31 janeiro, 2024

Leituras | 1 mês

 

𝑽𝒊𝒂𝒈𝒆𝒏𝒔, de Olga Tokarczuk



Autora: Olga Tokarczuk
Título: Viagens
Tradutora: Teresa Fernandes Swiatkiewicz
N.º de páginas: 343
Editora: Cavalo de Ferro
Edição (8.ª): Dezembro 2020
Classificação: Viagem/reflexões
N.º de Registo: (BE)

OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Este Viagens escrito de forma fragmentada vai ganhando consistência e sentido à medida que avançamos na leitura. Temos textos narrativos intercalados de reflexões, de ensaios científicos, de pequenos apontamentos, registos, cartas, fotografias, mapas… textos brevíssimos, curtos, longos, incompletos, descontínuos, retomados mais à frente, como se de uma manta de retalhos se tratasse.

Nestas viagens não há turismo na verdadeira acepção da palavra. Há, sim, o olhar da autora sobre locais, pessoas, objectos do quotidiano, emoções, ciência, anatomia (corpo humano, recolha de órgãos, conservação e plastinação de corpos) religião, loucura, amor, psicologia,…
“ –Há coisas que acontecem por si mesmas, há viagens que começam e acabam em sonhos e há viajantes que respondem ao chamamento balbuciante do seu próprio desassossego.” (p. 86); “ a possibilidade infinita de viajar pelo corpo de um organismo” (p. 115);

Não é fácil acompanhar a viagem mental da autora. Várias vezes, sentimos necessidade de reler um parágrafo, um texto, de revisitar “uma viagem”, de conferir/completar uma informação, para assim irmos tecendo a manta de trezentas e tal páginas.
Olga Tocarczuk encara nesta obra, “o significado metafórico dos lugares”, isto é “o caminho individual de cada viajante e do sentido profundo da sua viagem.” (p. 150).
Cabe a cada um descobrir a viagem que pretende fazer nem que seja através de um filme, de um livro, de uma pintura, de um sonho, de uma conversa.
“Existe uma importante síndrome que recebeu o nome de Stendhal e que consiste em visitar um lugar conhecido através da literatura ou da arte e vivenciá-lo de modo tão intenso que se chega a desmaiar ou a sentir fraqueza.” (p.153)

Recomendo a leitura. Trata-se de um belíssimo manancial de informação, aprendizagem e divagação.






27 janeiro, 2024

𝑷𝒆𝒍𝒂 𝑳𝒊𝒃𝒆𝒓𝒅𝒂𝒅𝒆: 𝑹𝒆𝒔𝒑𝒊𝒓𝒂çõ𝒆𝒔, de Ana Luísa Amaral


Autora: Ana Luísa Amaral
Título: Pela Liberdade: Respirações
Ilustradora: Bárbara R.
N.º de páginas: 12
Editora: U. Porto Press
Edição: Outubro 2020
Classificação: Poesia
N.º de Registo: (3504


OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐



O primeiro livro da colecção Concertina, editado pela U. Porto Press é um objeto/livro belíssimo com uma apresentação fora do comum (em concertina) e magnificamente ilustrado por Bárbara R. em harmonia com os seis poemas de Ana Luísa Amaral que configuram o tema da Liberdade.
Os títulos dos poemas são desde logo elucidativos: “Identidade"; "As cores da Servidão" (1 e 2); "A outra servidão: paisagem com dois cavalos"; "O tom da liberdade"; "A luta".

São poemas que versam questões universais como a ausência de liberdade, a opressão, a raça, a escravatura, a colonização, a violência, o poder.

Em “O tom da liberdade” a autora recorre à metáfora do gato para revelar a necessidade que cada um tem de ser livre “ o estar quando se quer/ e o não estar quando não”. É um poema lindíssimo, talvez o meu preferido.

Ana Luísa Amaral nestes seis poemas revela uma escrita sensível, subtil, atenta e preocupada com a condição do ser humano.

Recomendo.







Campo de concentração, de António Gedeão

 


Teus olhos, aves que poisas
sobre as amarguras do mundo,
e que bebem até ao fundo das coisas
como se as coisas não tivessem fundo;
teus olhos, de asas bem abertas,
povoaram de voos o claustro do meu rosto,
e interrogaram as sombras, as sombras sempre despertas
deste sono pressuposto

Vai-te. Não interrogues nada que eu não sei dizer-te nada.
Isto, e isso, e aquilo, não é isso, não é aquilo nem isto.
Não é nada.
Ou talvez não seja nada.
Ou talvez só seja isto:
um pavor de madrugada,
um mal que se chama existo.


