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16 junho, 2024

Tenho vontade de ver-te

 

Museu Arpad Szenes - Vieira da Silva 
Maria Helena Vieira da Silva | Lisbonne Bleue |  1942





Tenho vontade de ver-te
Mas não sei como acertar.
Passeias onde não ando,
Andas sem eu te encontrar.



Quadras ao Gosto Popular
, Fernando Pessoa.



01 julho, 2010

um poema de Al Berto



Casa

durante a noite
a casa geme agita-se e arrefece
no interior frio do olho da tua sombra sentada
na cadeira aparentemente vazia

esperas acordado sem sono
que a temperatura da casa se funda
com a temperatura incerta do mundo
depois
escreves exactamente isto: o horror dos dias
secou contra os dentes - e rouco
dobrado para dentro do teu próprio pensamento
ferido
atravessas as sílabas diáfanas do poema

levantas-te tarde
atordoado
para extinguires o lume ateado
junto à memória da casa - respiras fundo
para que o gelo derreta e afogue
a vulgar noite do mundo

olhas-te no espelho
atribuis-te um nome um corpo um gesto
dormes
com a árvore de saliva das ilhas - com o vento
que arrasta consigo esta chuva de fósforo e
estes presságios de tranquilos ossos

Al Berto in Horto de Incêndio

12 junho, 2008

Vieira da Silva - cem anos

Maria Helena Vieira da Silva nasceu há cem anos (13/06/2008). Autora de uma obra inovadora, é reconhecida em grande parte do mundo. Casou em 1930 com o pintor húngaro, Arpad Szenes. Viveu em Paris durante muitos anos, onde acabou por morrer em 1992.


Na
Fundação Arpad Szenes-Vieira da Silva (FASVS), em Lisboa, foi inaugurada, no dia 5 do corrente mês, a exposição Correspondências.


Cidade à beira-mar / Ville au bord de la mer



7./1980

ao coração da terra desce o luar
pressinto as quilhas dos navios romperem a cinza da manhã

(escrevo um diário
fumo
bebo

aborreço-me)

atravesso o relâmpago esquecido na veia óssea da noite
reconheço o sítio onde os corpos já não se encontram

(estou sentado numa cadeira de lona
olho o mar
é tudo o que sei fazer
olhar o mar e não pensar)

tocámo-nos apesr do que violentemente ficou dito

agora só vens no veludo manchado dos sonhos
pétala mastigada na queimadura da boca
ou quando arrumo as fotografias surges inesperadamente
do fundo da gaveta com o perfume áspero da madeira

anoitece... o ar está impregnado de iodo
um fio de luz define o rosto contra a parede
a cal retém o sussurrar antigo dos corpos
e quando a manhã se aproxima da janela
a memória seca ou dorme para sempre

(a boca
talvez fosse a boca de A. surgindo
sobre a folha de papel
respirando)


ainda continuei a escrever durante alguns dias
sem grande rigor é cert ... uma aranha movia-se nos vidros
a melancolia trepava ao cimo das árvores
assustando os insectos da folhagem e os pássaros
esperei o sono com sua pálpebras vegetais e a paixão
apareceu naquele rosto orvalhado abrindo-se enfim
à contemplação doutro rosto de tinta e de palavras

Al Berto