17 fevereiro, 2025

𝑵𝒐𝒊𝒕𝒆, de Elie Wiesel

 


Autor: Elie Wiesel
Título: Noite
Tradutora: Paula Almeida
N.º de páginas: 133
Editora: D. Quixote
Edição: Agosto 2023
Classificação: Testemunho
N.º de Registo: (3663)



OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐⭐


Vencedor do Prémio Nobel da Paz em 1986, Elie Wiesel, judeu e sobrevivente do Holocausto, desenvolveu um trabalho importante em defesa da dignidade e dos direitos humanos.
Noite é um testemunho importante (ao nível de um Se Isto É Um Homem, de Primo Levi) sobre os horrores praticados na segunda guerra mundial porque nos apresenta um relato aterrador e doloroso da sua experiência no gueto e nos campos de concentração.

Com apenas 15 anos, Elie e o pai, separados da mãe e das irmãs logo à chegada ao campo, à tão terrível selecção – “o perigo mais grave”, lutaram pela sobrevivência. Enfrentaram torturas, fome, frio, longas caminhadas, doenças e presenciaram a morte nas mais diversas formas.

Numa escrita crua, concisa e intensa, Elie, anos depois e por uma questão de sobrevivência mental, resgata as suas memórias por entender que é necessário preservá-las e revelá-las ao mundo. Elie denuncia detalhadamente a violência, a crueldade de episódios que viveu e testemunhou; revela a sua perda de inocência (“( …) daquela criança que descobre. De uma assentada, o mal absoluto.”) e de dignidade perante o horror e a banalidade do mal; descobre a sua revolta, a sua angústia por ter deixado de acreditar em Deus, “Não tinha negado a Sua existência, mas duvidada da Sua justiça absoluta.” (p. 59); denuncia a sua impotência perante a morte há muito anunciada de seu pai. É doloroso acompanhar a degradação das pessoas perante a necessidade de sobrevivência.

Por muito que já tenha lido sobre o assunto, sou sempre surpreendida com novos factos que me levam a reflectir sobre a crueldade do ser humano em relação ao outro e sobre a real dimensão da ferida legada às gerações seguintes.
Hoje, surge-nos, de novo, a ameaça dos valores humanos, democráticos. Urge analisar, debater e repensar alguns valores visíveis e crescentes nas nossas sociedades, como a xenofobia, a descriminação, a intolerância. Há uma dimensão do mal que se instala gratuitamente

Apesar, de ser uma obra dura porque muito realista, recomendo a sua leitura. Elie Wiesel dedicou parte da sua vida a lutar pelos direitos humanos e a manter viva a memória do Holocausto.
A certa altura (p. 48), perante o que ele e muitos apelidaram de “antecâmara do inferno”, ou seja, perante “tanta brutalidade bestial”, Elie, apertou a mão do pai e pensou:
“Nunca esquecerei aquela noite, a primeira noite no campo, que fez da minha vida uma noite longa e sete vezes aferrolhada.
Nunca esquecerei aquele fumo.
Nunca esquecerei os pequeninos rostos das crianças cujos corpos eu vi transformarem-se em espirais sob um céu mudo.
Nunca esquecerei aquelas chamas que consumiram para sempre a minha Fé.
Nunca esquecerei aquele silêncio nocturno que me privou, para a eternidade, do desejo de viver.
Nunca esquecerei aqueles momentos que assassinaram o meu Deus e a minha alma, e que transformaram os meus sonhos em cinzas.
Nunca esquecerei, mesmo que tenha sido condenado a viver tanto tempo quanto o próprio Deus.
Nunca.”

Por tudo isto, também nós, não podemos esquecer. Não podemos deixar que o passado se venha a repetir.



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