29 outubro, 2022

𝑼𝒎𝒂 𝑷𝒂𝒊𝒙ã𝒐 𝑺𝒊𝒎𝒑𝒍𝒆𝒔, de Annie Ernaux

 



Autora: Annie Ernaux
Título: Uma Paixão Simples
Tradutora: Tereza Coelho
N.º de páginas: 70
Editora: Livros do Brasil
Edição: Outubro 2020
Classificação: Novela
N.º de Registo: ()


OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Em Uma Paixão Simples, Annie Ernaux, uma mulher “culta, independente e divorciada e já com filhos adultos” expõe a paixão intensa e obsessiva que viveu durante cerca de dois anos com um homem casado e bem mais novo. É a própria que refere que o seu livro é autobiográfico e que “não quero explicar a minha paixão – isso acabaria por considera-la erro ou desordem a justificar – quero, simplesmente, expô-la.” (p. 27)

Annie Ernaux mantém, neste livro, aquilo que tão bem a caracteriza, isto é, relatar a sua vida. Tudo é pessoal, vivido, sentido. Aceitamos que assim seja. Não se trata de exibicionismo, trata-se de frontalidade, de honestidade, de coragem porque despida de preconceitos e de julgamentos.

Numa escrita inteligente, acutilante e desabrida transporta-nos para os universos literário e fílmico, tipicamente francês, de Marguerite Duras, de Simone Beauvoir, Jean-Luc Godard, entre outros.
Uma Paixão Simples é a história de uma paixão pura, inquieta, obsessiva pelo desejo e pela espera; pela presença e pela ausência de quem se ama apaixonada e perdidamente; pelo erotismo e pela solidão que ficou…

“A partir do mês de Setembro do ano passado, não fiz mais nada a não ser esperar um homem: esperar que ele me telefonasse e que viesse a minha casa. (…) Era principalmente quando falava que eu tinha a impressão de viver por impulso. (…) As únicas ações em que eu empenhava a minha vontade, o meu desejo, e algo que deve ser a inteligência humana (prever, avaliar os prós e os contras, as consequências) tinham, todas, uma relação com esse homem. (…) Eu não tinha nenhum futuro a não ser o próximo telefonema a marcar um encontro”. (pp. 9 - 11)

É um livro brevíssimo, mas intenso. Um livro avassalador porque conta sem rodeios a paixão de uma mulher por um homem mais novo e casado; porque expõe a sua ansiedade, a sua sexualidade; porque expõe a sua existência tumultuosa; porque revela a razão de escrever apesar de “O tempo da escrita não tem nada a ver com o da paixão. No entanto quando comecei a escrever, era para continuar nesse tempo (…) não escrevi um livro sobre ele, nem sequer sobre mim. Transformei, simplesmente, em palavras – que ele não vai ler, sem dúvida, que não lhe são destinadas – aquilo que a sua existência, só por si, me trouxe. Uma espécie de dádiva invertida.” (pp 55-70)

Recomendo os livros de Annie Ernaux. Recomendo muito este livro pela forma como a autora explora as suas emoções e como nos transporta para o lugar das personagens desafiando-nos a viver a nossa experiência através da sua história, da sua paixão tão despudoradamente revelada.




25 outubro, 2022

Um poema

 

                                                                           Foto minha


Sísifo


Recomeça...
Se puderes
Sem angústia
E sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade.

E, nunca saciado,
Vai colhendo ilusões sucessivas no pomar.
Sempre a sonhar e vendo
O logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
Onde, com lucidez, te reconheças...

Miguel Torga

23 outubro, 2022

𝑶𝒔 𝒍𝒊𝒗𝒓𝒐𝒔 𝒒𝒖𝒆 𝒅𝒆𝒗𝒐𝒓𝒂𝒓𝒂𝒎 𝒐 𝒎𝒆𝒖 𝒑𝒂𝒊, de Afonso Cruz

 

Autor: Afonso Cruz
Título: Os livros que devoraram o meu pai
N.º de páginas: 126
Editora: Caminho
Edição (14.ª): Julho 2021
Classificação: Novela
N.º de Registo: (BE)



OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Já tinha lido Os livros que devoraram o meu pai, mas não tinha ainda escrito sobre ele. Então decidi relê-lo para emitir uma opinião.

