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19 junho, 2025

𝑽𝒆𝒋𝒂𝒎 𝒄𝒐𝒎𝒐 𝒅𝒂𝒏ç𝒂𝒎𝒐𝒔, Leïla Slimani

 

Autora: Leïla Slimani
Título: Vejam como dançamos
Tradutora: Tânia Ganho
N.º de páginas: 338
Editora: Alfaguara
Edição: Outubro 2022
Classificação: Romance
N.º de Registo: (3414)



OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐




Vejam como dançamos é o segundo livro da trilogia de Leïla Slimani, iniciada com O País dos Outros. Nele, continua a história da família Belhaj, nomeadamente no crescimento e na adaptação dos filhos Aïcha e Selim, às transformações sociais e políticas de Marrocos nos anos 1960 e 70.
A narrativa foca-se em Aïcha que representa uma geração em transição entre a tradição e o desejo de emancipação. Ela estuda medicina em França, na cidade de Estrasburgo. Este facto afasta-a temporariamente das suas raízes marroquinas e aproxima-a de uma nova maneira de encarar a vida e de questionar o papel da mulher na sociedade. Os conhecimentos e amizades que aí trava, levam-na para trilhos de descobertas, de questionamento, de reflexão.
O desejo de independência, por um lado, e a lealdade à herança familiar, por outro, mantém-na num limbo identitário, num conflito interior que a vai tornar mais humana e sensível. Como um passo de dança, Aïcha desliza entre Marrocos e França, entre a tradição e a liberdade.

Selim, ao contrário da irmã, revela uma trajetória marcada por certos desvios – não gosta de estudar, alia-se ao movimento hippie, sai de casa, pratica o amor livre, experimenta drogas. A sua relação com os pais é distante e provocatória.

Quanto a Mathilde e a Amine, estão mais aburguesados, cederam à modernidade apesar das raízes e do peso da cultura marroquina que atravessa uma época conturbada. Este peso cultural sente-se, sobretudo, em Mathilde, que ainda vive entre duas culturas, e mais condescendente deixa-se engordar e acomoda-se à traição de Amine com outras mulheres.

Leila Slimani para além da história familiar, dá-nos a conhecer muito da História de Marrocos. Foca-se na transformação das pessoas que têm de se adaptar às mudanças sociais, culturais e políticas do país. “Naquele país que vivera da terra e da guerra durante séculos, já só se falava da cidade e do progresso.” (p. 37)
Percebemos que, apesar das mudanças em curso, a mulher ainda desempenha um papel subalterno, as desigualdades ainda subsistem. Os ecos de um Maio de 68 começam a instalar-se, a emancipação da mulher dá os primeiros passos, vagarosa e timidamente.
Leïla é sublime. Através de uma escrita cativante e fluída, de cariz autobiográfica, conduz-nos pelas teias da (sua) família, mergulha-nos na intimidade das personagens, incita-nos à descoberta de um país e oferece-nos uma narrativa comovente.

Recomendo muito e como incentivo à leitura desta trilogia (o terceiro livro já foi publicado em Portugal), transcrevo um excerto do final da carta que Mehdi escreveu a Aïcha. Uma carta que me deslumbrou pela beleza das palavras, pela sensibilidade que nelas perpassam.
“Um dia, mais tarde, num dos nossos passeios, disseste-me, rindo-te, que eu era um ateu da vida. Ah, não. A vida possui-me. Aïcha, acredito piamente nela, a vida ilumina-me, rasga-me a cada instante, amo-a sob todas as formas, felicidade, prazer, dor, silêncio. E, graças a ti, nunca estive tão próximo dela. Reconheci-te. Esperava-te desde o dealbar da infância e tu chegaste. Vejo o céu, a luz nas palmeiras, o voo das cegonhas e fico deslumbrado. Acredita quando te digo que essa beleza é feita de nós. É feita para nós.” (p. 196).



21 dezembro, 2021

𝑳𝒆 𝑷𝒂𝒚𝒔 𝒅𝒆𝒔 𝑨𝒖𝒕𝒓𝒆𝒔, Leïla Slimani



Autora: Leïla Slimani
Título: Le Pays des Autres
N.º de páginas: 407
Editora: Gallimard (Folio)
Edição: Março 2021
Classificação: Romance
N.º de Registo: (3299)


OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐⭐


Le Pays des Autres é o primeiro livro de uma prevista trilogia, sustentada numa história familiar (a da própria autora) que tem como pano de fundo a independência de Marrocos, de 1944 a 1955.

