Autor: Frederico Lourenço
Título: Pode um Desejo Imenso
N.º de páginas: 504
Editora: Quetzal Editora
Edição: Abril 2022
Classificação: Romance
N.º de Registo: (BE)
OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐
Pode um Desejo Imenso publicado na Quetzal em Abril de 2022, foi, primeiramente, publicado como trilogia pela Cotovia. Ou seja, a este título publicado em 2002, seguiram-se O Curso das Estrelas, também em 2002, e À beira do mundo, em 2003.
Nesta nova edição, com uma capa belíssima, foi atribuído o mesmo título a cada uma das três partes que o constituem e pela mesma ordem de escrita.
Não sendo um romance autobiográfico, como já foi referido pelo autor, em entrevistas, acaba por revelar aprendizagens conquistadas quer pessoal quer profissionalmente.
Poder-se-á intuir, certamente, que o protagonista, Nuno Galvão, professor universitário especialista de literatura e da obra de Camões, é o alter-ego de Frederico Lourenço, na sua paixão pelos clássicos, sobretudo por Camões, que tanto cita ao longo da narrativa. Aliás o verso camoniano, que deu o título ao livro, será o elo agregador das três partes.
Na primeira parte, Nuno Galvão professor universitário, camoniano de paixão, desenvolve uma tese sobre Camões e foca-se no possível amor que o poeta sentiu por D. António de Noronha de quem foi preceptor. O livro constrói-se no paralelismo existente entre este possível amor e a paixão platónica do professor universitário por um dos seus alunos.
Na segunda parte, há um retorno ao tempo em que Nuno Galvão é estudante universitário e com ele mergulhamos nas dúvidas existências, sexuais e na lírica de Camões, entre outros aspectos que não vou desvendar. Na terceira, é o regresso ao presente, a alguns reencontros e a possíveis reconciliações. O final da história, em aberto, é quase cinematográfico e abre um caminho à esperança, “em direção à outra margem”. Talvez seja a parte mais ficcional.
Assim, ao longo da obra – das três partes - acompanhamos o crescimento do homem e do intelectual, Nuno Galvão. Reencontramos o amor e a sexualidade expostos sem tabus. Conhecemos um homem que vive, de forma intensa e controlada, um amor platónico, que descobre a sua inclinação homossexual, que explora o homoerotismo, que se aceita com lucidez. Emocionamo-nos com o sofrimento e com as perdas. Admiramos a sua dedicação à profissão e a Camões.
A escrita de Frederico Lourenço é erudita, por vezes complexa, mas fluente, acabando por conduzir o leitor a uma leitura ávida. Há inúmeras referências a autores clássicos, a versos da lírica camoniana que tanto me agradam. Contudo, aquando da leitura da primeira parte que integra a comunicação "Camões e D. António de Noronha. Ecos Homoeróticos nas Rimas" que Nuno Galvão irá proferir num colóquio camoniano, interroguei-me se, quem não tiver um conhecimento mais vasto do nosso maior poeta, poderá, da mesma forma, fruir completamente deste livro. Talvez não. Mas poderá servir de motivação para a descoberta ou aprofundamento da sua lírica. O romance, em si, acompanha-se perfeitamente.
Pode um desejo imenso
Arder no peito tanto
Que à branda e a viva alma o fogo intenso
Lhe gaste as nódoas do terreno manto,
E purifique em tanta alteza o espírito
Com olhos imortais
Que faz que leia mais do que vê escrito.
(…)
Ode VI, de Luís Vaz de Camões