Autora: Simone de Beauvoir
Título: O Sangue dos Outros
Tradutor: Miguel Serras Pereira
Tradutor: Miguel Serras Pereira
N.º de páginas: 255
Editora: Colecção Mil Folhas - Público
Edição: Janeiro 2003
Classificação: Romance
N.º de Registo: (1466)
OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐
Em O Sangue dos Outros, Simone de Beauvoir explora as complexidades morais e existencialistas enfrentadas pelas personagens durante a ocupação alemã em Paris, na Segunda Guerra Mundial. Nestes tempos de conflito, o leitor encontra-se dividido perante as decisões de Jean e Hélène; perante a angústia de viver e de ser ou não necessário para o outro; perante a verdade e a mentira; perante a aceitação de amar.
“ (…) E a angústia explode, sozinha no vazio, para além de todas as coisas desvanecidas. Estou sozinho. Eu sou esta angústia que existe por si só, apesar de mim; confundo-me com esta existência cega. Apesar de mim, e contudo não jorrando senão de mim. Recuso-me a existir: existo. Decido existir: existo. Recuso. Decido. Existo. Haverá uma alvorada.” (p. 140)
O mote do romance é-nos facultado pela brilhante epígrafe "Todos somos responsáveis por tudo perante todos", de Dostoievski. Desde logo, somos confrontados com a responsabilidade de existir, de tomar decisões. A angústia da escolha entre a liberdade individual e a colectiva manifesta-se ao longo da narrativa e Jean Blomart questiona-se e interroga os outros sobre o significado de liberdade, sobre os limites dessa mesma liberdade, sobretudo quando milita num movimento de resistência.
Neste livro fica claro que, apesar de sermos livres de escolher, quando o somos (veja-se a situação do povo judaico), a consciência de que temos essa liberdade, pode tornar-se num grande sofrimento. Blomart desafia-nos a reflectir sobre o impacto que cada decisão pode ter na vida de outrem.
Neste livro fica claro que, apesar de sermos livres de escolher, quando o somos (veja-se a situação do povo judaico), a consciência de que temos essa liberdade, pode tornar-se num grande sofrimento. Blomart desafia-nos a reflectir sobre o impacto que cada decisão pode ter na vida de outrem.
"Contar as vidas humanas, comparar o peso de uma lágrima com o peso de uma gota de sangue, era uma tarefa impossível, mas ele já não tinha que fazer contas, e toda a moeda era boa, mesmo essa: o sangue dos outros. O preço nunca seria caro de mais. (…) Tudo é melhor que o fascismo.” (pp. 201 e 202)
Acompanhamos todas as suas dúvidas e com ele vivemos o tormento da culpa e da responsabilidade. Recorrentemente, somos confrontados com questões como "Até que ponto somos responsáveis pelo sangue dos outros?", "Onde estava a culpa?", "Que podemos nós fazer?", "O que é o amor?".
O Sangue dos Outros é um romance poderoso e provocador, publicado em 1945. Numa escrita despretensiosa e natural, arrasta o leitor para a essência do existencialismo, da condição humana, explorando a culpa, o remorso ("por todo o lado, em todas as encruzilhadas, o remorso rondava: eu trazia-o colado à minha pele, íntimo e tenaz), a vergonha (“a nova imagem do remorso"), a responsabilidade da escolha, a angústia, a solidão, a busca da liberdade num mundo absurdo, em guerra. Nele, cada personagem luta por si, e é forçado a encontrar os seus valores morais.
"As pessoas são livres – disse eu [Jean] -, mas apenas cada uma por si própria; não podemos tocar na liberdade dos outros, em prevê-la, nem exigi-la. É exactamente isso que me é tão penoso; o que faz o valor de um homem não existe senão para si próprio, não para mim…" (p. 113)
Em 1983, O Sangue dos Outros foi adaptado ao cinema por Claude Chabrol, com Jodie Foster e Sam Neill nos papéis principais.
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