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09 maio, 2025

A Agulha bailarina e o Piano encantador

 

 Foto criada por IA - Copilot | 9.05.2025

                                                 

     Na sala de estar de uma casa acolhedora, iluminada pelo suave brilho do amanhecer, onde o aroma de chá perfuma o ar e as paredes guardam memórias de gerações, vive um piano imponente de madeira polida, com teclas de marfim brilhantes que já sentiram o toque de várias gerações. Ele é o coração do espaço, reverenciado pela sua capacidade de evocar emoções profundas.
     Ao lado, numa pequena cesta de costura repousa um bastidor com um bordado e uma agulha pequena, silenciosa e presa no tecido.
Nessa casa, as mãos que enfiam, movem e orientam a agulha são as mesmas que acariciam e dedilham as teclas de marfim. Mãos finas, alegres e cheirosas. As mãos de Maria Eduarda, a senhora da casa.
     A agulha e o piano gostam delas, sentem-se embevecidos perante tanta agilidade e segurança.
     Porém, certo dia, ambos pressentem um nervosismo e uma desmesurada insegurança: a agulha ora fica suspensa e pensativa, ora desliza e cai; o piano, maltratado, solta sons irregulares, desafinados. Esta desorientação prolonga-se no tempo, até que, uma manhã, a sala permanece sombria e    silenciosa.

    A agulha que sempre aspirou a ser bailarina ao som do piano que tanto admira e, secretamente, inveja, suspira de inacção e tédio. O piano, por sua vez, sente-se inútil e solitário. As suas teclas há muito que não ressoam melodias, que não são acariciadas, que não ouvem aplausos.

     Cansada de esperar, a agulha começa a treinar alguns passos de dança, em bicos de pé e devagarinho salta para a direita, salta para a esquerda, experimenta o plié, o tendu, o rond de jambe… Suspira e recomeça…
    Mas, certo dia, enquanto ensaia os seus passos sobre o pano de bordado esticado, ouve um gemido, um som mágico vindo do piano, ali mesmo ao seu lado. É uma melodia triste e encantadora. A agulha bailarina não resiste — salta para o chão de madeira e desliza até ele, atraída pela música como se fosse um apelo do destino.
    - Olá, senhor Piano, diz a agulha, numa voz fina, mas firme.
O piano surpreendido, suspende os seus sons, e responde gentilmente.
     - Olá, senhora Agulha. O que a traz até mim?
   - Ouvi a sua música e não resisti. Sabe, estou angustiada porque não tenho ninguém com quem conversar, nem nada para fazer. Farta de ficar presa, até já comecei a treinar uns passinhos de dança para ocupar o tempo e sacudir o corpo. Se não for assim, enlouqueço e …
   - Pois é… sinto o mesmo, atalhou o piano. Confesso que ouvi uma certa agitação e foi por esse motivo que comecei a mover as teclas.
  - Importa-se que suba até aí para conversarmos melhor? Pergunta a agulha.
  - Suba, suba. Terei todo o prazer em conhecê-la. Retorque o piano, esboçando um sorriso.
     A Agulha esguia e graciosa, não se faz rogada, sobe por aí acima e, sem resistir, começa imediatamente a esboçar uns passinhos hesitantes…
Nesse instante, Piano, o velho cavalheiro, sente algo que jamais havia sentido. A pequena Agulha, com a sua elegância delicada de movimentos leves, desliza sobre as suas teclas como uma estrela num céu escuro, transformando cada nota num afago melodioso, numa poesia viva.

    Nesse dia, entre uma Agulha e um Piano nasceu uma amizade improvável, assente na cumplicidade e no desejo de manter vivo o que, inexplicavelmente, se tornou sombrio.
  Dia após dia, semana após semana, a Agulha bailarina e o Piano encantador tornam-se inseparáveis. Ela dança, ele toca. Ele tange, ela baila. Ele afina-se, ela eleva-se. Juntos compõem harmonias que ecoam pela sala desabitada.

   E assim, juntos, emergem por entre as cortinas da solidão e do abandono, da dor e do luto. Juntos criam a mais bela dança, uma sinfonia de amor entre a música e o movimento. Um amor selado na melodia do tempo.




A agulha bailarina
improvisa e treina
voltas e reviravoltas

intensamente

O piano encantador
desafina a dor
nas teclas brancas e pretas

perdidamente

A agulha e o piano
juntos
tocam e volteiam
melodias breves e soltas

apaixonadamente


GR

23 março, 2025

O Meu Rumo!

 



A casa da Rosa dos Ventos mapeia oito pontas e nela nunca perdemos o rumo.
Seja qual for o trilho escolhido será sempre com sentido e tino.

_____________


A casa da Rosa dos ventos é o abraço da orientação, o guia das almas sonhadoras.
Com os seus oito braços estendidos, norteia destinos e sussurra segredos do vento, do sol e dos deuses.
Em perfeita harmonia sobre o azul intenso do mar, ela é a bússola do coração humano.
O meu rumo! 


Nota: escrita criativa a partir do livro as casas das coisas, de João Pedro Mésseder (texto) e Rachel Caiano (ilustração)

15 março, 2025

A menina pequenina

 

 




Exercício de Escrita Criativa proposto por Carolina palminha no âmbito do grupo de leitoras da biblioteca municipal de Sines - Uma Casa sem Livros.

Premissas: 
 A partir de um início de texto (em itálico) desenvolver uma história criativa; ter em conta que uma página, ou página e meia seria suficiente. 