Um poema de António Gedeão



23 janeiro, 2024

23 de Janeiro (?) de 1524 - 500 Anos



                                                    Hilario Sineiro: Luís Vaz de Camões




O dia em que nasci morra e pereça,
Não o queira jamais o tempo dar,
Não torne mais ao Mundo, e, se tornar,
Eclipse nesse passo o sol padeça.

A luz lhe falte, o céu se lhe escureça,
Mostre o Mundo sinais de se acabar,
Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar,
A mãe ao próprio filho não conheça.

As pessoas, pasmadas de ignorantes,
As lágrimas no rosto, a cor perdida,
Cuidem que o mundo já se destruiu.

Ó gente temerosa, não te espantes,
Que este dia deitou ao Mundo a vida
Mais desgraçada que jamais se viu!



Luís Vaz de Camões 



22 janeiro, 2024

Fiquei doido, fiquei tonto...

 

                                         Toulouse Lautrec | Au lit, le baiser | 1892


Fiquei doido, fiquei tonto...
Meus beijos foram sem conto,
Apertei-a contra mim,
Aconcheguei-a em meus braços,
Embriaguei-me de abraços...
Fiquei tonto e foi assim...

Sua boca sabe a flores,
Bonequinha, meus amores,
Minha boneca que tem
Bracinhos para enlaçar-me,
E tantos beijos p'ra dar-me
Quantos eu lhe dou também.

Ah que tontura e que fogo!
Se estou perto dela, é logo
Uma pressa em meu olhar,
Uma música em minha alma,
Perdida de toda a calma,
E eu sem a querer achar.

Dá-me beijos, dá-me tantos
Que, enleado nos teus encantos,
Preso nos abraços teus,
Eu não sinta a própria vida,
Nem minha alma, ave perdida
No azul-amor dos teus céus.

Não descanso, não projecto
Nada certo, sempre inquieto
Quando te não beijo, amor,
Por te beijar, e se beijo
Por não me encher o desejo
Nem o meu beijo melhor.


Fernando Pessoa


21 janeiro, 2024

Papoilas

 

                            Claude Monet | Champs de coquelicots en Argenteuil | 1873



estou opiada de ti
e percorres-me os nervos todos
com papoilas borboletas vermelhas

o meu corpo entrança-se de sonhos
e sente-se caminhando por dentro

aspiro-te
como se me faltasse o ar
e os perfumes dançam-me

qualquer coisa como uma droga bem forte
corpo e alma
rezam pequenas orações
gestos ritmados ao abraçar-te como que abraça
sonhos

coisa estranha

opiada me preciso ou apenas vestida de papoilas e
muito sol com luas por dentro

para poder mastigar estes sonhos
reais como mandrágoras


Poema de Ana Mafalda Leite



20 janeiro, 2024

À 𝑬𝒔𝒑𝒆𝒓𝒂 𝒅𝒆 𝑩𝒐𝒋𝒂𝒏𝒈𝒍𝒆𝒔, Olivier Bourdeaut

 

Autor: Olivier Bourdeaut
Título: À Espera de Bojangles
Tradutor: Rui Santana Brito
N.º de páginas: 193
Editora: Guerra e Paz
Edição: Abril 2016
Classificação: Romance
N.º de Registo: (2912)



OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐



Que livro louco, estonteante, maravilhoso. No seu primeiro romance, Olivier Bourdeaut convida-nos a dançar ao som de Mister Bojangles; convida-nos a celebrar a vida e a amar loucamente; convida-nos a sonhar o inimaginável, a ultrapassar “as sacanices da vida” e até a aceitar o inaceitável.
“Sobre a cómoda da sala, (…) havia um velho e belíssimo gira-discos onde tocava sempre o mesmo vinil de Nina Simone e a mesma canção: Mister Bojangles. (…) . Aquela música era mesmo diferente, era triste e alegre ao mesmo tempo e, ao ouvi-la, a minha mãe ficava no mesmo estado. ”(p.22) e ainda

