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29 julho, 2025

𝑱𝒆𝒔𝒖𝒔 𝑪𝒓𝒊𝒔𝒕𝒐 𝑩𝒆𝒃𝒊𝒂 𝑪𝒆𝒓𝒗𝒆𝒋𝒂,de Afonso Cruz



N.º de páginas: 248
Editora: Alfaguara
Edição (3.ª): Janeiro 2013
Classificação: Romance
N.º de Registo: (2765)


OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐




Afonso Cruz, em O vício dos livros (p. 81), refere que "Os livros são seres pacientes. Imóveis nas suas prateleiras, com uma espantosa resignação, podem esperar décadas ou séculos por um leitor." Ora, este Jesus Cristo bebia cerveja soube esperar resignadamente (12 anos) até que nos encontrássemos. Foi o primeiro livro que comprei do autor, em 2013, no FMM, com direito a conversa e autógrafo. Depois, li muitos, mas mesmo muitos do autor e este foi ficando para trás…

Jesus Cristo bebia cerveja apresenta-nos uma narrativa insólita e divertida povoada de personagens originais e marcantes num Alentejo rural. Toda a ação se configura em torno de Rosa que cuida da sua avó doente, que gosta de ler westerns e policiais, apesar dos poucos estudos, e que tem o bizarro costume de chupar pedras.

Ao longo da narrativa surgem indícios que inquietam o leitor e que anunciam uma possível tragédia: "- O amor não se compra. - Mas paga-se caro."; “Eu não jogo aos dados. Deus é que joga.” (alusão directa ao livro de Ian Stewart ou, então, a Albert Einstein «Deus não joga aos dados»)

Jesus Cristo bebia cerveja é um livro criativo, caricato e controverso que, subtilmente, nos afasta de certezas triviais, de preconceitos e nos oferece, pelo viés da ironia pincelada de humor negro e de uma escrita poética (“ a tarde boceja pelas ruas”), outras perspectivas de vida e nos encaminha para uma reflexão sobre a maneira como encaramos o amor, a família, a religião e como percebemos a morte.

Claro que recomendo a leitura deste e de todos os livros do Afonso Cruz. E para reforçar a minha recomendação, fica a dica do autor:
"Lembra-te de que quando Deus fecha uma porta abre-nos um livro." (p. 76)




29 maio, 2024

𝑶 𝒄𝒖𝒍𝒕𝒊𝒗𝒐 𝒅𝒂𝒔 𝒇𝒍𝒐𝒓𝒆𝒔 𝒅𝒆 𝒑𝒍á𝒔𝒕𝒊𝒄𝒐, Afonso Cruz

 

Autor: Afonso Cruz
Título: O cultivo de flores de plástico
N.º de páginas: 107
Editora: Companhia das Letras
Edição: Novembro 2023
Classificação: Teatro
N.º de Registo: (3537)


OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐



Em O cultivo de flores de plástico, Afonso Cruz coloca em acção quatro personagens sem-abrigo - Jorge, Senhora de Fato, Couraçado Korzhev e Lili, que por razões diversas perderam a capacidade de sonhar.
No decorrer das nove cenas, o leitor acompanha a conversa destas quatro pessoas que vivem na rua privadas de conforto, de emprego, de família, de carinho, que aceitam uma refeição de caridade.
“Aproxima-se um carro. Os sem-abrigo estão todos em fila.” É este o início da peça, da primeira didascália.

Afonso Cruz é corrosivo ao expor a vida destes homens e mulheres, personagens-tipo de uma sociedade insensível, cega e egoísta. Os pequenos episódios narrados espelham bem o abandono, a indiferença e o esquecimento a que foram, e são ainda, votados.

A miséria em que vivem torna-os descrentes, excluídos, invisíveis. Jorge, um dia, ao ver reflectida a sua imagem numa montra, percebe que é invisível aos olhos dos outros: “ No fundo, é isso. Ninguém nos vê. Somos invisíveis. A miséria é uma poção de invisibilidade.” (p. 38)
Afonso Cruz é exímio na forma como recorre à ironia para despertar emoções e alertar para este problema cada vez mais extremo e premente.
“O cultivo das flores de plástico” denota a indiferença, a falsidade de todos os que têm por obrigação devolver a dignidade a estas pessoas, de todos os que assobiam para o lado, que ignoram, que fingem desconhecer esta vergonha social. É ainda Jorge que refere “ Parece que os povos estão separados por um espelho. A esquerda de uns é a direita de outros.” (p. 50)

Ao terminar este livro não ficamos indiferentes à dor, à infelicidade e à solidão destas pessoas.
Captamos a mensagem e questionamo-nos sobre o que andamos a fazer nesta vida? o que ambicionamos para o futuro? O que pretendemos cultivar? O que andamos a regar?
“cactos (…) Cheios de céu aberto , pessoas cheias de ar livre.(…) muitas portas no mundo?” (p. 41)

ou

“flores de plástico (…) coisas que não servem para nada. É tudo plástico. E nós regamos essas flores e esperamos que cheirem a coisas boas.” (p. 61)

Ficam as perguntas…




26 junho, 2023

𝑨 𝒇𝒍𝒐𝒓 𝒆 𝒐 𝒑𝒆𝒊𝒙𝒆, de Afonso Cruz

 


Autor: Afonso Cruz
Título: A flor e o peixe
N.º de páginas: 87
Editora: Companhia da Letras
Edição: Dezembro 2022
Classificação: Fábula
N.º de Registo: (3413)

OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐



A Flor e o Peixe é uma fábula poética inspirada em dois contos de José Saramago”, lê-se na sinopse do livro.

