17 junho, 2024

𝑨 𝑭ú𝒓𝒊𝒂, Silvina Ocampo

 


Autora: Silvina Ocampo
Título: A Fúria
Tradutor: Guilherme Pires
N.º de páginas: 235
Editora: Antígona
Edição: Maio 2021
Classificação: Contos
N.º de Registo: (3338)



OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐


Pode um só livro provocar ao mesmo tempo perplexidade, inquietação e deslumbramento? Sim, pode. De facto, o mal, a crueldade, a loucura, a fúria alimentam as 34 histórias que integram A Fúria. O próprio Jorge Luís Borges no prefácio alegou essa perplexidade ao referir: “ Nos contos da Silvina Ocampo há uma particularidade que não consigo compreender, o seu estranho amor por uma certa crueldade inocente ou oblíqua”.

A forma como Silvina Ocampo, crua e naturalmente, narra os factos deixa transparecer a sua visão crítica sobre o carácter de certas pessoas, sobre a família, sobre a precariedade de alguns bairros de Buenos Aires.
Ao servir-se de crianças, quer como vítimas quer como perpetradoras de violência, de crueldade, provoca no leitor um profundo desconforto; o recurso ao fantástico e à efabulação eleva a qualidade da narrativa, mas também a inquietação do leitor; o relato de uma história desconcertante, aparentemente banal, com um final abrupto e nem sempre explícito causa perturbação; a subversão da normalidade pela apresentação de acontecimentos imprevisíveis e grotescos revela estranheza.

Contudo, a escrita de Silvina Ocampo seduz o leitor, a imprevisibilidade dos factos mantém-no alerta, a monstruosidade de algumas personagens agudizam o seu interesse e simultaneamente a raiva, a sinistralidade do seu universo criativo confunde e cativa o leitor.

Em conclusão, gostei imenso de descobrir esta autora. O excesso, a intensidade e o surrealismo, mas, também, o distanciamento e o humor presentes suscitam, numa primeira abordagem, perplexidade e desconforto, mas com a continuação da leitura descobrimos o deslumbramento. Gostei sobremaneira da sua capacidade de síntese nas narrativas e na utilização da fantasia para tornar possível o aparentemente impossível, para tornar bizarro e grotesco o vulgarmente comum.



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