Numa escrita inteligente, poética carregada de humor e de alfinetadas ao convencional, o autor funde fantasia e realidade, mergulha as suas personagens num ambiente onírico, irreal, extravagante e apaixonado. Ao leitor só lhe resta “dançar ao som da música” que é como quem diz, apreciar a escrita, envolver-se no enredo que subtilmente e com mestria se vai adensando.
É sob o olhar ingénuo e fascinado do filho do casal, eternamente apaixonados, e do registo diarístico do pai que nos inteiramos das peripécias, das “mentiras ao contrário”, das farras, dos delírios desta família original e exuberante que se evade da banalidade para edificar momentos de felicidade e de fantasia. “ O meu pai sabia muito bem inventar belas mentiras por amor.” (p. 165)

O leitor vai folheando as páginas e absorvendo naturalmente cada palavra, cada decisão, aceitando e partilhando com prazer aquele “amor louco” que valida aquela estranha forma de viver, até que o previsível mas (in)aceitável acontece.
Não vou desvendar a viagem alucinante da parte final. Contudo, posso afirmar que se trata de um belíssimo romance de amor. Um romance de amor pintado com a magia do autor e balanceado ao ritmo de Mister Bojangles.

“Depois, logo que o derradeiro raio de Sol desaparecia por trás do cume da montanha, começavam a ouvir-se as primeiras notas de Bojangles a vibrar na voz doce e quente de Nina Simone e nos acordes do piano. Era tão bonito que toda a gente se calava para ver a minha mãe chorar em silêncio.”(p. 62)




19 janeiro, 2024

Eugénio de Andrade - Dia de Aniversário

 

                                                                           Foto GR



Procuro-te


Procuro a ternura súbita,
os olhos ou o sol por nascer
do tamanho do mundo,
o sangue que nenhuma espada viu,
o ar onde a respiração é doce,
um pássaro no bosque
com a forma de um grito de alegria.

Oh, a carícia da terra,
a juventude suspensa,
a fugidia voz da água entre o azul
do prado e de um corpo estendido.

Procuro-te: fruto ou nuvem ou música.
Chamo por ti, e o teu nome ilumina
as coisas mais simples:
o pão e a água,
a cama e a mesa,
os pequenos e dóceis animais,
onde também quero que chegue
o meu canto e a manhã de maio.

Um pássaro e um navio são a mesma coisa
quando te procuro de rosto cravado na luz.
Eu sei que há diferenças,
mas não quando se ama,
não quando apertamos contra o peito
uma flor ávida de orvalho.

Ter só dedos e dentes é muito triste:
dedos para amortalhar crianças,
dentes para roer a solidão,
enquanto o verão pinta de azul o céu
e o mar é devassado pelas estrelas.

Porém eu procuro-te.
Antes que a morte se aproxime, procuro-te.
Nas ruas, nos barcos, na cama,
com amor, com ódio, ao sol, à chuva,
de noite, de dia, triste, alegre – procuro-te.



Eugénio de Andrade, As Palavras Interditas


13 janeiro, 2024

“O menino que escrevia versos” – um conto de Mia Couto



                                                           Home Lessons | 1887 | Ralph Hedley




De que vale ter voz
se só quando não falo é que me entendem?
De que vale acordar
se o que vivo é menos do que o que sonhei?
(Verso do menino que fazia versos)

— Ele escreve versos!

Apontou o filho, como se entregasse criminoso na esquadra. O médico levantou os olhos, por cima das lentes, com o esforço de alpinista em topo de montanha.
— Há antecedentes na família?
— Desculpe doutor?

O médico destrocou-se em tintins. Dona Serafina respondeu que não. O pai da criança, mecânico de nascença e preguiçoso por destino, nunca espreitara uma página. Lia motores, interpretava chaparias. Tratava bem, nunca lhe batera, mas a doçura mais requintada que conseguira tinha sido em noite de núpcias:
— Serafina, você hoje cheira a óleo Castrol.
Ela hoje até se comove com a comparação: perfume de igual qualidade qual outra mulher ousa sequer sonhar? Pobres que fossem esses dias, para ela, tinham sido lua-de-mel. Para ele, não fora senão período de rodagem. O filho fora confeccionado nesses namoros de unha suja, restos de combustível manchando o lençol. E oleosas confissões de amor.
Tudo corria sem mais, a oficina mal dava para o pão e para a escola do miúdo. Mas eis que começaram a aparecer, pelos recantos da casa, papéis rabiscados com versos. O filho confessou, sem pestanejo, a autoria do feito.
— São meus versos, sim.
O pai logo sentenciara: havia que tirar o miúdo da escola. Aquilo era coisa de estudos a mais, perigosos contágios, más companhias. Pois o rapaz, em vez de se lançar no esfrega-refrega com as meninas, se acabrunhava nas penumbras e, pior ainda, escrevia versos. O que se passava: mariquice intelectual? Ou carburador entupido, avarias dessas que a vida do homem se queda em ponto morto?
Dona Serafina defendeu o filho e os estudos. O pai, conformado, exigiu: então, ele que fosse examinado.
— O médico que faça revisão geral, parte mecânica, parte eléctrica.
Queria tudo. Que se afinasse o sangue, calibrasse os pulmões e, sobretudo, lhe espreitassem o nível do óleo na figadeira. Houvesse que pagar por sobressalentes, não importava. O que urgia era pôr cobro àquela vergonha familiar.