Para quem conhece bem os dois contos do autor nobilizado, O Silêncio da Água e A Maior Flor do Mundo e quem aprecia a escrita de Afonso Cruz, esta frase é o mote desencadeador de uma leitura obrigatória, colocando as expectativas num patamar elevadíssimo.

Obviamente que não saí defraudada. A mensagem de Saramago permanece, conduzida de forma irrepreensível pela escrita e pelas ilustrações de Afonso Cruz.
As palavras e os desenhos completam-se. O contraste do vermelho, preto e branco, de influência oriental (tão ao gosto do autor) é deslumbrante.
A estrutura narrativa entrelaça-se, obriga o leitor a absorver e a olhar o conjunto; impõe-lhe o silêncio “de admiração”, da compreensão da mensagem poética; força-o a questionar-se sobre “a impermanência de tudo, a efemeridade, a indecisão da vida” (p. 30), sobre a morte; transporta-o para um plano metafórico onde a serpente e a aranha tecem reflexões sobre o silêncio, “Há silêncios de muitas espécies, diz a serpente, há-os confortáveis e desconfortáveis, há silêncios que nos são impostos, há silêncios que são barulhos, como a tempestade e o canto das cigarras, e silêncios de admiração, em que se fica sem palavras. “ (pp. 18 e 19); sobre as transformações, os desencontros, os sonhos, o tempo, o espaço, a vida, “Se arrancamos uma flor, diz a serpente, e a pusermos numa jarra, não somos donos dela, mas do seu cadáver, porque já não existe flor, existe apenas a sua imagem, um fantasma que persiste durante uns dias, um fantasma teimoso. (…) Não se apanha um peixe. Apanha-se o resto de um peixe, o que sobra da vida.” (pp. 21 e 22); sobre a beleza, a partilha “ O que é valioso torna-se ainda mais valioso quando é partilhado. Mas
por vezes, a generosidade é uma teia onde se apanham equívocos,
por vezes, a bondade gera nós.
Por vezes, a bondade é um rio. “ (p. 85)

Em conclusão, a narrativa parecendo simples, revela uma profundidade e um grande saber; demonstra a necessidade de viver em concórdia, em simbiose com a natureza; apela à urgência do entendimento, da unidade, da felicidade. O menino e a menina, encontram a beleza da vida “num peixe que não se deixa apanhar e numa flor cheia de sede”. É nos desencontros entre a montanha e o rio que vão descobrir “ a complexa teia que conduz o destino.”

Afonso Cruz oferece-nos um livro maravilhoso que, na minha opinião, só será devidamente compreendido se as palavras e os desenhos forem simultaneamente absorvidos e de preferência no silêncio.


23 outubro, 2022

𝑶𝒔 𝒍𝒊𝒗𝒓𝒐𝒔 𝒒𝒖𝒆 𝒅𝒆𝒗𝒐𝒓𝒂𝒓𝒂𝒎 𝒐 𝒎𝒆𝒖 𝒑𝒂𝒊, de Afonso Cruz

 

Autor: Afonso Cruz
Título: Os livros que devoraram o meu pai
N.º de páginas: 126
Editora: Caminho
Edição (14.ª): Julho 2021
Classificação: Novela
N.º de Registo: (BE)



OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Já tinha lido Os livros que devoraram o meu pai, mas não tinha ainda escrito sobre ele. Então decidi relê-lo para emitir uma opinião.

É um livro mágico que se lê num fôlego. É um livro sobre livros e sobre a paixão pela literatura que nos transporta para o mundo real de Elias Bonfim, nos conduz numa viagem fantástica repleta de referências literárias e de histórias encantadoras que se “escondem nas partes brancas das folhas, entre as letras dos livros, nos espaços entre as palavras.” (p.64) e nos mergulha nos universos literários de A Ilha do Dr. Moreau, de H. G. Wells; O Estranho caso do Dr. Jeckyl and Mr. Hyde, de Robert Louis Stevenson; Crime e Castigo, de Dostoievski e Fahrenheit 451, de Ray Bradbury.

Elias Bonfim é o protagonista desta narrativa. Com 12 anos herda a biblioteca do pai e decide ler todos os livros, na ânsia de encontrar respostas para o desaparecimento misterioso do pai.
“Li, numa das minhas tardes passadas no sótão um conto de um escritor argentino chamado Borges, sobre um labirinto que é um deserto. Há inúmeros lugares onde um ser humano se pode perder, mas não há nenhum tão complexo como uma biblioteca.” (p. 28)

Nos longos períodos de leitura, Elias entrega-se à história e entra em amena conversa com as suas personagens. Assim, vai de enredo em enredo e numa mistura do quotidiano e do metafórico, engendra reflexões sobre o bem, o mal, a culpa e o medo, sem contudo cair na moralização.
“(…) custa-me sair das histórias que tenho vivido. Tenho visto ficções que só a realidade é que supera. E tenho um cão, (…) na realidade é Mr. Prendick (…) Um cão muito inteligente, de pelo preto e capaz de ser um animal perfeitamente racional. Característica de muitos cães e poucos homens.” (p. 76)

Recomendo para ser devorado por qualquer leitor! Porque é um livro simples e emocionante em constante diálogo com outros livros e "Porque um homem é feito dessas histórias, não é de adê-énes e músculos e ossos. Histórias." (p.126)




