28 outubro, 2020

Uma aventura na biblioteca, de Ana Maria Magalhães e Isabel Alçada

 


OPINIÃO

No âmbito de uma actividade escolar, voltei aos livros “Uma Aventura…”. Como em Outubro se assinala o Mês Internacional das Bibliotecas Escolares, optei pelo título “Uma aventura na biblioteca”. 
Foi um prazer enorme relembrar estas aventuras, envolvi-me de novo nas peripécias do grupo de protagonistas e temi que algo de grave lhes acontecesse (apesar de já saber que tudo se resolve, no fim). E com este entusiamo, dou por mim a observar atentamente os alunos que estão comigo, também eles, a ler “Uma aventura…”. Tristemente, percebo que apenas três ou quatro estão realmente motivados, que alguns manifestam um evidente enfado e que os restantes fingem completamente que estão a ler. 
É nesse momento que me assaltam as minhas memórias de meninice e o prazer que tive em ler todos os livros das colecções dos Cinco e dos Sete, de Enyd Blyton. Devorei-os todos.
Era mesmo um prazer enorme! Esperava ansiosamente que a carrinha da Gulbenkian voltasse para poder escolher mais livros. Belas recordações! Saudades desses tempos de felicidade! 
Mas voltando à realidade que é bem mais preocupante, que fazer perante a falta de empatia destes jovens em relação aos livros e à leitura? Por que é que ler tem de ser um aborrecimento? Resta-me insistir… insistir… tentar motivá-los! Pode ser que consiga conquistar um ou outro. Se tal acontecer, já não é mau! 



27 outubro, 2020

As Bicicletas em Setembro, de Baptista-Bastos

 


OPINIÃO

Há muito que não lia Baptista-Bastos. Lamentável! Não podemos adiar escritores que nos revelam uma escrita perfeita, coerente, poética. 
Neste livro, conhecemos Jesuina, “a mulher cheia de lágrimas”, e alguns jovens que acolhia em sua casa, as vizinhas, as intrigas próprias de um bairro de Lisboa, a inveja, a maledicência, a dor e a solidão. 

“A intriga e a má-lingua são o que há de mais engenhoso na vida. Caminham sem rumo, numa geometria confusa, nascidas do ócio e multiplicadas por uma espécie particular de ódio, de ciúme, de despeito.” (p. 50)

Num livro onde a imaginação e a memória se confundem, o leitor deixa-se facilmente conduzir pelas emoções, pelos lugares dos desejos, das desilusões, do sonho e da solidão. 
“ Ela [Jesuina] estremecia, emergia desse oceano antigo habitado por convulsas recordações, suspirava, permanecia largos momentos a recompor-se, reentrava na pobre realidade (…).” (p.22)

A metáfora das Bicicletas em Setembro reproduz magistralmente a efemeridade do tempo “fugitivo e eterno”, a revisitação a um passado que já só existe em recordações e a tentativa de sobreviver à saudade, à perda, à dor e à solidão.

“Sobre as nuvens em Setembro, que formavam círculos e pareciam rodas de bicicletas, quem me dera ir com elas, por esses céus fora, quem me dera.” (p.8) 


“Por detrás das cortinas das casas que já não há, ela vigia, observa as pessoas que por ali já não caminham, e olha para as nuvens que deixaram de ser rodas de bicicletas no céu.” (p.123)


21 outubro, 2020

Um Corpo na Biblioteca, de Agatha Christie

 


OPINIÃO


Gosto muito dos livros de Agatha Christie, mas confesso que este me desiludiu um pouco, primeiro porque o título induziu-me em erro, parti do princípio que a trama se desenvolveria numa biblioteca, ora, tal não acontece. Não posso afirmar que é um título enganador, porque não o é. O enredo, efectivamente, inicia aí com a descoberta de um corpo. Nada mais, tanto podia estar ali como noutra divisão qualquer. Segundo, porque a investigação é conduzida por inspectores locais. Miss Marple que é, no entanto, convidada a fazer a sua própria investigação é relegada para segundo plano, aparecendo esporadicamente. Este facto, anula um pouco, na minha opinião, o suspense e o desenvolvimento do seu raciocínio aos quais já nos habituou. Porém, é ela que desvenda o caso, facto que irrita os inspectores que mais uma vez concluem que “a velhinha com uma expressão doce de solteirona plácida e uma mente que vasculhou as profundezas da iniquidade humana e trata do assunto como se não fosse nada especial (…) que concerne a crimes, é o que há de melhor." 