É um livro mágico que se lê num fôlego. É um livro sobre livros e sobre a paixão pela literatura que nos transporta para o mundo real de Elias Bonfim, nos conduz numa viagem fantástica repleta de referências literárias e de histórias encantadoras que se “escondem nas partes brancas das folhas, entre as letras dos livros, nos espaços entre as palavras.” (p.64) e nos mergulha nos universos literários de A Ilha do Dr. Moreau, de H. G. Wells; O Estranho caso do Dr. Jeckyl and Mr. Hyde, de Robert Louis Stevenson; Crime e Castigo, de Dostoievski e Fahrenheit 451, de Ray Bradbury.

Elias Bonfim é o protagonista desta narrativa. Com 12 anos herda a biblioteca do pai e decide ler todos os livros, na ânsia de encontrar respostas para o desaparecimento misterioso do pai.
“Li, numa das minhas tardes passadas no sótão um conto de um escritor argentino chamado Borges, sobre um labirinto que é um deserto. Há inúmeros lugares onde um ser humano se pode perder, mas não há nenhum tão complexo como uma biblioteca.” (p. 28)

Nos longos períodos de leitura, Elias entrega-se à história e entra em amena conversa com as suas personagens. Assim, vai de enredo em enredo e numa mistura do quotidiano e do metafórico, engendra reflexões sobre o bem, o mal, a culpa e o medo, sem contudo cair na moralização.
“(…) custa-me sair das histórias que tenho vivido. Tenho visto ficções que só a realidade é que supera. E tenho um cão, (…) na realidade é Mr. Prendick (…) Um cão muito inteligente, de pelo preto e capaz de ser um animal perfeitamente racional. Característica de muitos cães e poucos homens.” (p. 76)

Recomendo para ser devorado por qualquer leitor! Porque é um livro simples e emocionante em constante diálogo com outros livros e "Porque um homem é feito dessas histórias, não é de adê-énes e músculos e ossos. Histórias." (p.126)




22 outubro, 2022

𝒄𝒂𝒅𝒆𝒓𝒏𝒐 𝒂𝒇𝒆𝒈ã𝒐, de Alexandra Lucas Coelho

 


Autora: Alexandra Lucas Coelho
Título: caderno afegão
N.º de páginas: 326
Editora: Tinta-da-China
Edição (5.ª): Janeiro 2015
Classificação: Diário de Viagem
N.º de Registo: (3343)


OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Caderno afegão é um relato em directo, objectivo e incisivo sobre uma geografia da guerra, do sofrimento, da morte, da desigualdade, da miséria, mas também sobre as tradições de um país, sobre uma história multisecular.
“E qual é o problema maior de todos, inflação, desemprego, saúde, guerra? Resposta imediata, nesta roda de mulheres e um rapaz:
- Bombistas suicidas,” (p. 50)

Alexandra Lucas Coelho (ALC) viveu no Afeganistão, entre 31 de Maio e 28 de Junho de 2008, como jornalista do Jornal Público e da Rádio Difusão Portuguesa. Através do seu olhar limpo e atento aos detalhes vamos, diariamente, acompanhando os seus relatos de viagem pelo país, os seus retratos de vida, a sua interpretação subtil, mas sentida de um país em ruinas, em guerra.


A aparente facilidade com que deambula pelas cidades que escolheu visitar, não está isenta de riscos. Nestes momentos de maior perigo, o seu relato torna-se menos objectivo, mas rigoroso deixando apenas perceber o risco.
“Mandam-me esperar quieta. Não me posso mexer sem escolta. Nem pensar em tirar fotografias.
Presa em Bagram. 14h Bagram. Media Center.
Vão libertar-me após averiguações.” (pp. 290 – 291)

O contacto com as pessoas é real, o relato actualizado diariamente é concreto, é vivido é sentido. As suas emoções são perceptíveis quando descreve o cheiro das rosas, presente em todos os jardins de Cabul (“Nunca vi tão forte dedicação às flores. Parece estar acima de tudo e a tudo ser imune. No meio do trânsito mais tóxico há rotundas com rosas lindas em Cabul,”(p.71)), o banho das mulheres no Hamman, o chá numa roda de mulheres, as refeições nos vários hotéis, as mulheres vestidas de burqa azul, entre muitos outros aspectos.