Olhos baixos, o médico escutou tudo, sem deixar de escrevinhar num papel. Aviava já a receita para poupança de tempo. Com enfado, o clínico se dirigiu ao menino:
— Dói-te alguma coisa?
—Dói-me a vida, doutor.
O doutor suspendeu a escrita. A resposta, sem dúvida, o surpreendera. Já Dona Serafina aproveitava o momento: Está a ver, doutor? Está ver? O médico voltou a erguer os olhos e a enfrentar o miúdo:
— E o que fazes quando te assaltam essas dores?
— O que melhor sei fazer, excelência.
— E o que é?
— É sonhar.
Serafina voltou à carga e desferiu uma chapada na nuca do filho. Não lembrava o que o pai lhe dissera sobre os sonhos? Que fosse sonhar longe! Mas o filho reagiu: longe, porquê? Perto, o sonho aleijaria alguém? O pai teria, sim, receio de sonho. E riu-se, acarinhando o braço da mãe.
O médico estranhou o miúdo. Custava a crer, visto a idade. Mas o moço, voz tímida, foi-se anunciando. Que ele, modéstia apartada, inventara sonhos desses que já nem há, só no antigamente, coisa de bradar à terra. Exemplificaria, para melhor crença. Mas nem chegou a começar. O doutor o interrompeu:
— Não tenho tempo, moço, isto aqui não é nenhuma clinica psiquiátrica.
A mãe, em desespero, pediu clemência. O doutor que desse ao menos uma vista de olhos pelo caderninho dos versos. A ver se ali catava o motivo de tão grave distúrbio. Contrafeito, o médico aceitou e guardou o manuscrito na gaveta. A mãe que viesse na próxima semana. E trouxesse o paciente.
Na semana seguinte, foram os últimos a ser atendi dos. O médico, sisudo, taciturneou: o miúdo não teria, por acaso, mais versos? O menino não entendeu.

— Não continuas a escrever?
— Isto que faço não é escrever, doutor. Estou, sim, a viver. Tenho este pedaço de vida — disse, apontando um novo caderninho — quase a meio.
O médico chamou a mãe, à parte. Que aquilo era mais grave do que se poderia pensar. O menino carecia de internamento urgente.
— Não temos dinheiro — fungou a mãe entre soluços.
— Não importa — respondeu o doutor.
Que ele mesmo assumiria as despesas. E que seria ali mesmo, na sua clínica, que o menino seria sujeito a devido tratamento. E assim se procedeu.
Hoje quem visita o consultório raramente encontra o médico. Manhãs e tardes ele se senta num recanto do quarto onde está internado o menino. Quem passa pode escutar a voz pausada do filho do mecânico que vai lendo, verso a verso, o seu próprio coração. E o médico, abreviando silêncios:
— Não pare, meu filho. Continue lendo…


Mia Couto, O fio das missangas




11 janeiro, 2024

Al Berto - Dia de aniversário

 A partir de dois versos de Al Berto escrever uma carta :

ah meu amigo
demoraste tanto a voltar dessa viagem 

in Uma existência de papel - Poema 5 "Eremitério" 

Premissas:

- escrever à mão com letra bem desenhada, numa folha de papel personalizada;

-  iniciar a carta com os dois versos indicados;

- usar, no corpo da carta, as seguintes palavras: luz, papel, tinta, terra, mar, coração

Eis a minha carta: 


Sines, 11 Janeiro 2024

Ah meu amigo
demoraste tanto a voltar dessa viagem...

Como te esperei ansiosa e desesperadamente !
A saudade atormentava-me o coração e ofuscava a luz radiante do sol que aquecia a terra e se espelhava no mar, único confidente do meu desassossego.

Agora que te tenho finalmente comigo, afasto a melancolia e recupero o ensejo de preencher a folha de papel que há muito esperava a tinta que lhe daria algum sentido.