Mas, considero que a mestria da autora no desenvolvimento do “enredo intrincado” continua bem presente. Ela é genial a apresentar pistas, a revelar factos muito plausíveis de incriminar cada uma das personagens. Como se previa, e não podia deixar de ser, é Miss Marple que, de forma surpreendente, revela o autor do crime. Brilhante! Tudo encaixa! Ela é mesmo a melhor! 




18 outubro, 2020

Memória de Elefante, de António Lobo Antunes

 


OPINIÃO


Memória de Elefante é a estreia de António Lobo Antunes como escritor. Já com um estilo muito próprio, mas ainda em formação, que requer uma leitura atenta e cuidada. Estamos perante a história de um homem, psiquiatra, que vive um momento conturbado da sua vida. 

O livro de carácter autobiográfico é perturbador pois concentra-se no protagonista, homem de meia-idade, divorciado, que vive um intenso conflito interior. A narrativa relata os acontecimentos de um dia de trabalho, mas incide sobretudo nos seus pensamentos, memórias, saudades (da mulher e dos filhos) e dúvidas existenciais. “Mas ele, ele, ELE quando é que se lixara?” (p.27). 

A solidão, a desilusão e a revolta são os sentimentos dominantes desta narrativa. O protagonista amargurado com a vida e consigo mesmo odeia tudo, o local onde trabalha, os colegas, os pacientes, a sociedade hipócrita.
Porém, no final, surge uma réstia de esperança ou será resignação?

“Amanhã recomeçarei a vida pelo princípio, serei o adulto sério e responsável que a minha mãe deseja e a minha família aguarda, chegarei a tempo à enfermaria, pontual e grave, pentearei o cabelo para tranquilizar os pacientes, mondarei o meu vocabulário de obscenidades pontiagudas. (…) preciso de qualquer coisa que me ajude a existir.” (p.188)

 


14 outubro, 2020

Isabel de Aragão - Entre o Céu e o Inferno, de Isabel Stilwell

 


OPINIÃO


É o primeiro livro que leio da autora. E posso afirmar que gostei, apesar de não ser leitora assídua de romances que narram a vida de reis ou rainhas. Considero que há sempre muita coscuvilhice e muita intriga. 
Sendo um romance histórico sobre Isabel de Aragão, a Rainha Santa Isabel, narra acontecimentos da nossa História com fidelidade. Tendo 527 páginas, poder-se-ia tornar num relato maçudo com tantas guerras e desavenças, com tantos filhos legítimos e bastardos, mas a escrita e a estrutura do romance (capítulos curtos) torna o relato vivo e interessante. Ficou claro o jogo político vigente na época entre os Reinos de Portugal, Aragão e Castela, provocando intrigas, guerras, mortes, ao longo de vários reinados. Mas há também momentos de imensa ternura entre mães e filhos; de cumplicidade entre o avô, D. Jaime I e “Rosinha” , entre Isabel e Vataça; de dor e angústia, de ódio e de morte; de intrigas e de acordos; de solidariedade e partilha entre Isabel e os seus doentes, pobres e desprotegidos. 
Porém, o que mais me agradou neste romance foi o destaque dado às mulheres, sobretudo à Rainha e a Vataça Lascaris. Duas mulheres fortes, inteligentes, decididas, amigas e aliadas. Raramente falharam e erraram, muitas vezes afastadas uma da outra pelas circunstâncias, por elas ditadas, conseguiram evitar ou diminuir desaires e agravos. 

“A melhor rosa de Aragão”, assim tratada pelo seu avô D. Jaime I, o Conquistador da Casa de Aragão, viveu “entre o céu e o inferno”, dividida entre o amor, a fé, a oração e as desavenças e confrontos, primeiro em Aragão e depois em Portugal. Foi uma vida inteira de planos, de estratégias, de intrigas para atenuar e resolver muitos dos conflitos provocados pelos seus familiares que “Como Caim e Abel” se digladiavam em busca de poder e de conquista de territórios


08 outubro, 2020

Louise Glück vence Prémio Nobel da Literatura 2020

 



A poeta norte-americana Louise Glück é a vencedora do Prémio Nobel da Literatura de 2020. O galardão foi-lhe atribuído pela sua “voz poética inconfundível que, com beleza austera, torna a existência individual universal”, justificou a Academia Sueca.

