12 abril, 2020

La Peste, de Albert Camus


OPINIÃO

Li este livro há muitos anos como leitura obrigatória. Não tinha maturidade suficiente para alcançar a dimensão da mensagem. Sabia que lhe daria uma segunda oportunidade, e esse momento chegou, estabelecendo um paralelismo entre a peste que na narrativa assolou Oran (Orão), em 1940, e o Covid 19 que vivemos presentemente. A situação é bem diferente em termos de conhecimentos científicos, de condições sanitárias, de comunicação, entre muitos outros aspectos, mas em termos comportamentais há muitas semelhanças como, por exemplo, a ligeireza como se abordou, no início, a doença, negando os riscos de contaminação exponencial, o incumprimento das normas, as tentativas de saída da cidade, a evolução da inquietação, do medo, das mortes. 

Camus escreveu este livro nos anos 40 (publicado em 1947), durante a Segunda Guerra Mundial, pelo que a narrativa é uma alegoria à ocupação alemã. Os franceses ocupados foram subjugados, perseguidos, torturados, mortos e muitos viveram escondidos e exilados na expectativa de uma reviravolta libertadora. Ele próprio colaborou na Resistência francesa, em luta contra os opressores nazis. 
Neste romance de enorme profundidade, o narrador é claro e objectivo, por vezes, distante e frio. A cidade assolada pela peste é descrita de forma soberba. O medo dos habitantes confinados, o sofrimentos dos doentes, o envolvimento dos que se encontram na linha da frente (destaco o médico Bernard Rieux), os riscos que correm na luta diária e desigual, o racionamento de bens alimentares e, por fim, a morte. Mas temos também momentos de grande solidariedade, de altruísmo e de amizade. Gosto sobretudo da forma como ele expõe o carácter humano. Há personagens magníficas (para além do já citado médico, há Tarrou, Cottard, Rambert, Grand e o padre Paneloux). 

No final da “crónica”, o narrador afirma que a peste não acaba, não morre, apenas se esconde para reaparecer um dia. Transpondo esta conclusão para os dias de hoje, poder-se-á questionar “o que é que vai mudar na nossa vida, na nossa sociedade depois desta epidemia? “ 

É de facto impressionante como esta obra é intemporal. Passados cerca de 75 anos, o mundo está a viver uma situação quase idêntica, isto é, uma sociedade confinada, a sofrer com o medo do futuro e a chorar as perdas humanas. É necessário chegar a uma situação extrema para reflectirmos sobre a vida, sobre as relações humanas, sobre os laços familiares.






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