Sentei-me.
O comboio pôs-se em movimento.
Pelas janelas a paisagem deslizava em tonalidades de verdes, dourados, amarelos das azedas, vermelhos de papoilas e de quando em quando, o casario de um pequeno povoado mostrava-nos, pelo fumegar que saía das chaminés, que ali havia gente, havia vida, gargalhadas ou tristezas, calor ou frio…
No interior da carruagem o alegre riso de crianças e o tagarelar dos adultos.
Alguns farnéis foram retirados das cestas e um cheiro de fritos e frutos inundou-nos.
Tentei abstrair-me, abri o livro e recomecei a leitura.
Daí a instantes,
                  uma das crianças aproximou-se de mim, lentamente, com receio de me incomodar e estendeu a sua mãozinha com uma maçã bem vermelha e apetitosa.
- Toma - disse ela - também tens fome? Mal tive tempo de agradecer, saltou para o meu lado e metralhou-me com perguntas sobre o livro que estava a ler, de que falava, se tinha desenhos e, de seguida, com um sorriso maroto, pediu-me para lhe ler a história.
Quando, finalmente, me foi concedido um tempinho para falar, perguntei-lhe como se chamava e quantos aninhos tinha.
- Sou a Beatriz, mas todos me chamam Bia e tenho quatro anos, respondeu a despachar-me com os olhos bem abertos. E a história? Insistiu ela.
Expliquei-lhe que o livro que estava a ler não era para a idade dela e que não iria compreender a história, já que tratava de guerra. Li-lhe o título do livro – O Sangue dos Outros, indiquei-lhe o nome da autora (Simone de Beauvoir) e fiz-lhe um pequeno resumo para que ela percebesse que não era má vontade minha. Ela baixou tristemente a cabeça e pediu que lhe lesse então só um bocadinho que não falasse de guerra. É que eu gosto muito de histórias e não tenho livros em casa…
Pedi-lhe, então, que fechasse os olhos e que só os abrisse quando eu lhe dissesse.
Abri a mochila que levava comigo e retirei um livro. Como ia visitar a família e os sobrinhos, tinha uma vasta gama para lhes oferecer. Sabem, é que faço parte do clube das tias que só oferecem livros. Que falta de criatividade! Oferecer sempre o mesmo! Dir-me-ão.
Como dizia, retirei da mochila um livro. Um livro maravilhoso que sabia de antemão que iria agradar a esta menina ternurenta e carinhosa. E comecei a ler:
        Era uma vez uma menina muito, muito pequenina…
Assim, que ouviu a primeira frase, os seus olhos cresceram e o sorriso iluminou-se. Aquietou-se bem ao meu lado para acompanhar as páginas e observar as ilustrações.
No final da história com os olhinhos marejados de lágrimas, lançou os seus bracinhos ao meu pescoço e disse que tinha gostado muito da história da menina que não sabia chorar.
- Olha, não me disseste como se chama o livro, nem quem o escreveu – comentou ela, feliz a desenhar com os dedinhos o contorno dos desenhos.
- Tens razão, respondi. Chama-se “Os olhos GRANDES da menina pequenina”, foi escrito por Ondjaki, um escritor angolano, inventor de histórias bonitas, e foi ilustrado por Carla Dias.
Estávamos felizes, ela com o livro nas mãos, ainda a saborear a história, e eu por ter contentado uma criança com uma simples leitura.
De repente, o encanto termina. Somos sacudidas com o berro “Bia, anda já pr’aqui” de uma mãe insensível.
Bia olhou para mim, encolheu os ombros, e deixou-se ficar virando e revirando o livro. Disse-lhe que devia obedecer à mãe. Mas ela fingiu não me ouvir e acariciou a imagem da menina da capa do livro.
Do outro lado, a mãe insistia no pedido e nos berros. A Bia olhou-me, levantou-se, entregou-me o livro e fechou o sorriso.
Devolvi-lhe o olhar e o livro – Podes ficar com ele. É uma prenda minha. Em retorno, recebi o sorriso de uns olhos grandes.
Afinal, há no mundo muitas meninas pequeninas com olhos grandes. Ondjaki quando escreveu este livro, sabia que ia encontrar muitas. E eu, hoje, nesta viagem, encontrei a Bia. Uma menina pequenina, de olhos grandes que adora histórias.

GR



20 janeiro, 2025

Olhares sobre Al Berto | desafio de escrita

 Premissas: 



11.01.2024                                                                                      Sines 


O mar está cor de chumbo. Os barcos ondulam silenciosamente. Eu, sentada no muro da praia, afundo-me em pensamentos e, maquinalmente, acompanho o voo triste de uma gaivota. Também ela sofre com a ausência do sol reflectido no mar intenso.
Seguro o olhar vazio no ponto branco que se afasta. Retenho as lágrimas que contrariam o desconcerto do riso que, subitamente, me assola.
Permaneço (in)quieta perante a (in)certeza do (a)mar. 

GR






26 novembro, 2024

Escrevo para...

 



Tal como Al Berto, eu também não escrevo para seduzir...

Escrevo para me aquietar do desassossego que, de quando em vez, me invade, tal uma planta sugadora e me mergulha numa solidão devastadora.

Mas como a larva que se transforma em borboleta, procuro o mar para nele recuperar o fôlego necessário à transformação. 

É na longa contemplação do azul intenso que resgato dúvidas, fortaleço certezas e adquiro a plenitude que me permite, no silêncio de uma folha branca, escrever as palavras certas que resvalam na noite insone.

