Autor: Maria João Lopo de Carvalho
Título: As Revolucionárias - Doze Mulheres Portuguesas Desobedientes
N.º de páginas: 342
Editora: Sibila Publicações
Edição: Fevereiro 2023
Classificação: Biografias
N.º de Registo: (3717)
OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐
As Revolucionárias não é apenas um livro sobre mulheres que fizeram história — é um testemunho da coragem que desafiou as estruturas rígidas de uma sociedade que queria as mulheres em casa, confinadas ao silêncio e à invisibilidade. Estas doze portuguesas (Maria Amália Vaz de Carvalho, Carolina Michaëlis de Vasconcelos, Angelina Vidal, Adelaide Cabete, Domitila de Carvalho, Ana de Castro Osório, Virgínia de Castro e Almeida, Carolina Beatriz Ângelo, Virgínia Quaresma, Irene Lisboa, Regina Quintanilha e Maria Lamas), que ousaram dizer não ao silêncio, à exclusão, à norma, foram as pioneiras na recusa de papéis impostos, desobedecendo aos estereótipos do “feminino” e abrindo caminhos limitados e bem pedregosos.
Cada uma delas, à sua maneira, com a sua linguagem em construção, foi uma desobediente contra o sistema que negava às mulheres o direito ao saber, ao trabalho, à voz pública, à autonomia e à liberdade. Temos médicas que desafiaram a exclusão das faculdades, advogadas que lutaram por direitos legais, jornalistas que deram visibilidade às causas femininas, professoras que abriram portam nas universidades, cineastas que captaram realidades silenciadas, intelectuais que questionaram o estabelecido.
A desobediência destas mulheres, a quem muito devemos, não foi um acto isolado, mas um movimento colectivo de resistência que atravessou o século XIX e o início do XX, da Monarquia, à República, ao Estado Novo. Todas enfrentaram censuras, preconceitos, exclusões sociais e políticas, mas mantiveram-se firmes na luta pelo reconhecimento do lugar da mulher na sociedade.
Entre as doze mulheres que Maria João Lopo de Carvalho convoca, duas representam, para mim, exemplos de uma travessia: Carolina Michaëlis, filóloga e professora universitária, e Maria Lamas, jornalista e ativista política.
Carolina, estrangeira por nascimento e íntima da língua portuguesa por vocação, ensinou-nos que o rigor pode ser gesto de amor. Foi a primeira mulher a lecionar numa universidade portuguesa, e fê-lo com uma delicadeza que desafiava o masculino institucional. A sua desobediência foi silenciosa, mas fundadora.
Maria Lamas, por outro lado, fez da palavra uma arma. Escreveu, traduziu, dirigiu revistas, enfrentou censuras e prisões políticas. Em As Mulheres do Meu País, percorreu Portugal com o corpo e com a escuta, fotografando vidas invisíveis. A sua desobediência foi pública, ruidosa, política — e profundamente poética.
Estas duas mulheres são as minhas preferidas. Não apenas pelo que fizeram, mas pelo modo como encarnam duas formas distintas e complementares de desobediência: a do silêncio que funda e a do grito que transforma. Mas todas, as doze, foram desbravadoras e construíram um legado de ousadia, solidariedade e transformação.
Em suma, este livro não é uma biografia colectiva. É um manancial de memórias. Em cada capítulo (breve biografia) encontramos não apenas factos, mas feridas, dúvidas, receios, gestos de coragem e cumplicidades entre mulheres. Este livro é, assim, um convite para escutar essas vozes que recusaram o silêncio, para reconhecer a luta que continua, e para celebrar a desobediência como força vital que faz avançar o mundo. Lê-lo é um acto de resistência e de possibilidade de futuro.
Recomendo a sua leitura. Gostaria que houvesse uma continuação porque houve mais mulheres corajosas e desobedientes no nosso país.
Sem comentários:
Enviar um comentário