ALC escreve como observa a realidade. Foca-se nos diferentes sectores da sociedade afegã e nos muitos estrangeiros (humanitários, contratados e jornalistas) de múltiplas origens que povoam o país. Foca-se, essencialmente, na situação das mulheres “que desaparecem dentro das burqas. Elas desaparecem mesmo. Aquele pedaço de pano azul mexe-se e de lá sai uma voz abafada,” (p. 216); nas mulheres que não sabem ler; nas mulheres que têm filhos “antes de estarem amadurecidas” (p. 202); nas mulheres que não são tratadas porque não podem “mostrar o corpo a um médico homem.” (p.200); nas mulheres que ficam enclausuradas em casa porque não podem sair sozinhas.
“Nesta casa, a filha mais nova ainda não parece ter idade para ser adulta, mas já tem idade para usar burqa. Com a burqa por cima não se vê que idade tem.” (p. 519)

Sou apreciadora da escrita da ALC. Preocupa-se em relatar o que observa. Informa. Descreve com rigor e objectividade. É directa, sucinta, sincera. De vez em quando, deslumbra-se um flash mais poético, mais emotivo “ O mundo era a sua [de Babur] ostra. Um permanente desfrute” (p. 66); “Ghuti põe a burqa, apagando a luz dos seus trajes verde-lima.” (p. 112); “É uma paisagem soberba, indomada.” (p. 154); “É muito escuro dentro de uma burqa.” (p. 163)

Recomendo.



17 outubro, 2022

Exercício de escrita criativa - Da minha janela...

Foto minha



Da minha janela avisto uma imensidão de telhas alaranjadas mesclada de paredes brancas.
Vejo, ainda, a casa do Gama grande, forte, vigilante.
Mas esta visão simples e objectiva não é sedutora!
O que me leva diariamente à minha janela, é outra imensidão!
Uma imensidão azul, prateada, brilhante!
Da minha janela, vivo o MAR!



 

15 outubro, 2022

Centenário de Agustina Bessa-Luís

 

                                           Foto Paulo Spranger/arquivo Global Imagens

Agustina Bessa-Luís nasceu  a 15 de Outubro de1922, em Vila Meã, Amarante e morreu  a 03 de junho de 2019, aos 96 anos, no Porto.

Destacou-se em 1954, com a publicação do romance A Sibila, que lhe valeu  vários prémios, entre os quais  os Prémios Camões e Vergílio Ferreira.

Recebeu igualmente o Grande Prémio de Romance e Novela, da Associação Portuguesa de Escritores, em 1983, pela obra Os Meninos de Ouro, e, em 2001, por O Princípio da Incerteza I — Joia de Família.

Foi distinguida pela totalidade da sua obra com o Prémio Adelaide Ristori, do Centro Cultural Italiano de Roma, em 1975, e com o Prémio Eduardo Lourenço, em 2015.

Foi condecorada como Grande Oficial da Ordem de Sant’Iago da Espada, de Portugal, em 1981, elevada a Grã-Cruz em 2006, e com o grau de Cavaleiro da Ordem das Artes e das Letras, de França, em 1989, tendo recebido a Medalha de Honra da Cidade do Porto, em 1988.





14 outubro, 2022

𝑨 𝑽𝒊𝒂𝒈𝒆𝒎 𝒅𝒆 𝑱𝒖𝒏𝒐, Pedro Almeida Maia

 


Autor: Pedro Almeida Maia
Título: A Viagem de Juno
N.º de páginas: 232
Editora: Edições Letras Lavadas
Edição: Março 2019
Classificação: Distopia
N.º de Registo: ( )



OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


A Viagem de Juno é uma incursão ao futuro. É uma viagem fantástica que ocorre no ano de 2049 e que apresenta vários desafios, à boa maneira de um thriller psicológico. Tendo como tema principal as alterações climáticas, que transformaram o mundo, vamos acompanhar Juno e o seu avô Lucas na resolução de um caso complexo.

