12 junho, 2022

𝑨𝒇𝒂𝒔𝒕𝒂𝒓-𝒔𝒆 - 𝑻𝒓𝒆𝒛𝒆 𝑪𝒐𝒏𝒕𝒐𝒔 𝒔𝒐𝒃𝒓𝒆 Á𝒈𝒖𝒂, de Luísa Costa Gomes


Autor: Luísa Costa Gomes
Título: Afastar-se - treze contos sobre Água
N.º de páginas:213
Editora: D. Quixote
Edição: Maio 2021
Classificação: Contos
N.º de Registo: (3369)




OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Afastar-se! Tal como a água que corre, que se afasta, assim é a vida. Nos treze contos que integram este livro, a água, como a própria autora o refere, “está sempre presente, doce, clorada, salgada, mais larga ou mais discreta, no oceano (…) no duche, (…) na saliva (…) na piscina”. A água surge como meio de integração, de salvação (terapia), de prazer e de dissolução.
“ Atira-se para se afastar da margem. Avança sem coordenação e elegância. Oblíqua na água calma e quando se cansa vira o peito aos céus e flutua, engolindo um ou outro pirolito. Nada com uma determinação de galgo, sem olhar para trás, cada vez para mais longe até sentir que está no meio do mar, Aí, deita-se ao comprido na água e goza o ser. (p. 9)
e
“No amor, na piscina onde se nada. Cada banho me retira uma camada de pele à medida que mergulho na alegria. Sou cada vez mais carne viva. Sofro e sofro sem dó nem piedade. Gozo a minha indecência. A água está morna e faz-me querer ser água e regar cada torrão do jardim. Ao cair do sol vou cavar buracos e espremo as lágrimas lá para dentro. Saltam dos olhos, as pequenas idiotas. E aspiro a que ao terceiro dia esteja tão seca e ressequida que possa flutuar como um lanho e dissolver-me à superfície.» (p. 79)

São relatos que expressam o vivido, o sentido, o desfiar de memórias, o desejo de liberdade, projectos de escrita. São relatos que se cruzam com gente famosa como Byron, Pirandello, Kierkegaard, entre outros que, não citados, podem ser identificados. São relatos simples e simultaneamente complexos. Simples porque descrevem actos comuns, verosímeis, autobiográficos (?). Complexos porque revelam a natureza humana, o âmago da personagem: fraquezas, ambições, desejos, sonhos.
A escrita burilada, poética, ritmada, fluída, densa, subjectiva conduz o leitor a múltiplas interpretações, a imaginar o não dito, mas legado nas entrelinhas.
Gosto desta literatura libertadora que funciona, aqui, como uma boia, sobretudo quando “afastar-se” significa ir mais além, correr riscos, libertar-se, sonhar, ou seja, VIVER.


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