GR

13 outubro, 2024

Desafio de escrita criativa lançado por João Pinto Coelho

 


Querem um desafio a sério? Então leiam até ao fim:

Há uns dias, vi esta mulher numa praia às moscas. Chegou cedo ao areal, não se despiu, sentou-se, olhou para o mar e começou a escrever.
Para um romancista, o voyeurismo é tão irresistível como as leituras vorazes, por isso, expondo-me aos vosso insulto, fotografei-a às escondidas.
Usei zoom para os pormenores, preservo-lhe o anonimato.
Vejam a sequência das imagens, uma sequência que se repetiu pela manhã fora:
1 - escreve,
2 - olha demoradamente sei lá para onde,
3 - volta a escrever, olha em frente. (o que a detém? Será sintaxe? Será paixão?)
... e por aí adiante.

Quem é ela?
Para quem escreve?
O que escreve?
Uma carta de amor? de despedida? Com o que sei desta mulher, pode não passar de uma lista do supermercado.
Mas não vos apetece propor outra coisa? Não vos apetece escrever um conto?
Se não vos parecer irresistível, por favor, nem tentem. Será sempre coisa pequena, 1500 palavras, no máximo.
Não sei se precisam de detalhes para a vossa história, mas ela escreve a lápis numa folha azul. E pousa-a num romance…  ou será num livro de poemas?
E se for num livro de poemas, será provável que um deles, se calhar o de abertura, lhe seja dirigido?
Já adivinharam até onde podem ir com quatro fotografias?

Escrevam, partilhem com quem goste de escrever, mandem-me o que fizeram e, se quiserem, publico-o na minha página.

_____________



O resultado:


O mar. Sempre o mar

Era cedo. O sol ainda se escondia para além das nuvens. O mar, no seu vai e vem, cortava o silêncio de uma praia ainda vazia, ou quase.

A mulher chegou num passo decidido, estendeu a toalha, descalçou as sandálias e sentou-se. Repentinamente, tirou do saco um livro e abriu-o para retirar as folhas azuis que lá se encontravam. Com um lápis escreveu, riscou o que escrevera, olhou para o horizonte como se ensaiasse as palavras que ia escrever, respirou profundamente, debruçou-se sobre as folhas e escreveu. Escreveu durante uns longos minutos. Riscou, mirou de novo o mar, e voltou a escrever. Pressentia-se a urgência da escrita.

Maria já antes tinha tentado resgatar no papel as emoções de um longo fim-de-semana passado a dois. O sorriso de M. veio quebrar a monotonia de uma vida arrumada, há muito sem surpresas. Foram três dias de companheirismo, de risadas, de sol, de mar, de desejos saciados. Três dias que passaram num ápice e, provavelmente, sem repetição. M. habitava noutro lugar.

Sentia necessidade de transpor para o papel tudo o que viveu. Pareceu-lhe a única maneira fiável de manter viva essa memória e, quem sabe, um dia, talvez ousasse enviar uma cópia a M.

Em casa, no pouco tempo livre que dispunha, tentou fazê-lo mas faltava-lhe a concentração, achava ela. Desculpou-se com o barulho do autoclismo do vizinho ao lado, com a música do adolescente do piso inferior, com a agitação da rua, com o cansaço do dia de trabalho. O papel permanecia virgem, não era capaz de expressar o que sentira, o que vivera.

Certo dia, levantou-se cedo, não tinha obrigações definidas. Procurou o livro que andava a ler, Mãe, Doce Mar. Há vários dias que não lhe pegava. A cabeça andava desarrumada, as palavras que aí se emaranhavam eram outras. Olhou de novo para a capa do livro e esboçou um sorriso. Pegou nele, colocou no interior as folhas azuis e saiu apressada e convictamente. Como não pensara nisso antes.

Sentada na praia ainda pouco movimentada, as frases que em casa lhe faltaram, surgiram, primeiro, impetuosas e atabalhoadas. Depois, as palavras alinharam-se com as emoções e foi construindo uma história, a sua, que espelhava os momentos vividos e partilhados naquele engate de verão.

Quando pensou ter concluído, satisfeita e orgulhosa, olhou em redor, calmamente e avistou um casal deitado lado a lado. Pensou em M. e gostaria que fossem eles, ali, a saborear o sol ainda fraco àquela hora da manhã. Retirou o olhar e o pensamento e viu, mais atrás, um homem sentado numa toalha com uma máquina fotográfica na mão. Se tivesse olhado mais atentamente, talvez, reconhecesse o autor do livro que tinha no colo e que lhe insinuou o caminho. Um homem hábil nas palavras e caçador de instantes, que lhe captou alguns gestos que mais, tarde, serviriam para uma proposta de desafio de escrita ou, quem sabe, para um novo romance.

Desviou o olhar para o areal e para as ondas que aí se desfaziam suavemente. Respirou a tranquilidade do mar e regressou ao seu texto. Escreveu mais umas linhas, melhorou algumas frases, substituiu algumas palavras. Sorriu aliviada. Perdeu-se nas memórias ainda vivas e alimentou-as com novos ingredientes. Os sonhos eram seus. Ninguém lhos poderia roubar nem mesmo condenar. A sua vida, a partir de agora, alimentar-se-ia de uma nova vitamina. O amor.

Levantou-se e passeou no areal, mesmo junto ao mar, como se acariciasse a espuma das ondas desfeitas, num agradecimento. Demorou-se na sua quietude.

Quando regressou à toalha, pegou no saco, calçou as sandálias e retornou a casa. Tomou um banho, escolheu um vestido alegre e saiu.
Na rua, o sol, agora brilhante, acariciou-lhe o rosto.