10 julho, 2022

𝑨 𝑪𝒐𝒏𝒕𝒓𝒂𝒅𝒊çã𝒐 𝑯𝒖𝒎𝒂𝒏𝒂, de Afonso Cruz

 


Autor: Afonso Cruz
Título: A Contradição Humana
N.º de páginas: 36
Editora: Caminho
Edição: Setembro 2010
Classificação: Infantil/Juvenil
N.º de Registo: (empréstimo)



OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Pequena pérola da literatura infantil portuguesa para ser lida por “humanos” de todas as idades.
Neste livro, Afonso Cruz apresenta-nos as observações e reflexões de uma criança curiosa e atenta às contradições do ser humano.
Numa simbiose toda ela contraditória de texto e ilustração, o autor, em tons de vermelho, preto e branco usa letras de tamanhos e tipos diferentes e desenhos expressivos para realçar a contradição humana.

Nenhum leitor fica imune à ironia e subtileza presentes nas narrativas (textual e imagética) que conduzem o leitor à constatação imediata das várias contradições. O autor desconstrói através do humor e de jogos de palavras a ideia inicial para no final a tornar menos óbvia.

Livro divertido e sério que parte do absurdo para nos fazer sorrir mas também reflectir.
Alguns exemplos:
- “À minha frente estava um casal de namorados, aos beijinhos. Eram 2 mas só tinham uma sombra (de tão agarrados que eles estavam)”
- “A minha tia gosta muito de pássaros mas prende-os em gaiolas. É uma pena."
- “Apesar de comer tanto açúcar, é uma pessoa amarga”



29 abril, 2022

𝑺𝒊𝒏𝒐𝒑𝒔𝒆 𝒅𝒆 𝑨𝒎𝒐𝒓 𝒆 𝑮𝒖𝒆𝒓𝒓𝒂, de Afonso Cruz

 

Autor: Afonso Cruz
Título: Sinopse de Amor e Guerra
N.º de páginas: 175
Editora: Companhia das Letras
Edição: Dezembro 2021
Classificação: Romance
N.º de Registo: (BE)


OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Sinopse de Amor e Guerra é o segundo livro da colecção Geografias, cuja acção se desenrola em Berlim, depois da II Guerra Mundial, mais concretamente nos anos anteriores e pouco depois à construção do muro, parede que viria a dividir uma cidade e a separar vidas, amores, destinos, “Uma parede que era a prefiguração da morte” (p. 109)

Através de uma escrita simples, fluída e poética, muito poética, vamos acompanhando a história de Theobald Thomas e Bluma Janek, dois amigos que se conhecem desde a infância, que parecem feitos um para o outro e que, mais tarde, através do poder dos livros e da poesia acabam por se apaixonar. “ A vida de ambos pacificara-se e convergira. Encostavam olhares, encostavam as mãos ao arrumar os livros, citavam poetas, por vezes em uníssono. Era uma boa explicação do amor, essa coincidência dos versos que diziam.
Descreviam-se um ao outro pela forma como as palavras saíam das suas bocas, simultâneas e idênticas. Esculpiam-se mutuamente, tendo por ferramenta a poesia.” (p.89):

Este livro é inspirado numa história real, focado no binómio amor e guerra, com realce para a ausência, para a perda e para reencontros, para a banalidade do mal como forma de sobrevivência. Contudo, nos dias sombrios que vivemos, quero acreditar que, tal como na narrativa, há um raio de sol que brilha e que permite ter esperança num mundo melhor, num mundo mais unido, mais pacífico, sem medo, sem separação, sem barbárie.


Para além da história de Theobald e Bluma, o autor deu uma piscadela de olho ao poder dos livros, à beleza das palavras, da poesia. É notória a sua força na transformação das frases em algo de sensível, de belo e, simultaneamente, educativo “ Telefonar sem qualquer motivo é sinal de amor” (p. 76), é apenas um dos muitos exemplos.

Soube a pouco, gostaria que houvesse mais desenvolvimento, mais detalhes para uma maior compreensão e aceitação das personagens, das suas motivações, das suas decisões. Gostaria de obter mais respostas sobre os limites do amor e da guerra, sobre as questões afloradas.
Será que neste mundo em que vivemos, vale tudo?
Apesar de tudo, não me considero defraudada porque o título é claro, trata-se de uma sinopse…


24 maio, 2021

Carlos Fiolhais escreve sobre o último livro de Afonso Cruz





No seu mais recente título, uma coletânea de pequenos textos, histórias e divagações à volta de livros, diz-nos que estes tanto podem matar como salvar-nos.



Tenho o vício dos livros. Não resisto nunca a entrar numa livraria ou alfarrabista. Leio pelo menos um livro por semana para fazer as recensões para este jornal e, por vezes, são mesmo dois ou três. Já me aconteceu regressar de uma livraria todo contente com um livro novo na mão, para verificar na minha biblioteca que afinal já tinha esse título, não passando de uma nova edição: não fico desconsolado, pois, se o tenho em duplicado, posso sempre oferecê-lo. E, de facto, duas edições diferentes são dois livros diferentes.

Se houvesse uma comunidade de “bibliófilos anónimos” não hesitaria em entrar, procurando apoio para “alcançar e manter a sobriedade através da abstinência total” de compra de livros. Encontraria lá gente muito interessante, como, por exemplo, Afonso Cruz, que acaba de publicar O Vício dos Livros, com a chancela da Companhia das Letras (do grupo Penguin Random House). É uma bela edição de capas duras, com ilustrações do próprio autor, que foi lançada no Dia Mundial do Livro e do Direito de Autor, 23 de Abril.