O livro narra a história de Mathilde, uma jovem francesa, oriunda da Alsácia, que se apaixona, em 1944, pelo oficial Amine Belhaj, um marroquino que combatia no exército colonial francês na Segunda Guerra Mundial. No final da guerra, o jovem casal vai viver para Meknes, em Marrocos, uma colónia francesa.
Mathilde cedo percebe que este não é o seu mundo. Sente-se sufocada pela aridez da terra e do clima, pelas dificuldades em construir e manter uma harmonia familiar, em aceitar os usos e costumes religiosos e culturais, sobretudo em relação à mulher. Vista como inimiga pelos nativos porque é francesa e como uma selvagem pelos colonos franceses porque casou com um marroquino, é assim, rejeitada e criticada por todos. É, por isso, natural que se instale no seio familiar um confronto constante e doloroso, onde os sonhos são constantemente adiados. Este confronto, já por si, difícil de gerir, vai intensificar-se com a situação política, nas lutas de libertação que levarão o país à independência do protetorado, provocando conflitos entre marroquinos e franceses. Mathilde e Amine vão viver intensamente este conflito, vão tentar sobreviver à constante e ambígua luta interior entre amor e rejeição, submissão e emancipação, respeito pela identidade do outro e fidelidade às tradições culturais e religiosas.

O enredo deste livro entranha-se no leitor e permanece muito para além da última página. A escrita de Slimani, sem deixar de questionar e de narrar a verdade, revela uma grande humanidade e subtileza na caracterização das personagens, na descrição dos actos de violência, na submissão da mulher ao poder do homem. O título representa os dois lados desta ambiguidade porque representa o país que não é certamente o de Mathilde, mas também o país que não é dos marroquinos porque se encontra ocupado pelos franceses.



04 março, 2019

Chanson Douce de Leïla Slimani



SINOPSE

Lorsque Myriam, mère de deux jeunes enfants, décide malgré les réticences de son mari de reprendre son activité au sein d'un cabinet d'avocats, le couple se met à la recherche d'une nounou. Après un casting sévère, ils engagent Louise, qui conquiert très vite l'affection des enfants et occupe progressivement une place centrale dans le foyer. Peu à peu le piège de la dépendance mutuelle va se refermer, jusqu'au drame.
À travers la description précise du jeune couple et celle du personnage fascinant et mystérieux de la nounou, c'est notre époque qui se révèle, avec sa conception de l'amour et de l'éducation, des rapports de domination et d'argent, des préjugés de classe ou de culture. Le style sec et tranchant de Leïla Slimani, où percent des éclats de poésie ténébreuse, instaure dès les premières pages un suspense envoûtant.


OPINIÃO

Leïla Slimani inicia o seu livro, vencedor do Prémio Goncourt 2016, com a frase “ Le bébé est mort”. Nas três primeiras páginas ficamos a conhecer o desenlace de algumas personagens e facilmente percebemos que algo de perverso e de doentio vai acontecer nesta “Chanson douce”. 
Louise, a protagonista, é a ama contratada pelo casal Massé (Paul e Myriam). Muito competente, dedica-se totalmente à família, construindo uma relação de amor que a pouco e pouco vai evoluindo para uma obsessão paranóica. 
Leïla Slimani é exímia na maneira como narra e como agarra o leitor ao longo da sua narrativa. Porém, e apesar do desfecho dramático, a autora não expõe totalmente a demência da ama. Vai sugerindo, revelando alguns episódios, mas nunca desvela a sua motivação final. 
Ao descrever o dia-a-dia de Louise no seio da família, a autora convida o leitor à reflexão, pois foca aspectos referentes à sociedade actual parisiense: o quotidiano e o drama das famílias após a maternidade, a relação ambígua entre a ama e a família, a educação, a realização profissional, a exigência obsessiva da sociedade, a emigração ilegal e o preconceito racista na contratação das amas. 

Gostei muito do livro, da densidade das personagens e do enredo que questiona e espelha uma sociedade cada vez mais exigente e intransigente.