30 de Agosto de 2024
GR

30 julho, 2024

Haiku | escrita criativa

 





𝘌𝘮 𝘵𝘦𝘳𝘳𝘢 𝘥𝘦 𝘮𝘢𝘳
𝘗𝘢𝘳𝘵𝘪𝘭𝘩𝘢 𝘭𝘪𝘷𝘳𝘰𝘴, 𝘴𝘰𝘳𝘳𝘪𝘴𝘰𝘴
𝘕𝘰 𝘢𝘻𝘶𝘭 𝘪𝘯𝘵𝘦𝘯𝘴𝘰




25 julho, 2024

𝓪𝓼 𝓬𝓪𝓼𝓪𝓼 das Bibliotecárias

 

       
 


Ontem, dia 24 de julho,
   𝘌𝘮 𝘵𝘦𝘳𝘳𝘢 𝘥𝘦 𝘮𝘢𝘳
  𝘗𝘢𝘳𝘵𝘪𝘭𝘩𝘢 𝘭𝘪𝘷𝘳𝘰𝘴, 𝘴𝘰𝘳𝘳𝘪𝘴𝘰𝘴
  𝘕𝘰 𝘢𝘻𝘶𝘭 𝘪𝘯𝘵𝘦𝘯𝘴𝘰
coube-me a mim receber a equipa interconcelhia das bibliotecas escolares do Alentejo Litoral que acolheu duas novas colegas. Como era o último encontro deste ano letivo preparei um desafio disfarçado de miminho. Inspirei-me em dois livros maravilhosos - 𝓐𝓼 𝓖𝓪𝓵𝓸𝓬𝓱𝓪𝓼 𝓥𝓮𝓻𝓶𝓮𝓵𝓱𝓪𝓼, de Pedro Seromenho e 𝓪𝓼 𝓬𝓪𝓼𝓪𝓼 𝓭𝓪𝓼 𝓬𝓸𝓲𝓼𝓪𝓼, de João Pedro Mésseder, ambos ilustrados magistralmente por Rachel Caiano.

O encontro iniciou com a visita à exposição Thalassa! Thalassa! O Mar e o Mediterrâneo na obra de Sophia patente no piso -1 no Centro de Artes de Sines.
Depois, subimos ao piso 2 e descobrimos 𝓪 𝓬𝓪𝓼𝓪 da hora do conto, espaço lindo e convidativo, onde a nossa (sim, a nossa... vá! de todos) Cristina Fernandes encanta, com as suas leituras, as crianças de Sines. (Bem hajam Cristina e Liliana Rodrigues

Aí, e antes da ordem de trabalhos, convidei as colegas a descobrir 𝓪 𝓬𝓪𝓼𝓪 de papel que lhes ofereci. Um origami poético com desenhos e palavras que continha o tal desafio disfarçado de miminho, ou seja, uma tarefa de escrita criativa (sou mesmo chata, não sou! onde já se viu atribuir uma tarefa de férias!) Prometo divulgar em setembro/outubro o resultado.
De seguida, inspirada pelo espaço encantador e também imbuída no espírito das músicas do mundo, a nossa colega Fátima Nunes partilhou a leitura do último capítulo do livro Í𝒏𝒅𝒊𝒂, 𝒂 𝑷𝒓𝒊𝒏𝒄𝒆𝒔𝒂 𝒅𝒐 𝑴𝒂𝒓.

Depois destes momentos criativos, e enquanto degustávamos umas deliciosas cerejas e uvas, a nossa coordenadora Lucinda Simoes divulgou algumas informações pertinentes e as prioridades para as bibliotecas escolares para o ano letivo 2024/2025. Não as vou divulgar aqui, mas deslumbramos já muito Engenho e Arte.

No final, por entre trocas de souvenirs, de discursos, de abraços, de sorrisos, de uma ou outra lagrimazita, despedimo-nos da colega Rosa S B Martins que finda as suas funções como bibliotecária escolar.

Pelas12h15 mudámos de 𝓬𝓪𝓼𝓪 e dirigimo-nos para outra, A Palmeira (nome sugestivo que nos faz sonhar com as férias já bem merecidas). Foi um bom repasto! Tempo para degustar, conversar, lembrar histórias divertidas de roupa esquecida, de personagens desencontradas ... e sorrir e gargalhar.

A tarde terminou para algumas em reuniões (trabalho oblige) e para outras em passeio pelas ruas movimentadas e festivas em modo FMM.
Despeço-me até setembro! Desejo-vos boas leituras e umas boas férias se possível com galochas vermelhas.
 
Nota: a tarefa de férias consiste em escolher 𝓐 𝓬𝓪𝓼𝓪 ... e dar uma definição poética. Eu escolhi as galochas, como é óbvio.

𝓐 𝓬𝓪𝓼𝓪 𝓭𝓪𝓼 𝓰𝓪𝓵𝓸𝓬𝓱𝓪𝓼
𝘈𝘣𝘳𝘪𝘨𝘢 𝘰𝘴 𝘱é𝘴 𝘥𝘢 𝘤𝘩𝘶𝘷𝘢 𝘦 𝘢𝘥𝘰𝘳𝘢 𝘴𝘢𝘭𝘵𝘪𝘵𝘢𝘳 𝘯𝘢𝘴 𝘱𝘰ç𝘢𝘴 𝘥𝘦 á𝘨𝘶𝘢.
𝘘𝘶𝘢𝘯𝘥𝘰 𝘷𝘦𝘳𝘮𝘦𝘭𝘩𝘢𝘴, 𝘴ã𝘰 𝘤𝘰𝘳 𝘥𝘰 𝘢𝘮𝘰𝘳.

