22 abril, 2025

𝑳𝒖𝒄𝒊𝒂𝒍𝒊𝒎𝒂, de Maria Velho da Costa


Autora: Maria Velho da Costa
Título: Lucialima
N.º de páginas: 351
Editora: O Jornal
Edição (2.ª): Junho 1983
Classificação: Romance
N.º de Registo: (3306)


OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Lucialima é um romance onde as múltiplas personagens nunca se cruzam. Maria Velho da Costa oferece-nos uma teia de histórias, que parecem contos, habitadas pelos traumas coloniais e pelos silêncios e receios vividos no período cinzento do antigo regime.

Num estilo muito próprio pela sua complexidade e inovação, MVC tece uma escrita com traços de erudição que desafia o leitor a ler devagar, com redobrada atenção, para poder descortinar o sentido do texto e captar a subtileza das diversas camadas de significação, presentes nas inúmeras referências. Nas seis partes que compõem o livro «Madrugada», «Manhã», «Meio-dia», «Três da Tarde», «Crepúsculo» e «Noite», a narrativa apresenta personagens distintas que, como já referi, nunca se encontram - Ramos, Mariana Amélia, Eugénia, Lima e Lúcia - e descreve episódios da vida de cada um, em sequências que se vão repetindo, de forma anacrónica. Ou seja, a narrativa inicia com «Madrugada», facilmente associada ao 25 de Abril, mas continua com outras referências de episódios anteriores.

A complexidade fragmentada e anacrónica, acrescida de uma fusão exímia do vivido e do imaginário, é susceptível de diversas interpretações e levam-me a intuir que a mensagem primordial é fazer coincidir as personagens num ambiente de isolamento, inacessível, mas desejado, numa oscilação ambígua entre o “eu” e os “outros”.
“ Eugénia levanta os olhos dos tecidos e suspira profundamente, do calor, do prazer de estar só. Só e em silêncio todo o dia. (…) A minha vida foi sempre pontuada por uma deliciosa relação com as pausas, o interior do silêncio dos interiores e das paisagens, a pulsação que as coisas tomam na ausência de outros, dos outros» (p. 271)

Maria Velho da Costa em Lucialima explora, na minha opinião, a solidão enquanto dimensão pessoal onde se reformulam opiniões, certezas e emoções a partir da memória (“Fiapos continuam a cruzar-se na memória”) e da imaginação, faculdades vitais que nos permitem (re)viver o passado e compreender o presente.




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