Tive a oportunidade de entrevistar Afonso Cruz em 23 de Novembro de 2018, no 10.º aniversário do Rómulo, Centro Ciência Viva da Universidade de Coimbra, o centro que fundei à volta de uma biblioteca que homenageia Rómulo de Carvalho (nome real do poeta António Gedeão). Por essa biblioteca têm passado escritores como João Lobo Antunes, José Tolentino de Mendonça e Onésimo Teotónio Almeida. Tenho oferecido muitos livros a essa biblioteca, juntando-os a livros oferecidos, entre outros, por Guilherme Valente, o editor da Gradiva, e pela família de António Manuel Baptista, o grande divulgador da ciência. Também lá estão alguns livros de Afonso Cruz, que ele assinou na altura.

Afonso Cruz dispensa apresentações para além daquela que ele, com concisão, faz de si próprio nas badanas dos seus livros: “Escritor, ilustrador, cineasta e músico da banda The Safed Lam. Em Julho de 1971, na Figueira da Foz, era completamente recém-nascido, e haveria, anos mais tarde, de frequentar lugares como a António Arroio, as Belas-Artes de Lisboa, o Instituto Superior de Artes Plásticas da Madeira e mais de meia centena de países. Assina, desde Fevereiro de 2013, uma crónica mensal no Jornal de Letras, Artes e Ideias sob o título “Paralaxe”. Recebeu vários prémios e distinções nas diversas áreas em que trabalha, vive no campo e gosta de cerveja.”

Fui, depois da entrevista no Rómulo, jantar com ele, tendo confirmado que gosta de cerveja, bebida que, segundo me explicou, era na Terra Santa mais comum do que o vinho no tempo de Jesus Cristo. Daí o curioso título de um dos seus romances, Jesus Cristo Bebia Cerveja (Alfaguara, 2012). Os seus títulos primam, aliás, pela originalidade. O primeiro, com um título também de ressonâncias religiosas, A Carne de Deus (Bertrand, 2008), é uma história de aventuras tendo a maçonaria como pano de fundo. Entre esses dois livros saíram A Boneca de Kokoschka (Quetzal, 2010; reedição: Companhia das Letras, 2018) e O Pintor Debaixo do Lava-Loiças (Caminho, 2011). Seguiram-se, com uma regularidade impressionante, outros romances: O Livro do Ano (Alfaguara, 2013), O Cultivo de Flores de Plástico (idem, 2013), Para Onde Vão os Guarda-Chuvas (Companhia das Letras, 2013), Flores (idem, 2015), Nem Todas As Baleias Voam (idem, 2016), Jalan Jalan: Uma leitura do mundo (idem, 2017; “jalan” significa, em indonésio, “passear”), O Princípio de Karenina (idem, 2018), e Paz Traz Paz (Companhia das Letras, 2019). O estilo literário é, como os títulos, bastante original. Alguns destes livros foram premiados: por exemplo, Jalan Jalan ganhou em 2017 o Grande Prémio de Literatura de Viagens Maria Ondina Braga da Associação Portuguesa de Escritores e da Câmara Municipal de Braga.

Gosto particularmente da colecção de sete livros de Afonso Cruz, intitulada Enciclopédia da Estória Universal, quase todos da Alfaguara, saídos entre 2009 e 2018. São conjuntos de histórias apócrifas e aforismos de autores fictícios. De início estranhei, mas depois entranhei.

Afonso Cruz escreveu também vários livros infanto-juvenis, sendo o primeiro Os Livros que Devoraram o Meu Pai (Caminho, 2010) e o mais recente Como Cozinhar uma Criança (Alfaguara, 2019). Mais uma vez títulos extraordinários. Um outro livro recente dele é o ensaio O Macaco Bêbedo Foi à Ópera (Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2019), uma breve história cultural do álcool, com histórias sobre cerveja e vinho.

O Vício dos Livros é uma colectânea de pequenos textos, histórias ou divagações à volta de livros, que, na sua maior parte, viram a luz do dia no Jornal de Letras. O primeiro, “A primeira vez que conheci um esquifobético (A neve desaparece mas o original não desoriginaliza)”, conta os rabiscos que um brasileiro maluco fez intempestivamente no livro A Brincadeira de Milan Kundera que Cruz estava a ler, uma algaravia que o “esquifobético” - um termo não dicionarizado - traduziu para dar a frase do parêntesis. O último, “A voz dos livros”, conta a oferta que um avô lhe fez do livro Eles Vieram de Madrugada, de Manuela Câncio Reis, a mulher do escritor Soeiro Pereira Gomes, que foi preso político durante longos anos. A dedicatória do avô, também preso político, dizia: “Para o meu neto, para que ele perceba um pouco daquilo que passei”. Escreve Cruz: “Este livro deixou então de ser de Manuela Câncio Reis para passar a ser o livro que o meu avô me escreveu. E a voz que ouvi enquanto lia o livro era a sua”.