Tratando-se de uma distopia, acaba por colocar questões muito pertinentes. A utilização da evolução tecnológica e científica pode ser exemplar, mas também perversa. O autor centra as personagens num cenário altamente avançado tecnologicamente: as viagens acontecem via Rede Tubular Subaquática “sinónimo de segurança, rapidez e pontualidade.” (p. 19); os homens são especializados e trabalham menos porque são as máquinas laboram; há sistemas de reconhecimento de voz; as informações surgem em hologramas; todos usam um pulsemob que faculta todo o tipo de informação, de dados e traduz automaticamente qualquer língua. Outra temática cativante do livro é a criopreservação. Acompanhamos a primeira reanimação criónica humana, a de Aron Hilmarsson, um geólogo islandês.

É um livro cativante pois desperta a curiosidade do leitor sobre aspectos importantes e preocupantes do mundo actual. O livro apresenta possibilidades que apesar de fictícias poderão muito bem acontecer já que a evolução tecnológica e científica é uma evidência.
Gostei de “antever” que o futuro será bem mais confortável, mais seguro, mais limpo; que Portugal será um país rico; que a educação terá “o papel da excelência” com um ensino excitante onde as salas de aula serão “acusticamente perfeitas, dispostas em semicírculo, apetrechadas
com tecnologia holográfica e painéis simuladores de ambiência. Com temperatura, humidade e luminosidade controladas, os professores apenas tinham de se preocupar em ensinar.” (p. 164)
Mesmo tratando-se de uma distopia, continuo a crer que se trata, neste aspecto, ainda de uma utopia.

Recomendo a leitura. É um livro fascinante! É um livro multidisciplinar, de aventura, de ficção científica que se insere num contexto histórico, filosófico, científico e tecnológico, que levanta questões ambientais, éticas e de segurança que nos fazem reflectir.


10 outubro, 2022

Inquietação

 


O QUE HÁ EM MIM É SOBRETUDO CANSAÇO

O que há em mim é sobretudo cansaço —
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.

A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto em alguém,
Essas coisas todas —
Essas e o que falta nelas eternamente —;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.

Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada —
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser…

E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto…
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço,
Íssimo, íssimo, íssimo,
Cansaço


Álvaro de Campos

08 outubro, 2022

Um poema



Autopsicografia

O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.


Fernando Pessoa





07 outubro, 2022

𝑯𝒊𝒔𝒕ó𝒓𝒊𝒂𝒔 𝒅𝒆 𝑼𝒎 𝑻𝒆𝒎𝒑𝒐 𝑺ó, de Ana Zorrinho

 



Autora: Ana Zorrinho
Ilustradora: Raquel Ventura
Título: Histórias de Um Tempo Só
N.º de páginas: 53
Editora: ORO - Caleidoscópio
Edição: 2019
Classificação: Contos
N.º de Registo: (3397 )



OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Histórias de um Tempo Só são histórias de vida tecida, de momentos, de memórias. Micro histórias de gente trabalhadora, sofrida, enrugada, cansada, resignada. Dez histórias de gente “perdida na solidão, nos tempos que viveram…”; de gente vestida de negro, vincada pelas rugas; de gente à espera da morte; de gente só, triste, arquitecta de um “mundo que inventa”, de devaneios, de saudades.
Dez textos de um tempo “frio, cortante”, ventoso, escuro, silencioso, sem palavras. Um tempo indiferente à dor, à violência, à solidão, à velhice, à morte…

Assim que abri o livro no primeiro texto – Maria - e li a primeira frase “O Largo já não é o mesmo.”, senti, de imediato, que ia gostar. O universo realista de Manuel da Fonseca (“Antigamente, o Largo era o centro do mundo.”) assaltou-me à mente e fez-me sorrir. E foi com este espírito que parti à descoberta da escrita da Ana Zorrinho, também ela de Cerromaior.

Descobri uma escrita poética, marcante e extremamente sensível. Nem tudo é dito. Muito deve ser entendido nas entrelinhas, na força das palavras, no ritmo dos versos, nas frases curtas, compassadas que marcam o tempo que passa, que vincam as rugas, que engelham as mãos.
A escrita da Ana é muito visual, por vezes até, muito fotográfica. O real e o imaginado mesclam-se tão harmoniosamente que o leitor não os destrinça.