GR

21 abril, 2024

Vou com o tempo

           Claude Monet | Impression, Soleil levant (Impressão, nascer do sol) | 1872


Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades
No dia-a-dia presente
As palavras fluem no caderno branco
Os sorrisos vivem esbranquiçados 
As flores perfumam os caminhos
Pequenos gestos serenam meu peito
A magia da confiança germina lentamente.

Mudam-se os tempos, mudam-se as afinidades
Na distância instalada
A tinta escasseia na página branca
Os dias acompanham os contornos da lua 
Os silêncios atormentam  o cansaço
O mar salpica memórias 
A saudade esbate-se implacavelmente. 

Nos tempos mudados
Permanece a ausência
Os dias longos, tristes
de escuridão
Procuro pequenos gestos 
de cumplicidade
Moro na página branca
da incompreensão

A melancolia habita-me.

GR


10 março, 2024

Apresentação do livro Súbito, de Ana Zorrinho

                                                                            Foto de Paulo Pereira

Cumprimento todos os presentes.

Quero agradecer o convite formulado pela Ana Zorrinho para estar ao seu lado nesta iniciativa de partilhar palavras poéticas.

Quero congratular a Liliana Rodrigues e os elementos da sua equipa por nos proporcionarem este momento e este espaço maravilhoso. É tão bom falar de poesia num ambiente de fotografias de mulheres com livros.

É um prazer enorme assinalar o Dia Internacional da Mulher partilhando convosco as palavras escritas e ditas pela Ana Zorrinho. Ela sabe que é verdade.


Este dia, 8 de março  de 2024, é duplamente importante porque celebramos os 50 anos do dia “em que emergimos da noite e do silêncio” como o imortalizou Sophia de Mello Breyner no seu poema 25 de Abril 

      Esta é a madrugada que eu esperava
     O dia inicial inteiro e limpo
     Onde emergimos da noite e do silêncio
     E livres habitamos a substância do tempo


e porque estamos a dois dias de exercer um acto cívico e democrático (direito conquistado pelas mulheres).

 Acabámos de ouvir publicamente uma jovem, a Catarina, a tocar violino e uma mulher a ler a poesia que escreveu. 
Em 1943, no boletim mensal da Mocidade Portuguesa Feminina, publicava-se o seguinte texto (apud A Boneca Despida, Paulo M. Morais)

"Queridas raparigas! Sede boas, sensatas, alegres, dedicadas, esquecidas de vós mesmas e sereis mulheres superiores, sem pretender rivalizar em tolas superioridades com os homens, o que nada vos engrandece, antes diminui! Cada um deve ocupar o seu lugar - aquele que a Providência lhe marcou. E o vosso, como rainhas do lar, é o mais belo."

Este estatuto de "fada do lar" prolongou-se até 1974. A Ana Zorrinho nasceu em 1978. Já a madrugada era inteira e limpa. Este facto permitiu-lhe crescer em liberdade, frequentar a escola, ler, escrever, pensar, sorrir, sonhar e entender o mundo “como poder ser o lar que a palavra espera” como o escreveu e acabou de ler no prefácio de Súbito.

No seu primeiro livro Histórias de um tempo só, a Ana, sem o ter vivido, oferece-nos histórias desse tempo, sombrio, histórias de vida tecida, de momentos, de memórias. Micro histórias de gente trabalhadora, sofrida, enrugada, cansada, resignada. Dez textos de um tempo “frio, cortante”, ventoso, escuro, silencioso, sem palavras. Um tempo indiferente à dor, à violência, à solidão, à velhice, à morte…

(Leitura do texto "Maria". p. 13, por Sónia)

Quando em Julho na Festa do livro me vi com Súbito na mão, observei-o atentamente, (gostei da apresentação) folheei-o, li na diagonal alguns poemas, tentei perceber a razão do título e na contracapa procurei alguma informação extra, uma sinopse. Deparei-me com algo pouco comum: o significado da palavra Súbito. Fiquei a matutar…. E pensei: É natural, a Ana é assim mesmo, gosta de surpreender o leitor. Gosta de o conduzir na descoberta de sentidos, de emoções, convoca-o a participar ativamente, não lhe facilita a vida porque nem tudo é dito. O mais importante fica mesmo nas entrelinhas.

Era necessário, obviamente, ler os poemas.

Voltei ao início e li o primeiro poema “palavras” (p. 9). Este sugere, desde logo, uma leitura expressiva, sentida, impetuosa (súbita), silenciosa, … fui até ao fim do livro e descobri “palavra nascente” que nos remete para a importância do nascer, como um recomeço.
 
Leitura do poema (p. 73- Ana)

Na leitura e releitura dos restantes poemas deixei-me conduzir pelas palavras, pela escrita visual, sensível e sensual.

(Leitura do poema “lugar” p.11, por José)

Descobri um ritmo variável, vagaroso, torrencial, deslizante, reflexivo, súbito…. Gosto desta volubilidade.