Revelo um pouco deste estimulante livro sobre livros. Aprendi que os livros podem matar. O texto “Porém, a poesia pode matar amigos” conta a história de dois amigos que discutiram qual era o género literário mais significativo, a poesia ou a prosa. O amante de poesia acabou por matar o antagonista à facada. No texto “O poeta que foi assassinado pelos seus próprios livros”, Afonso Cruz, depois de descrever casos reais em que a queda de uma biblioteca matou o seu proprietário, escreve: “Qualquer bom leitor, quanto maior for a sua biblioteca, mais sente o peso esmagador do que leu e, principalmente, do que não leu […] e nunca poderá ler, ainda que, felizmente, o faça de forma menos literal do que os exemplos antes referidos.” A literatura, se por vezes mata, noutras vezes pode salvar. Em “A morte, perante os livros, fica sem poder” o autor cita um estudo da Universidade de Yale que expõe os benefícios da leitura: “Ler 30 minutos por dia fará viver, em média, mais dois anos. Se não for pelo prazer de ler, talvez devamos ler pela nossa saúde.”

Um dos textos que mais gostei está relacionado com a física. Intitulado “Principio de Anti-Fermat”, parte da experiência do autor, adolescente, a ler num autocarro a caminho da escola: “O princípio de Fermat diz-nos que a luz não percorre a distância mais curta, mas sim o tempo menor entre dois pontos. Um leitor, muitas vezes, tenta encontrar o caminho mais lento entre dois pontos. Era isso o que eu fazia. Ia para a escola pelo caminho com mais palavras.”

Sobre a liberdade que a leitura confere, Afonso Cruz conta a história de uma mulher do Kuwait que abandonou as vestes e os hábitos tradicionais: “Comecei a ler e libertei-me”. Há outras citações. Por exemplo, de uma inscrição egípcia: “Na biblioteca do faraó Ramsés II estava escrito por cima da porta de entrada: Casa para terapia da alma”. E do escritor francês Jules Renard: “Quando penso em todos os livros que tenho para ler, tenho a certeza de ainda ser feliz.” São citados outros escritores como Plutarco, Lewis Carroll, Edith Wharton, Stefan Zweig, Franz Kafka, Aldous Huxley, Rainer Maria Rilke, Elias Canetti, George Steiner e Rosa Montero.

O texto “O que se esconde debaixo de um poema” fez-me lembrar Jorge Luís Borges: “Um poeta, quando escreve um poema e levanta a folha onde o escreveu, descobre uma infindável pilha de poemas onde foi escrita toda a poesia que precedeu o seu poema, e ao pousar essa mesma folha verá que já contém o peso de incontáveis poemas escritos sobre aquele que acabou de escrever.” De facto, os livros têm sempre um passado e um futuro.

Vou colocar O Vício dos Livros na minha biblioteca perto de outros livros sobre livros. Acho que fica bem perto do livrinho de Montaigne Dos Livros (Teorema, 1999), que aliás Afonso Cruz cita, e onde o escritor francês comenta as suas leituras: “Não me apego aos livros novos porque os antigos me parecem mais ricos e mais sólidos”. E do de Proust O Prazer da Leitura (idem, 1997), onde se lê: “O que difere essencialmente entre um livro e um amigo, não é a sua maior ou menor sensatez, mas a maneira como se comunica com ele; a leitura, ao arrepio da conversa, consistindo para cada um de nós em receber comunicação de outro pensamento, mas permanecendo a sós.”

Na biblioteca do Rómulo, em Coimbra, os livros de Afonso Cruz estão na companhia dos de Carl Sagan, que, em Cosmos (Gradiva, 2020), escreveu: “Os livros permitem-nos viajar através do tempo, de beber na própria fonte o saber dos nossos antepassados. A biblioteca põe-nos em contacto com as concepções e o saber, a custo extraídos da natureza, das maiores mentes até agora existentes, com os melhores professores, provindos de todo o planeta e de toda a nossa história, para nos instruírem sem nos fatigarmos e para nos inspirarem a dar a nossa contribuição ao saber colectivo da espécie humana.” O mais recente livro de Afonso Cruz entrará um dia no Rómulo. Tenho esperança de que ajude a fomentar o vício dos livros.


CARLOS FIOLHAIS 



24 abril, 2021

𝑶 𝒗í𝒄𝒊𝒐 𝒅𝒐𝒔 𝒍𝒊𝒗𝒓𝒐𝒔, de Afonso Cruz



Autor: Afonso Cruz
Título: O vício dos livros
N.º de páginas: 118
Editora: Companhia das Letras
Edição: 1.ª- Abril 2021
Classificação: Reflexões
N.º de Registo: 3281


OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Para assinalar o Dia Mundial do Livro, li este belíssimo livro escrito e ilustrado por Afonso Cruz. Como se trata de um livro pequeno e de breve leitura, decidi Interromper a minha leitura actual  O Infinito num Junco, de Irene Vallejo, (livro fabuloso que apaixona qualquer viciado em livros, mas de leitura bem mais lenta quer pela dimensão quer pela informação) e assim comemorar o Dia em pleno.
𝑶 𝒗í𝒄𝒊𝒐 𝒅𝒐𝒔 𝒍𝒊𝒗𝒓𝒐𝒔 reúne histórias, relatos, poemas, memórias pessoais e reflexões sobre leitores, críticos e obviamente sobre o poder dos livros.