Louise Glück é a 16ª mulher a vencer o Nobel da Literatura desde a sua criação, em 1901, e uma das poucas norte-americanas a recebê-lo.

Louise Glück, de 77 anos, é uma das mais celebradas poetas norte-americanas. A escritora nasceu a 22 de abril de 1943, em Nova Iorque, e estreou-se no mundo da literatura em 1968, com a coletânea de poemas Firstborn, sendo desde logo apontada como uma das vozes mais fortes da nova geração de poetas dos Estados Unidos da América. Temas como a infância e vida familiar ou as relações estreias entre pais e irmãos destacaram-na de outros autores, e continuaram presentes na sua obra, constituída hoje por 12 volumes de poesia e alguns ensaios.



Paisagem/3

Nos fins do outono uma rapariga deitou fogo
a um trigal. O outono

fora muito seco; o campo
ardeu como palha.

Depois não sobrou nada.
Se o atravessávamos, não víamos nada.

Nada havia para colher, para cheirar.
Os cavalos não compreendem –

Onde está o campo, parecem dizer.
Como tu ou eu a perguntar
onde está a nossa casa.

Ninguém sabe responder-lhes.
Não sobra nada;
resta-nos esperar, a bem do lavrador,
que o seguro pague.

É como perder um ano de vida.
Em que perderias um ano da tua vida?

Mais tarde regressas ao velho lugar –
só restam cinzas: negrume e vazio.

Pensas: como pude viver aqui?

Mas na altura era diferente,
mesmo no último verão. A terra agia
como se nada de mal pudesse acontecer-lhe.

Um único fósforo foi quanto bastou.
Mas no momento certo – teve de ser no momento certo.

O campo crestado, seco –
a morte já a postos
por assim dizer.


07 outubro, 2020

A Biblioteca à Noite, de Alberto Manguel

 


OPINIÃO



Quem gosta de livros, de bibliotecas não pode deixar de ler este livro. É um livro bem estruturado, dividido em 15 capítulos e ilustrado com várias fotografias que complementam a informação dada pelo autor. 

Para criar e manter a sua biblioteca pessoal, múltiplas questões ( as mesmas de muitos bibliotecários) lhe foram surgindo. E é partindo da pergunta “Porque o fazemos, então?” (p.15) que Manguel nos explica por que razão ao longo dos tempos, desde a Antiguidade até ao presente, o homem vai reunindo livros em prateleiras e prateleiras. Respondendo a essa questão, o autor vai explanando o seu conhecimento e o seu fascínio pela história das bibliotecas. Das bibliotecas públicas e privadas; modernas, antigas, desaparecidas, míticas; de organização, de classificação, de democratização; de censura, de livros queimados, perdidos, roubados, proibidos, digitais, imaginados, lidos e não- lidos.

“Não tenho nenhum sentimento de culpa acerca dos livros que não li e que talvez nunca lerei; sei que os meus livros têm uma paciência sem limites. Esperarão por mim até ao fim dos meus dias.” (p. 218) 

Já percebemos, que para Manguel as bibliotecas não são meros espaços de armazenamento de livros. Se assim fosse, não precisaria de cerca de trezentas páginas para nos responder à questão inicial. Para ele, são espaços de cultura, de conhecimento, de informação que “espelham a identidade pluralista, vertiginosa e desafiante do país e dos tempos” (p.258) 

“Preservar e transmitir a memória, aprender através da experiência dos outros, partilhar conhecimento do mundo e de nós próprios são alguns dos poderes (e perigos) que os livros nos concedem, e as razões por que os estimamos tanto quanto os receamos. “ (p.227) 

Para terminar e vos motivar à leitura deste livro deixo-vos, futuro leitor, uma última citação:
“Todo o leitor é ou um andarilho que se detém ou um viajante que regressa.” (p. 260).

03 outubro, 2020

Astérix e Latraviata

 



OPINIÃO

Releio sempre as histórias de Astérix com imenso prazer. Divirto-me… delicio-me… é uma excelente terapia para aliviar o cansaço.