10 agosto, 2023

𝑨 𝑴𝒐𝒓𝒕𝒆 𝒅𝒆 𝑰𝒗𝒂𝒏 𝑰𝒍𝒊𝒄𝒉, de Tolstoi

 


Autor: Tolstoi
Título: A Morte de Ivan Ilich
Tradutor: João Maia
N.º de páginas: 72
Editora: Editorial Verbo - Livros RTP
Edição: s/data
Classificação: Novela
N.º de Registo: (2841)


OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐⭐



Genial. Tolstoi narra de forma exímia a dor, o sofrimento, a morte. 
A Morte de Ivan Ilich convoca o leitor à reflexão sobre a condição humana perante a fragilidade e a finitude do ser humano. É perante a proximidade da morte que o protagonista se questiona sobre a vida, os sentimentos, os valores, os afectos. É brutal a sua interpelação interior e a incompreensão perante a certeza da morte. O leitor embarca no sofrimento e na angústia e sente dó porque é impotente perante tanta dor. Mas o que mais incomoda não é tanto a dor física, porque não é sentida, mas a dor psicológica, existencial na qual o leitor se revê e associa à sua própria existência.

“Mas que estou eu para aqui a arengar? Qual o fim da existência? Não pode ser. É impossível que a vida seja tão absurda e repulsiva. E se o é, para que morrer, e morrer entre sofrimentos? Aqui há qualquer coisa que não carbura.
Acaso a minha vida não foi como devia ser?” (p. 65). 

Ivan arrepende-se da vida que levou, uma vida de falsidade, de aparência, de repulsa, de desilusão. E é neste estado de arrependimento que culpabiliza a família e os médicos que não o compreendem. 
Tolstoi explora a capacidade de cada um perante a iminência da morte: a negação total do doente que acredita e quer viver “ Sim, quero viver, quero viver. (…) Não, não é isso. Tudo o que foi, tudo o que é a tua vida não passa de mentira. É um engano que te não deixa ver nem a vida nem a morte.” (p.71); 
a incompreensão e a ausência de cuidados e de acompanhamento dos mais próximos; 
o incómodo causado pelo doente junto dos que anseiam uma existência sossegada, sem percalços “- Que culpa temos nós? – disse Lisa à mãe. – Como se tivéssemos sido nós a adoentá-lo! – Tenho dó do papá, mas porque teima em nos aborrecer.” (p. 69).

É um livro fabuloso se tivermos em conta a época em que foi escrito (1886). Na Rússia e noutros países, a morte era um assunto tabu que não devia ser questionado. Tolstoi com a sua obra, e muito em particular nesta, expôs as contradições sociais, a hipocrisia da sociedade, a estratificação de classes, o pensamento religioso e político vigente. Com subtileza revela o carácter mesquinho, desventurado e interesseiro dos homens e mulheres do século XIX. Ou será de todos os tempos?

Obra intemporal, de teor claramente reflexivo sobre a solidão, o sofrimento, a luta interior de negação da doença terminal e, posteriormente, de aceitação da morte. Nela, Tolstoi realça o sentido da vida através da exaltação de uma existência simples e autêntica, em oposição ao fingimento, ao oportunismo e ao materialismo. E destaca, no final, a importância da compaixão como valor essencial à superação da dor e à aceitação da morte. 
Pessoalmente, concluo que esta leitura é um convite à reflexão da nossa própria existência, à valorização das coisas boas da vida e à compreensão da inevitabilidade da morte.



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