Domingo, dia 15, a jornalista Paula Moura Pinheiro teve como convidada Germana Tânger, uma senhora de 88 anos, amante e divulgadora da poesia dos nossos grandes poetas. Ela fê-lo com grande à vontade, pois teve o prazer de privar com alguns vultos importantes da nossa literatura, como Almada Negreiros, José Régio, Vitorino Nemésio, entre outros.
O motivo da sua presença no programa "Câmara Clara" só podia ser, óbviamente, POESIA! A Poesia de Fernando Pessoa que comemora os 120 anos do seu nascimento.
Mas o que me leva a destacar este programa, de muitos outros que a Paula Moura Pinheiro nos oferece semanalmente (lamentando que seja divulgado na RTP2 , pois merece um maior destaque pela qualidade do programa e dos seus convidados) foi a emoção da senhora ao dizer o poema que aqui deixo.
Quem ama verdadeiramente a poesia, di-la simplesmente!
Aniversário
Fernando Pessoa
(Álvaro de Campos)
No TEMPO em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.
No TEMPO em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.
Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,
O que fui de coração e parentesco.
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui...
A que distância!...
(Nem o eco...)
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!
O que eu sou hoje é como a umidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhaslágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim...
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!
Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos,
O aparador com muitas coisas — doces, frutas o resto na sombra debaixo do alçado —,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...
Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!...
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...
in, Poesia, Álvaro de Campos
Assírio & Alvim
O que eu queria era conseguir encontrar um vídeo da senhora a dizer o poema, momento que me conseguiu arrepiar.
ResponderEliminarJá tentei no site da camara clara, youtube, google, mas nada.
se entrar em Câmara clara:
ResponderEliminarhttp://www.dois.tv/programas/camaraclara/
à frente da data 15 de Julho está o símbolo da Cãmara de víde é clicar para visionar a emissão e aí poderá ouvir de novo o poema. Como ainda não o consegui no youtube. Contento-me com a repetição da emissão.
Obrigado pelo seu Blog.
ResponderEliminarNão é 15 de Julho, mas do mês de Junho: http://ww1.rtp.pt/doistv/programas/camaraclara/?=
FranzE
Sim, tem razão. Obrigada pela correcção.
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