina Duszejko, vai narrando as suas actividades do dia-a-dia, os seus passeios pela floresta, as suas maleitas e a sua teoria sobre as mortes que vão ocorrendo. Na sua opinião, são os animais e a natureza que se vingam do comportamento humano. 
O enredo vai-se desenvolvendo e o leitor vai ficando cada vez mais preso a esta narrativa e à personagem que tem tanto de lúcida como de louca. Gosto sobretudo da sua loucura. 

“Não contes essa tua teoria a ninguém. É muito improvável e pode prejudicar-te. (…)
Fiquei a pensar que também ele me tomava por louca, como toda a gente, e isso magoou-me.”

A autora recorre à ironia para criticar alguns comportamentos, põe em causa a actuação do homem perante a natureza e os direitos dos animais. 
É uma abordagem diferente, interessante que nos faz reflectir.



20 outubro, 2019

A Angústia do Guarda-Redes antes do Penalty, de Peter Handke




SINOPSE

Neste livro, em que a angústia causada pelo penalty é um metáfora da vida, aspecto sublinhado no filme sobre ele feito por Wim Wenders, Peter Handke fala-nos de um amigo guarda-redes que depois de ser despedido do emprego assassina uma mulher sua ocasional amante e deambula num mundo que parece ter perdido todo o sentido.

OPINIÃO

O livro A Angústia do Guarda-Redes Antes do Penalty, do escritor austríaco Peter Handke (Prémio Nobel da Literatura 2019), adaptado ao cinema pelo alemão Wim Wenders, é uma metáfora da vida. 

A narrativa retrata Joseph Bloch, um canalizador que antes tinha sido um famoso guarda-redes. No dia em que é despedido do seu emprego, Bloch sai de casa e começa a deambular pela cidade. Uma angústia existencial instala-se nele e passa a ter uma vida sem sentido. Porém, a sua errância vai transformar-se em fuga devido ao assassínio que cometeu. 

Peter Handke desenvolve a sua trama descrevendo simplesmente os factos e gestos do personagem. Sem intriga, apenas errância e ambiguidade. Trata-se de um texto minimalista, com uma escrita cinematográfica, frases simples e curtas, alguns diálogos muito curtos e, por vezes, sem sentido. 

“Porque é que ele estava sempre a sentar-se, a levantar-se, a sair, a andar por ali, a voltar? perguntou a locatária.” (p. 43) 

O leitor não compreende muito bem o que leva Bloch a agir desta forma. O despedimento? O assassínio? Nada sabemos do seu passado, nada nos diz sobre a sua atitude, nem os raros pensamentos nos elucidam. Bloch tem um comportamento alienado e, gradualmente, à medida que a sua doença avança, vai perdendo consciência da realidade. 

“De novo sozinho no quarto encontrou tudo mudado. (…) Sentou-se em cima da cama: ainda mesmo agora a cadeira estava à direita dele, e neste momento estava à esquerda. Estaria a imagem do avesso? Olhou da esquerda para a direita, depois da direita para a esquerda. Repetiu o movimento dos olhos da esquerda para a direita e este olhar pareceu-lhe uma leitura.” (p.94) 

A sua angústia surge da distorção do real, da desordem emocional. Poder-se-á concluir que Bloch sofre de esquizofrenia? 

É na parte final que Peter Handke coloca Bloch a assistir a um jogo de futebol e obviamente descreve a atitude do guarda-redes perante um penalty. 

“É cómico ver o guarda-redes assim, sem a bola, a correr de um lado para o outro à espera da bola” disse ele (Bloch). 

Angústia, ansiedade, sucesso e derrota são emoções comuns à vida e ao futebol.




01 outubro, 2019

O Gigante Enterrado, de Kazuo Ishiguro




SINOPSE

Tudo se passa há muitos, muitos anos, num local de fronteiras bem diferentes das actuais e marcado por grandes extensões de solo árido. Nalgumas zonas, os aldeões viviam em abrigos, parte dos quais cavados na encosta dos montes, ligados uns aos outros por passagens subterrâneas. Era num sítio assim que habitava o casal de idosos que tem lugar central nesta história: Axl e Beatrice. Um dia os dois decidiram ter chegado a hora de procurar o filho que há muito não viam e de quem pouco se recordavam. Naquele tempo longínquo esta era uma viagem que, previsivelmente, traria perigos. Mas aquela proporcionou muito mais do que isso. Uma amnésia colectiva parecia ter-se instalado naquela zona, como uma névoa que descera à terra para fazer esquecer em parte o passado, individual e colectivo. Mas a viagem de Axl e Beatrice revela-se um regresso à lembrança. E esta nem sempre deixa um rasto feliz.
Esta é uma história sobre memórias perdidas, amor, vingança e guerra. É ainda uma história que recua ao passado, transportando o leitor para terrenos percorridos por cavaleiros do rei Artur e monges, ogres e dragões. Um dragão em particular - Querig - é o foco das atenções. E, em relação a ele, as missões dividem-se. A diferença entre poupá-lo ou tirar-lhe a vida pouco tem de fantasia. Depois de dez anos sem publicar ficção de fôlego, Ishiguro apresenta-se agora com uma história inesperada que, por certo, fica na memória.