 (leitura do poema “último poema” p. 67, por Paulo)

Este “último poema” sugere o fim da vida, mas é apenas o fim que conduzirá forçosamente ao recomeço. Esta circularidade da vida expressa nas Palavras contidas nos títulos e nos poemas, como já referi, torna-se mais consistente se tivermos em conta a existência de um fio condutor que é o Tempo. O Tempo surge na espera, na solidão, na brevidade da vida, na morte, na ausência, na verdade, na suspensão (“Oh ampulheta/Inclina-te um pouco/Suspende o cair do grão” (p. 45), na saudade, no mergulho, na esperança, no silêncio, no prazer, na cadência, no vazio da escrita pasmado em "vértice" (p. 51)
          
                            No extremo do vértice
                            Vejo plenamente o vazio a 360 graus
                            Flicto-me para o salto
                            Sobre o limite
                            da linha
                            Mergulho no nada
                            Desta página em branco
                            Afogo-me 
                            Nas palavras inexistentes


O drama do escritor perante a página em branco e nas palavras inexistentes, transborda para mim, leitora, em magia, deslumbramento. Não me canso de o ler. De os ler, todos.
Para concluir posso afirmar que a subjetividade presente na escrita da Ana exige do leitor uma participação efetiva, oferecendo-lhe múltiplas leituras. Súbito cumpre, deste modo, o propósito da poesia.

8 de Março de 2024 | 21h30 | Centro de Exposições
Centro de Artes de Sines

Graciosa Reis





05 março, 2024

Encontro com o autor Ondajki - Texto de apresentação


Foto GR

Ndalu Almeida, conhecido por Ondjaki é um poeta e escritor do mundo. Nasceu e estudou em Angola (5 julho de 1977), licenciou-se em Lisboa (sociologia), fez o doutoramento em Itália e estudou ainda em Nova Iorque. O seu percurso artístico vai para além da escrita, passa pelo cinema (filmou um documentário), pelo teatro, pela pintura e em 2020 lançou-se num novo projecto ao criar a Livraria Kiela em Luanda.

As suas obras (contos, poesia, romances, novelas, teatro) estão traduzidas em várias línguas. E com elas já recebeu inúmeros prémios em Angola e no estrangeiro. Destaco o Prémio Saramago em 2013 com o romance Os Transparentes.

Quando em 2007, na Livraria A das Artes ouvi, pela primeira vez, Ondjaki falar, ou melhor, contar estórias, fiquei maravilhada e decidi nunca mais o perder de vista.

Ao ler os seus livros, acredito que Ondjaki teve uma infância de momentos de aqui, felizes, aconchegada de palavras ditas por um “tio Rui que era poeta”, por uma tia Alice que “tirava letras do bigode do tio” e sobretudo pela “avó dezanove” que tinha segredos, “gigantescas maravilhas” e que lhe contava, e se calhar ainda conta, estórias de “pirilampos cintilantes”, “pirilampos apagados”, “estrelas pirilampas”, de borboletas, de brincadeiras, de soviéticos, de transparentes…

Ondjaki, atento e sensível, cientistou a alegria, o brilho, os pirilampos, os cheiros, mas também a sua rua, o seu bairro, a sua cidade, o seu país, o seu/nosso mundo; aprendeu que olhar através de Uma escuridão bonita é sonhar, é sentir o coração, é espanadar tristezas, medos, dificuldades; entendeu que assobiar resgata a alma, desperta desejos e sentimentos e liberta o sonho (outra vez o sonho. Sempre o sonho.)

Ondjaki, na sua escrita, legou-nos o seu entendimento do mundo. Nela há prendisajens, há palavras poéticas que enlaçam, abraçam, esculpem e tornam-no xão. Como exemplo, nas estórias de Os da minha rua, fica claro pela voz de Ndalu, como as pequenas coisas são importantes para as crianças. Como os ensinamentos dos mais velhos são preciosos, sábios….

Para escrever os seus livros, Ondjaki resgata memórias, vivências, deslembramentos, sonhos e futuros. Em todos, cria universos mesclados de realidade, sentimento, imaginação, fantasia. Em todos, destaca e critica a sociedade angolana, abordando desigualdades sociais, violência (guerra), preconceitos, racismo. Em todos, manobra as palavras, como lhe escreveu Manoel de Barros, inventa palavras, brinca com os sons, os ritmos, os sentidos das palavras. Em todos imortaliza sonhos, emoções.

Por tudo isto, Ondjaki é um contador de estórias único e encantador. Gosto de o ouvir falar. Gosto de o ler. Gosto de o ler em voz alta para melhor captar a harmonia e a poesia das suas palavras.

Vou terminar, mas como Ndalu, também não gosto de despedidas. E agora, cito:  ”Nas despedidas acontece isso: a ternura toca a alegria, a alegria traz uma saudade quase triste, a saudade semeia lágrimas, e nós, as crianças, não sabemos arrumar essas coisas dentro do nosso coração.”

Será que nós, adultos, sabemos? Fica a pergunta. Eu, não vou responder, prefiro passar a palavra e escolher a ternura que toca a alegria de ter Ondjaki aqui, na nossa biblioteca para nos contar mais umas estórias e assim a nossa “escuridão ficar mais bonita”.

Biblioteca escolar ESPAB, 05 de Março de 2024
Graciosa Reis


11 janeiro, 2024

Al Berto - Dia de aniversário

 A partir de dois versos de Al Berto escrever uma carta :

ah meu amigo
demoraste tanto a voltar dessa viagem 

in Uma existência de papel - Poema 5 "Eremitério" 

Premissas:

- escrever à mão com letra bem desenhada, numa folha de papel personalizada;

-  iniciar a carta com os dois versos indicados;

- usar, no corpo da carta, as seguintes palavras: luz, papel, tinta, terra, mar, coração

Eis a minha carta: 


Sines, 11 Janeiro 2024

Ah meu amigo
demoraste tanto a voltar dessa viagem...

Como te esperei ansiosa e desesperadamente !
A saudade atormentava-me o coração e ofuscava a luz radiante do sol que aquecia a terra e se espelhava no mar, único confidente do meu desassossego.

