28 agosto, 2023

Deslumbres!





Bazar


Panos flutuantes de todas as cores
às portas do vento, no umbral da tarde.

E olhos negros.

Jardins bordados: roupas, sandálias
como escrínios de seda para alfanjes.

E negros olhos.

Molhos de penas de pavão. Colares de nardo
 a morrerem do próprio perfume
entre tufos de fios de ouro.

E os delicadíssimos dedos.

Pratos de doces verdes cor-de-rosa:
pistache, coco, amêndoa, gulab.

Lábios de veludo.

Caixas, bandejas, aguamanil, sineta,
e o mundo do bídri: noite de chumbo e lua.

E olhos negros. E negros olhos. 

Pingentes, borlas, ébano e laca,
feltros vermelhos, pulseiras de mica,
filigranas de marfim e ar.

E os dedos delicadíssimos.

Cestos cheios de grãos. Frigideiras enormes.
Grandes colheres. Muita fumaça. Muitos pastéis.

Lábios de veludo.

Corolas de turbantes. Brinquedos. Tapetes.
O homem que cose à máquina, o que lê as Escrituras.

Olhos negros.

Portais encarnados, cor de mostarda, verdes.
Velhos ourives. Ai, Golconda!
E uma voz bordando músicas trêmulas.

Negros olhos.

Bigodes. Balanças. Barros, alumínios
Muitas bicicletas: porém o passo rítmico das mulheres majestosas.

Aromas de fruta, incenso, flor, óleo fervente.

Sedas voando, pelo céu.

E os nossos olhos. Os nossos ouvidos. Nossas mãos.
(objetos banais)


Cecília Meireles, Poemas Escritos na Índia



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