02 novembro, 2020

O Grande Rebanho, de Jean Giono


 

OPINIÃO


Pouco tenho lido sobre a Primeira Guerra Mundial, pelo que decidi ler o testemunho ficcionado de Jean Giono. Estamos perante uma visão muito humanista do autor, para além da descrição do sofrimento dos homens que partiram, ele aborda também o sofrimento e a angústia dos que ficaram, mulheres, crianças e homens mais velhos. 

O romance inicia com a passagem pela aldeia de um grande rebanho. Ao longo da transumância, há animais que ficam pelo caminho, feridos, moribundos, mortos. Imagem terrível, sangrenta, dolorosa dos “ animais [que] baliam em conjunto, um balir plangente, de dor.”(p.21)
"Os animais estavam exaustos, alguns agora doentes. Era um rebanho que nunca mais acabava. Os animais metiam pena, a arrastar-se na estrada. Não suportavam mais sofrimento." (p. 22) 
“Está tudo cheio de carneiros mortos pela estrada fora.” (p.26) 

Logo de início, percebemos que este rebanho é uma metáfora da guerra, aprendemo-lo pela voz de Clérestin, um habitante da aldeia, “E Clérestin pôs-se a olhar também para longe, para lá dos animais que passavam, como se visse presságios, terríveis profecias do que estava ainda para acontecer, profecias escritas com sangue e sofrimento que aquele rebanho anunciava, ali, diante deles, ao longo da estrada coberta de poeira.” (p.23) 

A mensagem é clara! Na guerra, tal como os animais, os homens exaustos, feridos, inúteis ficam para trás, abandonados! Sofrem, agonizam, morrem! Ninguém olha para trás e quem o fizer vai ficar com marcas, com traumas! 

Jean Giono descreve os horrores vividos nas trincheiras de forma crua e chocante em oposição à simplicidade, à beleza e aos sons da natureza. Através desta dicotomia, sempre presente ao longo da obra, o autor pretende mostrar o absurdo da guerra e realçar a vida, a esperança. É precisamente com esta mensagem que termina a obra. Uma criança nasce, filha de Olivier, um sobrevivente, e de Madeleine. 

"E antes de mais, digo-te: eis a noite, eis as árvores, eis os animais. Mais tarde verás a luz do dia. (...) terás oportunidade de amar (…), como alguém que cultiva a terra com a charrua (...). E amarás as estrelas.
(…) – Deixa, mulher, deixa. É preciso que lhe mostremos desde já o que é a esperança!” (p.220)


Sem comentários:

Enviar um comentário