Lego-vos o pequeno texto “Princípio de anti-Fermat” que achei delicioso (p. 45)
Quando era adolescente, ia para a escola ler. Apanhava o autocarro que levava mais tempo (hora e meia em vez de uma hora, no total) porque assim não tinha de sair e apanhar o metro, permitindo-me passar mais tempo a ler. Como a paragem de origem era perto de minha casa, havia sempre lugar no autocarro. Escolhia o último, à janela.
O princípio de Fermat diz-nos que a luz não percorre a distância mais curta, mas sim o tempo menor entre dois pontos. Um leitor, muitas vezes, tenta encontrar o caminho mais lento entre dois pontos. Era isso que eu fazia. Ia para a escola pelo caminho com mais palavras.” (sublinhado meu)

E como amanhã se comemora o Dia da Liberdade, transcrevo também um excerto do texto “Liberdade” (p.49)
“ Caminhei pelo centro da cidade com uma escritora, bastante famosa no mundo árabe, (…). Tinha sido casada, durante mais de uma década, com um homem de uma família muito conservadora, teve dois filhos e depois divorciou-se. O que aconteceu? Perguntei eu, e ela respondeu que se libertou. Como? Insisti.
- Comecei a ler e libertei-me.”

E para terminar: “Ao contrário de tantos outros vícios, o dos livros, é, na verdade, uma virtude. De facto, ter livros não é o mesmo que, por exemplo, ter dinheiro. Ter livros é como ter amigos, ter dinheiro é como ter com que pagar a amigos. (p.65)

Recomendo a todos os viciados em livros. Só mesmo aos viciados porque os não-viciados não compreenderão que “a leitura é um diálogo entre autor e leitor e que, se não houver um abalo qualquer naquele que lê, então tudo terá sido em vão.” (p.62)

    



06 junho, 2020

O macaco bêbedo foi à ópera, de Afonso Cruz



OPINIÃO



O macaco bêbedo foi à ópera é um breve, mas muito interessante ensaio sobre a influência do álcool, da embriaguez, na civilização ao longo dos tempos. Afonso Cruz desenvolve a teoria de que os macacos desceram das árvores para apanhar os frutos maduros que se encontram no chão. Ora, segundo a mesma teoria, os frutos maduros têm mais açúcar, fornecem mais energia e emanam um cheiro a álcool. “O que sustenta a teoria do macaco bêbedo é que o fruto caído e demasiado maduro está em processo de fermentação. Cria etanol. E o etanol viaja pelo ar com facilidade e chega ao nariz de quem procura açúcar. Resumindo: o macaco desce da árvore porque lhe cheira a álcool e isso significa açúcar, energia, calorias, consequentemente um cérebro maior, e muitos milénios depois a possibilidade de ir à ópera.” (p. 14) 

Porém o autor não fica por aqui, para além de demonstrar claramente como tudo isto se processa, o autor foca-se também no desenvolvimento da agricultura, na sedentarização do homem, no fabrico do álcool, sobretudo da cerveja, no consumo do mesmo e no impacto causado no homem e por conseguinte na sociedade.
“Essa mudança teve consequências, boas e más, cabendo a cada um relevar ou obliterar os argumentos que porá na sua balança filosófica, política, social e ética.” (p. 39) 

Para desenvolver a sua teoria deveras surpreendente, pelo menos para mim, o autor lega-nos, ao longo do texto, várias referências a outros livros permitindo, a quem o desejar, o aprofundamento deste tema. Ma o que destaco deste ensaio é a simplicidade e a clareza da escrita, com pinceladas de ironia o que de certa forma facilita a assimilação da informação e torna a leitura cativante. A certa altura, quando o autor desenvolve alguns aspectos causados pela embriaguez, como a loucura, a jovialidade, a demência temporária, entre outros, refere que “ a poesia é uma forma de embriaguez da língua, das palavras, e que o poeta, um pouco como o bêbedo, a criança, o profeta (…) relaciona coisas irrelacionáveis e as transforma em beleza e, mais do que isso, na possibilidade de novas teorias científicas, sociais, políticas e tecnologia.” (pp. 46, 47) 

Ora, foi isto que aconteceu na escrita deste ensaio. Afonso Cruz certamente um pouco embriagado (ele próprio é produtor de cerveja artesanal), ofereceu-nos este delicioso pequeno livro.


19 novembro, 2019

Paz traz paz, de Afonso Cruz


SINOPSE


Da narradora d’O LIVRO DO ANO, aquela menina que carrega um jardim na cabeça e atira palavras aos pombos, chega-nos um novo diário com os seus pensamentos, inquietações, experiências e os sonhos de melhorar o mundo através de pequenos gestos ou actos heróicos, atacando o absurdo com o absurdo e a noite com canteiros de flores. Páginas feitas de inusitada poesia, para leitores de todos os feitios. Até os normais.

OPINIÃO

Como já o referi mais do que uma vez, a escrita do Afonso Cruz é “sumptuosa”. A pequena narradora, a partir de coisas e de palavras simples, apresenta-nos histórias, pensamentos, dúvidas, inquietações e ensinamentos belíssimos.

“Tenho vindo a perceber que as coisas pequenas
transformam-se
em coisas grandes e as coisas grandes
transformam-se
em coisas pequenas, não param de dançar.”

É assim, simples! Poético! Sublime!

“Enquanto os pássaros batem as asas para voar,
nós batemos o coração”

Para ler e reler sempre!