Mas não é tudo! Falta-me aludir às ilustrações da Raquel Ventura que enriquecem e complementam estas histórias. Com um traço vincado, a preto e branco, também elas põem a nu a dureza da vida, também elas tecem as marcas do tempo.


06 outubro, 2022

Annie Ernaux vence Prémio Nobel da Literatura 2022


Annie Ernaux, Foto Catherine Hélie © Editions Gallimard




Annie Ernaux, escritora francesa  de 82 anos, foi hoje galardoada com o Prémio Nobel da Literatura.
É a 17.ª mulher a ser distinguida com este galardão atribuído pela Academia Sueca e a França é pela 16.ª vez contemplada com  o prémio literário mais importante do mundo. 

Com esta escolha, o júri do Nobel quis recompensar «a coragem e a acuidade clínica com que ela revela as raízes, as distâncias e os constrangimentos colectivos da memória pessoal». A Academia Sueca premiou uma escritora que «examina constantemente, de diferentes ângulos, vidas marcadas por disparidades, nomeadamente: género, língua e classe social».
Como primeira reacção, a escritora considera esta distinção uma «grande honra» e uma «responsabilidade: «Testemunhar (...) uma forma de justiça, do justo, em relação ao mundo».

O jornal francês  Le Monde  afirmou que se trata de  «uma obra que utiliza a autobiografia apenas de forma a contar uma história, sensações e emoções comuns», que é «admirável pela sua constância», num esforço contínuo para «tentar elucidar a realidade, para alcançar a compreensão e expressão de uma verdade sobre a existência, de outra forma inacessível».

Em Portugal, estão traduzidas as obras Os Anos, Uma Paixão Simples e O Acontecimento, todos editados pela chancela Livros do Brasil 

Já li Os Anos e adorei. Partilho a opinião que escrevi na altura e que está publicada neste mesmo blogue. 

https://fragmentos-lte.blogspot.com/search/label/Annie%20Ernaux 



05 outubro, 2022

𝑻𝒖 é𝒔 𝒂 𝒎𝒖𝒍𝒉𝒆𝒓 𝒅𝒂 𝒎𝒊𝒏𝒉𝒂 𝒗𝒊𝒅𝒂, 𝒆𝒍𝒂 é 𝒂 𝒎𝒖𝒍𝒉𝒆𝒓 𝒅𝒐𝒔 𝒎𝒆𝒖𝒔 𝒔𝒐𝒏𝒉𝒐𝒔, de Pedro Brito e João Fazenda

 



Autor: Pedro Brito
Ilustrador: João Fazenda
Título: Tu és a mulher da minha vida, ela é a mulher dos meus sonhos
N.º de páginas: 
Editora: Edições Polvo
Edição (3.ª): Julho 2002
Classificação: Banda desenhada
N.º de Registo: (BE)


OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Esta obra veio parar-me às mãos por mero acaso. Posso afirmar que foi um acaso feliz já que se trata de uma pequena maravilha. Que marca um tempo actualíssimo (publicado em 2000) e um género artístico muito em voga.
Gostei da criação gráfica (desenhos e cores), de João Fazenda, que considero muito original. Gostei do argumento, de Pedro Brito, que se baseia nas relações humanas; na incapacidade de aceitar as diferenças do outro, na busca ambiciosa do sucesso profissional, na insegurança.
A história centra-se na vida de um casal que atravessa uma fase crítica em que os interesses de cada um tendem a afastar-se cada vez mais. Ambos criativos (ele, Tomás, escritor; ela, Elsa, pintora) manifestam alguma insatisfação profissional. Ele, sem inspiração para a escrita procura uma musa; ela, bajuladora, procura mecenas para a sua obra.
A história é simples, mas os diálogos extraordinários, o traço fino e o colorido (manchas vermelhas) das ilustrações tornam-na original e marcante.
É uma banda desenhada que recomendo. Quem folhear o livro, não ficará convencido porque as ilustrações, aparentemente, não são atractivas. Mas à medida que vamos lendo o argumento e observando as opções do traço e da cor, ficamos cada vez mais encantados.