Agora que te tenho finalmente comigo, afasto a melancolia e recupero o ensejo de preencher a folha de papel que há muito esperava a tinta que lhe daria algum sentido.

Promete que não voltas a partir...
Preciso de ti. Aqui. Sempre.
Só contigo saberei justificar a minha existência de papel.

Teu amigo, 

GR




10 janeiro, 2024

Comboio de palavras - escrita criativa

 


                                          Gerado com IA ∙ 10 de janeiro de 2024 às 7:22 da tarde


Hoje, escrevi intensamente! 
Encontrei-me estranhamente envolvida, agitada, alegre em mitigar, raivosamente, esta ansiedade e este ensejo obstinado ou urgente em me entregar! 


Texto criado em formação com DC em 11|10|2022




haiku - Escrita criativa

 





Haiku (haicai):
nome masculino

1. [Literatura] Forma poética muito breve, de origem japonesa, composta geralmente por três versos de cinco, sete e cinco sílabas.

"haicai", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2024, https://dicionario.priberam.org/haicai.





27 novembro, 2023

Passeio Literário a Óbidos



No âmbito da Formação Oficina de Leitura e Escrita (OLE), ministrada por Paula Cusati, no Centro de Artes em Sines, foi apresentada, na última sessão, a possibilidade de uma visita cultural a Óbidos!
Não hesitei nem um segundo. Pelo que no dia 25 de novembro,  partimos cedo em busca de informação e conhecimento Para Imaginar o Mundo! (PIM!). O nosso mundo!
Pelas 10h30, chegámos animados a Óbidos e dirigimo-nos para a Galeria Nova Ogiva (fundada em 1970, pelo escultor José Aurélio) aonde nos esperava a curadora da exposição PIM!

Mas agora que estou a relatar o dia, questiono-me se será correcto da minha parte, usar o “nós” e explanar no plural a experiência vivida ou se devo apenas cingir-me ao “eu”, isto é, ao meu sentir! Será que sentimos tudo da mesma maneira? Não, certamente!

Assim, cheguei animada e ansiosa por cumprir e aproveitar ao máximo o programa literário tão cuidadosamente elaborado pela nossa querida “professora”.

Nas ruas, apinhadas de turistas, que me conduziam à galeria fui captando imagens para memórias futuras de ruelas, escadas, vasos, portas, janelas, igrejas, … até que entrei numa mercearia/livraria! 
Que maravilha! Que mistura surpreendente e improvável! Confesso que me perdi a olhar … queria abarcar tudo e nada retive… Simplesmente, maravilhoso! 
Voltarei com tempo e calma, pensei de imediato, para descobrir os títulos das lombadas alinhadas nas prateleiras.

Continuei a percorrer a rua, desviando-me dos muitos “invasores” que por ali vagueavam em busca de souvenirs. De repente, avistei a galeria, quase vazia, porque não vende os souvenirs tão desejados! Mas oferece cultura! Palavras, desenhos, ilustrações, casas de pé, invertidas e tombadas, sonhos, caminhos para a imaginação! Era o PIM! Sim, PIM! Para imaginar o Mundo!

Para Imaginar o Mundo… como é possível?! Sim, é possível, neste espaço atraente, colorido, apelativo que convida o visitante, aquele que gosta de sentir de todas as maneiras, tudo é possível desde que corra o Risco de Ler Devagar!

Visito o lugar de pé alto e de vários pisos com a convicção de me deixar seduzir pelas ilustrações coloridas de Raúl Guridi e pelas palavras de Joana Bértholo que nos apresentam “as bestas que os livreiros têm de enfrentar diariamente”.
A visita, aparentemente divertida, revela-se numa descoberta desconcertante, já que convida a reflectir sobre a importância das livrarias independentes e da luta que travam para se defenderem das “bestas” que as atacam, para desviar o leitor dos perigos da “selva” e para alertar para as consequências cada vez que uma livraria fecha.
Após a visita, mas ainda no espaço, a curadora, Mafalda Milhões, numa conversa informal, amena e constructiva explicou a criação desta mostra que integra 75 livrarias imaginárias, desenhadas por ilustradores para homenagear José Pinho, o homem que transformou Óbidos num polo literário. Os ilustradores foram convidados a completar e a ilustrar a frase “Na minha livraria…”

A conversa foi interrompida pois aproximava-se a hora agendada para o almoço no the literary man óbidos hotel
De novo, pelo percurso, retenho imagens… mal eu sabia o que me esperava!!! (como gosto de ser surpreendida, não pesquisei nada do programa. Confiei na nossa “professora”).

O antigo convento, agora transformado em hotel, é um espaço moderno, mágico, repleto de história que nos convida a imaginar um mundo literário!
Fiquei deslumbrada! Que sala magnífica, acolhedora com sofás confortáveis à volta da lareira que convidam à leitura, com paredes revestidas de estantes de livros, com mesas decoradas com excertos de textos, poemas, capas de livros, fotos de escritores. A sala de refeições é uma autêntica biblioteca/livraria.
Book&Cook – o nome deste espaço – é o nome adequado, pois é disso que se trata. Livros e Iguarias! 
O cardápio servido esteve à altura das emoções sentidas, ou melhor, elevou a fasquia desta experiência literária. Ora vejam: bolinhas de alheira, lombinho de porco com mostarda à antiga, cheesecake de frutos vermelhos. Tudo regado com um surpreendente vinho tinto “Quinta de S. Francisco - Óbidos”, que apesar dos 13,5%, não produziu efeitos colaterais. A excelência.