27 junho, 2019

Jalan Jalan - Uma Leitura do Mundo de Afonso Cruz







SINOPSE

«Apesar da beleza da paisagem, dos campos de arroz, do verde omnipresente, dos templos hindus, dos macacos zangados, uma das melhores coisas que trouxe de Bali foi uma oferta do João, que me embrulhou e ofereceu uma palavra, talvez duas: Jalan significa rua em indonésio, disse-me. Também significa andar. Jalan jalan, a repetição da palavra, que muitas vezes forma o plural, significa, neste caso, passear. Passear é andar duas vezes. (…) Passear é o que fazemos para não chegar a um destino, não se mede pela distância nem pela técnica de colocar um pé à frente do outro, mas sim pelo modo como a paisagem nos comoveu ou como o voo de um pássaro nos tocou. É um pouco como a arte, tem o valor imenso de tudo aquilo que não tem valor nenhum. Pode não ter razão, destino, objetivo, utilidade, e é exatamente aí que reside a riqueza do passeio. Não existem profissionais do passeio. Chesterton, que era um grande apologista do amador, dizia que as melhores coisas da vida, bem como as mais importantes, não são profissionalizadas. O amor, quando é profissionalizado, torna-se prostituição.»


OPINIÃO


Jalan Jalan – Uma Leitura do Mundo é um livro autobiográfico porque relata episódios vividos, leituras, pensamentos e sobretudo impressões das suas múltiplas viagens. Há, por isso, uma grande diversidade de textos e de temas, alguns ilustrados e enriquecidos por fotografias. Muitas referências a escritores, filósofos, artistas, entre outros. 
A viagem é o aspecto primordial do livro. Não só a viagem como forma de conhecer o mundo, mas também a viagem interior de cada um. Viajar, para o autor, não implica obrigatoriamente uma deslocação. Podemos viajar através dos livros. Podemos viajar através do pensamento, da imaginação. 

“Muitas das minhas viagens começaram pelos livros. Foram caminhos que saíram das folhas e se prolongaram para lá das estantes, das paredes da biblioteca.” (p. 402) 

Penso que o autor foi muito feliz na escolha do título do livro. Efectivamente, o leitor vai passeando, viajando pelas suas páginas (sem uma sequência obrigatória) e recolhendo ensinamentos. 

“ Jalan significa rua em indonésio (…). Também significa andar. Jalan Jalan, a repetição da palavra, que muitas vezes forma o plural, significa, neste caso, passear. Passear é andar duas vezes.” (p. 27) 

“Passear faz parte das actividades mais importantes da vida, daquelas que fazemos por amor, simplesmente pelo prazer de não ir para lado nenhum. 

Ou melhor de nos reencontramos” (p. 28)



18 abril, 2019

Vamos comprar um poeta de Afonso Cruz


SINOPSE

Plano Nacional de Leitura
Livro recomendado para o 9.º ano de escolaridade, destinado a leitura orientada na sala de aula.

Numa sociedade imaginada, o materialismo controla todos os aspectos das vidas dos seus habitantes. Todas as pessoas têm números em vez de nomes, todos os alimentos são medidos com total exactidão e até os afectos são contabilizados ao grama. E, nesta sociedade, as famílias têm artistas em vez de animais de estimação. A protagonista desta história escolheu ter um poeta e um poeta não sai caro nem suja muito - como acontece com os pintores ou os escultores - mas pode transformar muita coisa. A vida desta menina nunca mais será igual…

Uma história sobre a importância da Poesia, da Criatividade e da Cultura nas nossas vidas, celebrando a beleza das ideias e das acções desinteressadas.

OPINIÃO

Em Vamos comprar um poeta, os assuntos do dia-a-dia versam sobre a conjuntura económica, a necessidade de apertar o cinto, o orçamento da empresa, lucro, contas e mais contas. Tudo (o nome das pessoas, os alimentos que se ingerem, os sentimentos…) é quantificado em números, em estatísticas, em gramas, em percentagem, em tamanho. 

Estava uma manhã muito bonita, o ar, como se costuma dizer, cheirava a dólares. O meu irmão levantou-se com alegria e espreguiçou-se duas vezes, esticando os braços de dívida colossal para os lados.” 

A narrativa é feita na primeira pessoa por uma jovem que vive inserida numa família focada nos números, até ao dia em que lhe apeteceu comprar um poeta, como se compra um animal de estimação. 

“Gostava de ter um poeta. Podemos comprar um?” (…) “Muito bem, disse o pai, compramos um poeta. De que tamanho?” 

Ora, a presença do poeta vai alterar a ordem normal da vida desta família. A protagonista, a pouco e pouco, deixa-se contaminar pelas metáforas do poeta (encaradas como mentiras pelos outros) e vai adquirindo o gosto pela poesia, pelo belo, pela cultura. “Estarei a ficar poética?” questiona-se. 

Sorriu, ou, como diria o poeta, a boca desenhou um sorriso depois de o lápis ter feito amor com o papel e desse beijo de grafite ter nascido…É melhor parar com isto, que loucura é esta?!” 

Com esta pequena e belíssima história, Afonso Cruz pretende chamar a atenção para a excessiva importância que se dá à economia, e ao consumismo na nossa sociedade em detrimento da cultura e da poesia. É um apelo urgente à cultura, à beleza, à poesia. “NUNCA SE ABANDONA A POESIA NEM NUM PARQUE, NEM NA VIDA” 

Recomendo vivamente.

14 abril, 2019

Mar de Afonso Cruz


SINOPSE

O novo volume da Enciclopédia da História Universal, série distinguida com o Prémio de Conto Camilo Castelo Branco. Mais uma vez, Afonso Cruz volta a desafiar os géneros e escreve um volume de Enciclopédia que, afinal, é um romance em várias entradas: um conjunto de histórias interligadas entre si, todas elas sobre o MAR, o seu apelo, o seu fascínio. Histórias encantatórias a que não faltam personagens inesquecíveis, como a do homem que tem o céu tatuado na pele ou o músico que lança cartas de amor ao mar.