OPINIÃO

Este livro é uma alegoria da vida. Apesar de não apreciar literatura fantástica, e este livro tem alguns aspectos dessa índole, considero que a narrativa principal nos faz reflectir sobre a vida, de como com o passar do tempo surgem o desgaste emocional, a perda da memória, as suspeições, as doenças e a morte. 

A acção situa-se na Idade Média, no tempo do Rei Artur marcado pelas lutas entre bretões e saxões. Estamos na presença de guerreiros, duendes, ogres e dragões. Porém, os protagonistas são Axl e Beatrice, um casal de idosos, que, certo dia, decidem empreender a viagem à procura do filho que deixaram de ver há muito tempo. A particularidade deste casal e de tantos outros habitantes é que não têm memória devido a uma “névoa” que os faz esquecer quer do passado quer de acontecimentos mais recentes. Ao longo da viagem, várias peripécias vão acontecendo, umas mais terríveis que outras, e algumas lembranças vão surgindo o que causa, por vezes, algum mal-estar, algumas dúvidas entre o casal. Mas o amor e a cumplicidade que os une superam todas as dificuldades e os conflitos que se lhes apresentam ao longo da viagem. 

O próprio título O Gigante Enterrado encerra uma grande metáfora que não posso explicar pois tiraria o prazer da descoberta da leitura. 

Ishiguro presenteia-nos com uma escrita poética e com um final maravilhoso.




26 setembro, 2018

Conversa n' A Catedral, de Mario Vargas Llosa





Cinco estrelas. Complexo mas genial.

Primeiro estranha-se, depois entranha-se. Este foi o meu sentimento ao ler este romance. Escrita truncada, diálogos entrelaçados, histórias cruzadas, múltiplas personagens, uso indiscriminado dos discursos direto, indireto e indireto livre que confundem completamente o leitor. Porém, à medida que se avança na narrativa, vamos compreendendo as personagens e o enredo e vamos ficando, cada vez mais, conquistados pela mestria do autor. 

A conversa que acontece no café Catedral marca o reencontro de Santiago (Zavalita) e Ambrósio e serve de fio condutor ao longo de toda a narrativa. Ficamos assim a conhecer a vida destas personagens e dos seus familiares, amigos, colegas de trabalho, entre muitas outras, bem como um pouco da história do Peru dos anos cinquenta, época de divisão política, de corrupção e de repressão.


23 outubro, 2017

Os Despojos do Dia, de Kazuo Ishiguro




Opinião: 

Os Despojos do Dia, de Kazuo Ishiguro, é um romance magnífico sobre um mordomo digno e responsável que dedicou a sua vida a servir cavalheiros importantes, na mansão Darlington Hall. Durante uma viagem de seis dias sugerida pelo seu novo patrão, Stevens, o mordomo, escolhe cuidadosamente o seu percurso e decide visitar uma governanta que trabalhou sob a sua administração e que deixou Darlington Hall para se casar. Ao longo desta viagem, Stevens recorda com saudade as suas escolhas pessoais e profissionais. Percebe-se que a personagem foi exemplar no seu trabalho, mas revela ter dificuldade em expressar sentimentos. Quando reencontra Miss Kenton, entende que o tempo passou e que nada pode fazer para alterar o rumo da sua vida. 

Numa dessas recordações, Stevens afirma “Este patrão personifica tudo quanto considero nobre e admirável. Doravante dedicar-me-ei a servi-lo”. Este pensamento define muito bem a forma de pensar e de ser deste mordomo. 

Recomendo vivamente a leitura.

Kazuo Ishiguro foi nomeado Prémio Nobel da Literatura, 2017



23 abril, 2017

Pour que tu ne te perdes pas dans le quartier, de Patrick Modiano




Fiel à sua escrita, Patrick Modiano apresenta-nos um romance ao longo do qual se regista uma busca de identidade.
A personagem, um escritor, tenta através da sua memória, e visitando locais e espaços, recordar a sua infância e as pessoas marcantes com quem viveu. O autor vai-nos apresentando questões, factos, enigmas, mas nunca dá as respostas e as personagens vai desaparecendo tal como vão aparecendo.




15 outubro, 2016

Bob Dylan vence Prémio Nobel da Literatura 2016




Bob Dylan é o vencedor do prémio Nobel da Literatura 2016, “por ter criado novas expressões poéticas na tradição da canção americana”. 

O anúncio foi feito  pela Academia Sueca, em Estocolmo. “É um poeta maravilhoso”, justificou a secretária permanente Sara Danius. É a primeira vez que o Nobel é entregue a um compositor, “que pode e deve ser lido”, para além de escutado.

Em 1971, publicou um livro Tarantula e é um misto de  prosa e poesia. 
Encontra-se traduzido para português pela já extinta Quasi Edições. 

Mas o seu livro mais popula é  Crónicas: Volume 1, lançado em 2004, editado, em Portugal, pela  Ulisseia
É através destas páginas que ficamos a saber que Robert Allen Zimmerman, nascido a 24 de maio de 1941, no Estado americano do Minnesota, numa América onde a segregação racial era a realidade do dia-a-dia, começou a escrever poemas com dez anos de idade. E que aprendeu sozinho a tocar piano e guitarra.



In, Observador (adapatado)