13 agosto, 2021

𝑳𝒆𝒗𝒂𝒏𝒕𝒂𝒅𝒐 𝒅𝒐 𝑪𝒉ã𝒐, de José Saramago

 



Autor: José Saramago
Título: Levantado do Chão
N.º de páginas: 366
Editora: Caminho
Edição 14ª: Fevereiro 1999
Classificação: Romance
N.º de Registo: (1039)

OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐⭐


Em A estátua e a pedra - o autor explica-se, texto que José Saramago apresentou numa conferência em Turim e que foi mais tarde publicado em livro, é-nos dito pelo próprio que Levantado do Chão (1980) é o primeiro livro do ciclo da estátua tendo o segundo ciclo, o da pedra, iniciado com  Ensaio sobre a Cegueira (p. 45).
Para que possamos entender esta metáfora, transcrevo a explicação do próprio autor: “(…) começou outro período da minha vida de escritor, no qual desenvolvi novos trabalhos com novos horizontes literários, dispondo portanto de elementos de juízo suficientes para afirmar com plena convicção que houve uma mudança importante no meu ofício de escrever. Não falo de qualidade, falo de perspectiva. É como se desde o Manual de Pintura e Caligrafia até a O Evangelho segundo Jesus Cristo, durante catorze anos, me tivesse dedicado a descrever uma estátua. O que é a estátua? A estátua é a superfície da pedra, o resultado de tirar pedra da pedra. Descrever a estátua, o rosto, o gesto, as roupagens, a figura é descrever o exterior da pedra, e essa descrição, metaforicamente, é o que encontramos nos romances a que me referi até agora. (…) Tive de entender o novo mundo que se me apresentava ao abandonar a superfície da pedra e passar para o seu interior, e isso aconteceu com o Ensaio sobre a Cegueira.” (pp. 33 e 34)

Partindo desta explicação, entende-se melhor a importância da obra Levantado do Chão, já com o estilo que se tornará muito próprio de Saramago. A história situa-se no Alentejo, descreve a vida de três gerações da família Mau-Tempo, desde os finais dos século dezanove até à Revolução de Abril de 1974 e relata a vida duríssima do campo, a miséria do povo, o poder dos latifundiários, da guarda republicana, a hipocrisia da igreja e as lutas camponesas para conseguir trabalho, redução de horário e um pagamento mais justo, a perseguição aos comunistas e a violência praticada quer nos postos da guarda quer nas prisões.
É um livro brilhante. Saramago de forma muito crítica retrata uma época política difícil, mas é nas pessoas, no seu quotidiano, nas suas lutas, nas suas dificuldades que ele centra toda a acção. E ao acompanharmos a família Mau-Tempo, vamos percebendo a evolução política e social do país, vamos entendendo a luta duríssima dos camponeses pelos seus direitos por uma vida mais digna e justa.

Saramago apresenta-nos uma escrita crítica, sensível, poética e perturbadora. Por exemplo, quando descreve um dos momentos mais cruéis, de tortura, recorre à metáfora do carreiro de formigas que surpreende, perturba e, simultaneamente, encanta o leitor.



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