OPINIÃO

Mar - Enciclopédia da Estória Universal, é uma obra extraordinária. Mais uma de Afonso Cruz. Por ordenação alfabética, o leitor vai tendo contacto com histórias que se entrelaçam, acontecimentos, pensamentos, recordações, aforismos, citações tendo sempre o mar como elemento comum. 

“A sabedoria é um peixe que cresce na alma.”

“Por vezes, passeio pelas recordações que tenho da mãe, sento-me junto ao mar da minha infância.”

"Dizem que cada homem é uma ilha, mas, para ser preciso, cada homem é um náufrago."

Nem sempre é fácil de descortinar a realidade do imagético e é este aspecto que, na minha opinião, torna este livro intenso, inquietante, deslumbrante. O leitor facilmente se deixa envolver pela escrita poética e pelas personagens fabulosas de Afonso Cruz. Há mães que diminuem, há um homem com constelações tatuadas no corpo, há o One-eyed-Jonas, há o Elijah- o-impossível, há um bilhete de autocarro de Houston, há cartas de amor em garrafas que chegam à orla da praia, há náufragos, há ilhas, há peixes, há pão... Há textos longos com várias entradas, há textos curtos, há textos de uma só frase… Há poesia!

A segunda vez que a vi, tive a ousadia de lhe atirar algumas palavras, e ela teve a bonomia de as receber no colo dos seus ouvidos, como quem embala recém-nascidos.”




18 dezembro, 2018

O Pintor Debaixo do Lava-Loiças de Afonso Cruz



O autor parte de uma história de família, a dos seus avós, para criar a história de Jozef Sors, pintor eslovaco que nasceu no final do século XIX e que um dia veio para a Portugal. 

Mais uma vez nos deixamos embalar pela escrita metafórica e imagética de Afonso Cruz. Este pequeno livro contém inúmeras reflexões sobre o ser humano. Há sonhos e desilusões, lutas e conquistas, redescobertas e perdas, luz e sombras, muitas mensagens fortes que por vezes nos perturbam porque inesperadas.·

“Parece-me uma grande felicidade que, quando se olhe para o mundo, pareça sempre que é a primeira vez que o fazemos.” 

"A última página de um livro é a primeira do próximo".



21 novembro, 2018

Princípio de Karenina



Mais um livro fabuloso de Afonso Cruz. Numa escrita poética, metafórica com descrições cinematográficas, o autor narra a história de uma personagem que conta a sua vida à filha que nunca conheceu. 
Diria que este livro apresenta dois grandes eixos de ideias: rotina, escuridão, medo, infelicidade e novidade, claridade e felicidade. O primeiro imposto pelo pai e seguido pelo filho, o segundo provocado pela chegada da estrangeira. 

“Passados tantos anos, ainda sinto um sabor estranho na boca quando pronuncio a palavra que a tua mãe disse na sala, no dia em que a conhecemos, a palavra que começou o derradeiro ataque contra o edifício que eu construíra com os blocos de pedra da educação paterna.” (p. 101)


31 março, 2017

Nem Todas As Baleias Voam de Afonso Cruz



Mais um excelente romance de Afonso Cruz. Estamos perante uma história de amor, de um amor puro por uma mulher mas também pela música (jazz). Mas para além deste sentimento, as personagens vão confrontar-se com outros como a solidão, a ausência, a dor e a proximidade da morte. Erik Gould o protagonista exprime as suas emoções através da música e tenta incutir no seu filho Tristan todas estas sensações. Ambos sofrem da mesma doença "a sinestesia".
Este livro de Afonso Cruz toca-nos profundamente. Recomendo muito.

27 julho, 2014

Encontro com Afonso Cruz




Integrado no Festival Músicas do Mundo (FMM) de Sines, no dia 24 de julho,  o escritor esteve à conversa com os seus leitores. A apresentação foi feita por Joaquim Gonçalves, livreiro de A Das Artes. 







06 maio, 2014

Para onde Vão os Guarda-chuvas vence Prémio Autores para Melhor Livro de Ficção Narrativa





A obra de Afonso Cruz recebe a distinção na categoria Literatura, atribuído pela Sociedade Portuguesa de Autores (SPA). A entrega do prémio decorre no dia 8 de maio, pelas 18.00, no Salão Nobre dos Paços do Conselho da Câmara Municipal de Lisboa.

A Rocha Branca, de Fernando Campos, e No Labirinto de Centauro, de Rui Vieira, estavam também nomeados para o prémio de Melhor Livro de Ficção Narrativa. Irmão Lobo, de Carla Maia de Almeida, foi nomeado para Melhor Livro Infantojuvenil.

Em 2011, Afonso Cruz conquistou o prémio Autores SPA/RTP com o livro A Contradição Humana.








01 maio, 2014

Leituras de abril

    O Beco dos Milagres


A Sala de Aula relata episódios que acontecem frequentemente nas escolas portuguesas e aborda alguns aspetos importantes do ensino em Portugal. Para quem está inserido no sistema, este livro apenas confirma o estado da educação que se vem agravando ao longo dos tempos.

O livro de Afonso Cruz está pleno de poesia... e de amor. É de leitura obrigatória.

O Beco dos Milagres, como o título indica, acontece num beco, no Cairo,  e por isso temos muitos mexericos (próprios de vizinhos que se conhecem bem), paixões, ódios e muito mais que o leitor deve descobrir por si.