Autora: Inês Pedrosa
Título: Nas Tuas Mãos
N.º de páginas: 227
Editora: D. Quixote
Edição (7.ª): Março 2003
Classificação: Romance
N.º de Registo: (1664)
OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐
Nas Tuas Mãos integra três partes, com dez textos cada, que nos confrontam com três vidas, três mulheres, três gerações. Três perspectivas autobiográficas – Jenny, a aristocrata; Camila, a fotojornalista e Natália, a arquitecta - que começam na década de trinta sob o regime conservador, opressivo, patriarcal e bafiento de Salazar e findam nos anos noventa.
Cada uma das partes é introduzida por uma epígrafe que exalta a força da amizade, do amor. Contudo, na minha opinião, é a terceira, de Vergílio Ferreira “Não sei fingir que amo pouco quando em mim ama tudo” que melhor colige os sentimentos e os comportamentos das três mulheres.
Jenny, mãe e avó, num diário intimista e confessional, em diálogo com o falecido marido, lega-nos os seus segredos de um casamento de fachada, a sua força para combater as traições do homem que ama, decepções de amizade, mudanças sociais. Camila selecciona dez fotografias para, a partir delas, recordar e nos descrever uma época turbulenta de desencontros e perdas, de perseguição e tortura da ditadura, de dedicação às lutas revolucionárias, de envolvimento, como repórter, na guerra colonial de Moçambique, na busca de uma terapia para a solidão e o luto. Mas é no ato obsessivo de fotografar que ela resgata a verdade, a sua verdade. Natália, concebida em Moçambique, personifica a actualidade e é nas cartas que escreveu à avó Jenny, que a vamos descobrir. Nelas, ela revela o seu sucesso profissional, o seu distanciamento com a mãe, a procura da sua história, do seu pai, o (des)encontro com o amor e, sobretudo, a sua admiração pela avó. Natália descobre-se e define-se através das vidas misteriosas e independentes das suas antecessoras. E acaba por concluir que, apesar de tudo, constituem três gerações de solidão que se continuam.
Numa escrita muito poética e comovente, a autora apresenta-nos três vozes que vagueiam desiludidas num mundo agitado e perdidas no campo amoroso; que partilham a extravagância da classe alta em Lisboa; o idealismo das lutas dos anos sessenta e a impaciência e o desalento da década de oitenta/noventa.
Gosto sobremaneira da voz de Jenny. É um discurso intimista que revela uma mulher de olhar triste e doce, que assiste à paixão do marido por Pedro; que apaixonada vive louca e dolorosamente só numa casa enorme. É a voz que silencia a homossexualidade do marido, inaceitável na época; que denuncia a sua intimidade, que reflecte sobre a sua longa vida que acaba melancolicamente num reconhecimento de desistência, de “desaparecimento dos sonhos.”
Para concluir, Nas Tuas Mãos é uma obra sobre o íntimo de três mulheres, mas também sobre a transformação de uma sociedade. Através do olhar de cada uma são-nos apresentados fragmentos de um país que vive uma crise de identidade cultural, social e política.
Sem comentários:
Enviar um comentário