Promete que não voltas a partir...
Preciso de ti. Aqui. Sempre.
Só contigo saberei justificar a minha existência de papel.

Teu amigo, 

GR




10 janeiro, 2024

Comboio de palavras - escrita criativa

 


                                          Gerado com IA ∙ 10 de janeiro de 2024 às 7:22 da tarde


Hoje, escrevi intensamente! 
Encontrei-me estranhamente envolvida, agitada, alegre em mitigar, raivosamente, esta ansiedade e este ensejo obstinado ou urgente em me entregar! 


Texto criado em formação com DC em 11|10|2022




haiku - Escrita criativa

 





Haiku (haicai):
nome masculino

1. [Literatura] Forma poética muito breve, de origem japonesa, composta geralmente por três versos de cinco, sete e cinco sílabas.

"haicai", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2024, https://dicionario.priberam.org/haicai.





08 janeiro, 2024

Globos de Ouro - Vencedores nas categorias de cinema

 



Melhor Filme – Drama

“Oppenheimer”


Melhor Filme – Comédia ou Musical

“Pobres Criaturas"


Melhor Realização

Christopher Nolan, “Oppenheimer”


Melhor Ator – Drama

Cillian Murphy, “Oppenheimer”


Melhor Atriz – Drama

Lily Gladstone, “Assassinos da Lua das Flores”


Melhor Ator – Comédia ou Musical

Paul Giamatti, “Os Excluídos” (vencedor)


Melhor Atriz – Comédia ou Musical

Emma Stone, “Pobres Criaturas” (vencedor)


Melhor Ator Secundário

Robert Downey Jr., “Oppenheimer


Melhor Atriz Secundária

Da’Vine Joy Randolph, “Os Excluídos”


Melhor Argumento

“Anatomia de uma Queda”


Melhor Filme Estrangeiro

“Anatomia de uma Queda” (França)


Melhor Filme de Animação

“O Rapaz e a Garça”


Melhor Banda Sonora Original

Ludwig Görranson, “Oppenheimer”


Melhor Canção Original

“What was I Made For?”, de “Barbie” (Billie Eilish O’Connell, Finneas O’Connell)


Melhor Filme por Mérito Cinematográfico e Comercial

“Barbie”




07 janeiro, 2024

𝑨 𝑪𝒂𝒔𝒂 𝒅𝒂𝒔 𝑩𝒆𝒍𝒂𝒔 𝑨𝒅𝒐𝒓𝒎𝒆𝒄𝒊𝒅𝒂𝒔, de Yasunari Kawabata

 


Autor: Yasunari Kawabata
Título: A Casa das Belas Adormecidas
Tradutor: Luís Pignatelli
N.º de páginas: 158
Editora: D. Quixote
Edição (4.ª): Julho 2021
Classificação: Romance
N.º de Registo: (3320)


OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


A Casa das Belas Adormecidas é um romance fortemente perturbador centrado num universo fechado, sinistro e misterioso, envolto em segredos, frequentada por “cavalheiros de idade”, isto é, “clientes no inativo”, também referidos como “velhos inativos”.

A narrativa na terceira pessoa descreve as noites que o velho Eguchi, de 67 anos, passa na casa. Sem qualquer julgamento, a história oscila entre a descrição pormenorizada das jovens adormecidas, à reflexão inerente ao desejo e aos sentimentos do velho Eguchi e às recordações das relações com outras mulheres da sua vida.

“E evite, peço-lhe, as brincadeiras de mau gosto, por favor. Não tente meter os dedos na boca da pequena que dorme! Não é de bom tom!”, recomendou a hospedeira ao velho Eguchi.” (p. 13). Com esta advertência inicial, fica claro que os frequentadores, velhos, como já citei, estão impedidos de ter relações com as jovens, muito jovens e virgens, porque elas estão dopadas para não acordarem e eles estão sexualmente impotentes. Assim, entende-se que o objectivo da casa é revitalizar homens que, decadentes, precisam iludir a sua virilidade, “ruminar tristemente as saudades da sua juventude perdida” (p. 103)

Apesar da sensibilidade e da elegância presentes na escrita da narrativa, esta é perturbadora e simultaneamente fascinante porque, na minha opinião, no universo erótico descrito, a mulher é desumanamente “abusada”, coisificada, na medida em que está totalmente nua e profundamente adormecida, como se fosse uma boneca, permitindo ao homem que frua de uma noite ao seu lado, que lhe admire o corpo, que a acaricie, e sinta o seu odor corporal. É nisto que reside a perturbação. Na cumplicidade leitora de assistir à contemplação da jovem pelo olhar do “velho inativo” que Eguchi ainda não é, de acompanhar o fluir dos seus pensamentos que tece fantasias e recorda vivências eróticas anteriores.