Antes de abandonar o local, os passos e o olhar furtivos e curiosos levaram-me ao segundo piso para confirmar o que já suspeitava. Livros e mais livros nas paredes dos corredores, livros em estantes, secretárias, máquinas de escrever. Todo um universo propício à escrita e à leitura.
Sonhei em voltar. Pensei em Borges e como ele “imaginei o paraíso como um tipo de biblioteca (livraria)”.

O passeio literário não terminou aqui. Faltava-me descobrir O Bichinho de Conto, em Casais Brancos, às portas de Óbidos. O Bichinho de Conto é o tal espaço de Risco – uma livraria. Um “sítio aonde nos esperam”.
E que bem nos esperou e recebeu Mafalda Milhões (bem como a sua colaboradora), sim a mesma que nos falou de bestas e de bons livros e de livrarias e de ilustrações na Galeria Nova Ogiva.
Adorei descobrir que este espaço antes de ser uma livraria dinâmica e aberta a experiências que desenvolvem os sentidos, foi uma escola primária. É um sítio fabuloso. Será que este é o que a Ana Zorrinho nos incita a descobrir no seu livro?
Sim, Óbidos nas múltiplas e diversas formas de viver o livro, pode bem ser o meu !

Um grande bem-haja, à nossa “professora” Paula Cusati que nos abriu novos horizontes e mostrou sempre muita preocupação no bem-estar do seu “pequeno rebanho” de itinerantes literários.
Um bem-haja a todos os itinerantes literários que viveram e enriqueceram este passeio. 



(refrescar a página se o vídeo não aparecer devidamente)



Passeio Literário - Óbidos - Kizoa Movie Maker





29 outubro, 2023

Possibilidades - Exercício de escrita criativa

 

                                                         Criador de imagens do Bing


Baseado no poema "Possibilidades", integrado na obra  Paisagem com Areia, de Wislawa Szymborska (pp.250 e 260), criei e o meu "Possibilidades"


Prefiro café sem açúcar.
Prefiro o livro ao filme.
Prefiro o vermelho e o preto.
Prefiro ler nos tempos livres.
Prefiro sonhar acordada porque me invento.
Prefiro José Saramago a António Lobo Antunes, apenas uma questão de preferência, nada de embirração. 
Prefiro o silêncio que me constrói.
Prefiro a paz.
Prefiro ouvir.
Prefiro que não me digam "Não te ofereço mais livros porque já tens muitos.".
Prefiro livros bons.
Prefiro a amizade honesta, os amigos que nada prometem e que marcam presença sempre que a tristeza se impõe.
Prefiro o afastamento à incerteza da relação de amizade, de amor,...
Prefiro a humildade à vaidade de tantos "ilustres" - felizmente não são imortais.
Prefiro a tranquilidade à inquietação e ao desassossego.
Prefiro a verdade mesmo que sofrida.
Prefiro palavras livres e perfumadas.
Prefiro o ridículo de escrever ao ridículo de não escrever. Mesmo que seja só para mim. 
Prefiro cartas (de amor) ridículas.
Prefiro flâner junto ao mar porque me oferece uma visão sublime.
Prefiro deixar-me deslumbrar pelas palavras.
Prefiro a travessia segura do tempo.
Prefiro que o Natal seja quando o homem quiser. 
Prefiro bla bla bla. 



12 julho, 2023

Exercício de escrita criativa com David Machado

No workshop de escrita criativa que decorreu em Évora (6/7/2023), David Machado indicou as seguintes premissas para o exercício de construção de um texto/conto:

Início: "Às oito horas, quando o despertador tocou, Catarina estava acordada há várias horas. pela primeira vez, em muitos anos, tinha atravessado uma noite inteira sozinha na cama."

No texto incluir duas das quatro frases
- "O silêncio dos últimos meses parecia mais intenso que nunca."
- "No lava-loiça os pratos sujos tinham-se acumulado."
- "as fotografias dispostas na cómoda fizeram-na sorrir."
- "Experimentou três vestidos até encontrar aquele mais adequado à situação."

Final - escolher um dos dois facultados):
- "Quando por fim se sentou ao volante do carro, apercebeu-se de que estava a chorar."
- "Na rua o calor do sol encheu-lhe o rosto."




Texto 

Às oito horas, quando o despertador tocou, Catarina estava acordada há várias horas. Pela primeira vez, em muitos anos, tinha atravessado uma noite inteira sozinha na cama.
Insone, percorreu os tempos felizes que partilhou com o companheiro. Sorriu ao recordar os livros lidos e discutidos à volta de um gin, entre beijos e carícias; os filmes vividos; os passeios,... tudo lhe veio à mente!
Por que caímos  no abismo, se éramos felizes?
Por que não soubemos manter acesa a paixão que nos unia?
Por que não soube entender que o silêncio dos últimos meses parecia mais intenso que nunca? Questionava-se Catarina.
Como fui tonta, como me deixei enganar, como não vi o óbvio?!
E agora, que vou fazer da minha vida? Manter-me nesta inércia doentia ou agarrar-me à vida? 
Catarina levantou-se. Tinha de se apressar ou chegaria atrasada ao emprego e suportaria os olhares reprovadores e trocistas dos colegas.
Tomou um banho bem cheiroso e reconfortante, experimentou três vestidos até encontrar aquele mais adequado à situação, engoliu algo e bebericou um café.
Escolheu brilhar! Escolheu viver! 
Pegou na mala e nas chaves do carro. Saiu. 
Na rua, o calor do sol encheu-lhe o rosto. Sorriu.