29 maio, 2024

𝑶 𝒄𝒖𝒍𝒕𝒊𝒗𝒐 𝒅𝒂𝒔 𝒇𝒍𝒐𝒓𝒆𝒔 𝒅𝒆 𝒑𝒍á𝒔𝒕𝒊𝒄𝒐, Afonso Cruz

 

Autor: Afonso Cruz
Título: O cultivo de flores de plástico
N.º de páginas: 107
Editora: Companhia das Letras
Edição: Novembro 2023
Classificação: Teatro
N.º de Registo: (3537)


OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐



Em O cultivo de flores de plástico, Afonso Cruz coloca em acção quatro personagens sem-abrigo - Jorge, Senhora de Fato, Couraçado Korzhev e Lili, que por razões diversas perderam a capacidade de sonhar.
No decorrer das nove cenas, o leitor acompanha a conversa destas quatro pessoas que vivem na rua privadas de conforto, de emprego, de família, de carinho, que aceitam uma refeição de caridade.
“Aproxima-se um carro. Os sem-abrigo estão todos em fila.” É este o início da peça, da primeira didascália.

Afonso Cruz é corrosivo ao expor a vida destes homens e mulheres, personagens-tipo de uma sociedade insensível, cega e egoísta. Os pequenos episódios narrados espelham bem o abandono, a indiferença e o esquecimento a que foram, e são ainda, votados.

A miséria em que vivem torna-os descrentes, excluídos, invisíveis. Jorge, um dia, ao ver reflectida a sua imagem numa montra, percebe que é invisível aos olhos dos outros: “ No fundo, é isso. Ninguém nos vê. Somos invisíveis. A miséria é uma poção de invisibilidade.” (p. 38)
Afonso Cruz é exímio na forma como recorre à ironia para despertar emoções e alertar para este problema cada vez mais extremo e premente.
“O cultivo das flores de plástico” denota a indiferença, a falsidade de todos os que têm por obrigação devolver a dignidade a estas pessoas, de todos os que assobiam para o lado, que ignoram, que fingem desconhecer esta vergonha social. É ainda Jorge que refere “ Parece que os povos estão separados por um espelho. A esquerda de uns é a direita de outros.” (p. 50)

Ao terminar este livro não ficamos indiferentes à dor, à infelicidade e à solidão destas pessoas.
Captamos a mensagem e questionamo-nos sobre o que andamos a fazer nesta vida? o que ambicionamos para o futuro? O que pretendemos cultivar? O que andamos a regar?
“cactos (…) Cheios de céu aberto , pessoas cheias de ar livre.(…) muitas portas no mundo?” (p. 41)

ou

“flores de plástico (…) coisas que não servem para nada. É tudo plástico. E nós regamos essas flores e esperamos que cheirem a coisas boas.” (p. 61)

Ficam as perguntas…




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