Assim, erotismo, decadência, solidão, memórias, velhice e morte - materializada no assombro do último sono - entretecem-se habilmente e de forma perfeita. A apreensão destas questões associada à reflexão que delas inferimos ao longo da leitura é facilmente transposta pela descrição sublime das belas adormecidas intocáveis. E no final, o leitor “aterrado e entontecido” e com imensas dúvidas sobre esta forma de lidar com a sexualidade na terceira idade, acaba por se render à beleza da escrita. Uma escrita que segundo Yukio Mishima (introdução) é fragmentária e erótica já que nos oferece cada detalhe, cada sensação, cada fantasia “ É admirável a precisão, a extrema elegância no pormenor, com que Kawabata descreve a primeira das «belas adormecidas» com que o sexagenário Eguchi passa a noite – como se fossem as palavras a acariciá-la.” (p. 10)



03 janeiro, 2024

𝑩𝒂𝒍𝒂𝒅𝒂 𝒅𝒆 𝑨𝒎𝒐𝒓 𝒂𝒐 𝑽𝒆𝒏𝒕𝒐, de Paulina Chiziane

 


Autora: Paulina Chiziane
Título: Balada de Amor ao Vento
N.º de páginas: 172
Editora: Caminho
Edição (6.ª): Janeiro 2022
Classificação: Romance
N.º de Registo: (3374)



OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Balada de Amor ao Vento marcou a estreia de Paulina Chiziane na literatura moçambicana.
A obra centra-se no papel da mulher numa sociedade patriarcal onde predomina a prática da poligamia.
Numa prosa fluida, poética e irónica, Paulina Chiziane mostra-nos um mosaico de etnias e de culturas que permite ao homem, num casamento poligâmico, ter várias esposas e que à mulher impõe o dever de serva obediente ao marido, à família e às tradições.

No romance, narrado na primeira pessoa, Sarau, a protagonista, dividida entre um amor impossível e os costumes do seu povo, vai viver situações complexas. Para sobreviver e resgatar alguma dignidade vai prescindir de algumas regalias e recorrer a práticas espirituais e de feitiçaria.

Paulina Chiziane suaviza a dura realidade recorrendo a recursos expressivos como a metáfora, a personificação e a ironia. Ao longo da narrativa, a descrição das vivências, das emoções e das sensações das personagens mescla-se com a descrição da natureza. A natureza assume características humanas e vice-versa. Esta forma de escrever torna a leitura extremamente prazerosa.

"Emudecemos de repente. As mãos encontraram-se. Veio o abraço tímido. Trocamos odores, trocamos calores. Dentro de nós floresceram os prados. Os pássaros cantaram para nós, os caniços dançaram para nós, o céu e a terra uniram-se ao nosso abraço e empreendemos a primeira viagem celestial nas asas das borboletas." (p. 18)

Recomendo vivamente a leitura deste romance, bem como Niketche, uma história de poligamia. Neste último, o sentido de humor da autora é fabuloso e a escrita continua elegante e inspiradora.



02 janeiro, 2024

Eis-me, de Sophia de Mello Breyner Andresen

 

                                                 Glauco Cambon |  Moon Symphony | 1927



EIS-ME


Eis-me
Tendo-me despido de todos os meus mantos
Tendo-me separado de adivinhos mágicos e deuses
Para ficar sozinha ante o silêncio
Ante o silêncio e o esplendor da tua face

Mas tu és de todos os ausentes o ausente
Nem o teu ombro me apoia nem a tua mão me toca
O meu coração desce as escadas do tempo em que não moras
E o teu encontro
São planícies e planícies de silêncio

Escura é a noite
Escura e transparente
Mas o teu rosto está para além do tempo opaco
E eu não habito os jardins do teu silêncio
Porque tu és de todos os ausentes o ausente


OBRA POÉTICA, Sophia de Mello Breyner Andresen




01 janeiro, 2024

Recomeçar porque hoje é já outro dia e outro ano !!!

 

                                                                     Freepik 



Eu amo tudo o que foi
Tudo o que já não é
A dor que já me não dói
A antiga e errônea fé
O ontem que a dor deixou,
O que deixou alegria
Só porque foi, e voou

E hoje é já outro dia.



Fernando Pessoa