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05 abril, 2024

𝑶𝒔 𝑴𝒆𝒎𝒐𝒓á𝒗𝒆𝒊𝒔, de Lídia Jorge

 

Autora: Lídia Jorge
Título: Os Memoráveis
N.º de páginas: 342
Editora: D. Quixote
Edição (3.ª): Maio 2014
Classificação: Romance
N.º de Registo: (BE)



OPINIÃO ⭐⭐⭐⭐⭐


Em Os Memoráveis, a protagonista, Ana Maria Machado, repórter da CBS, em Washington, é convidada a fazer um documentário sobre a Revolução dos Cravos de 1974. Ela e dois amigos jornalistas, residentes em Lisboa, revisitam 30 anos depois, essa data memorável com o intuito de escrever o argumento para uma séria intitulada “A História Acordada”.

O regresso ao passado é recuperado através de entrevistas realizadas a algumas das figuras ilustres de abril que ficaram imortalizadas numa fotografia tirada, aquando de um jantar no restaurante Memories. Esta fotografia funciona como personagem aglutinadora ao longo do romance, já que corporiza uma memória colectiva e simbólica da revolução.

É, assim, sob o ponto de vista de três jovens, que não viveram a ditadura, que a narrativa se desenvolve, questionando o passado inacabado em confronto com o presente desencantado. Uma a uma as figuras selecionadas vão ser convidadas a responder às várias questões planeadas “Onde estavam? O que sentiram na altura? Que balanço fazem agora, passados trinta anos? Qual a melhor imagem a falar sobre a hora, o lugar e o papel que desempenharam naquela tão esperada madrugada. Que guardam de tudo o que aconteceu?” (p. 68)


Todos os entrevistados recriam a glória da revolução, o entusiamo da queda do regime, a união dos militares, mas também a desilusão do esquecimento, o oportunismo de alguns, a dificuldade da construção de uma democracia estável.

No interior da “Viagem ao Coração da Fábula”, entrelaça-se uma outra viagem mais íntima. Esta consiste na revelação da falta de entendimento e de incompreensão entre a narradora Ana Maria Machado e o seu pai António Machado, também ele jornalista de referência na época, e votado, como os outros ao abandono. Esta relação constrói-se nos silêncios e segredos mútuos; nos questionamentos e nas tentativas de aproximação e de recuperação de um passado mais carinhoso.

Lídia Jorge extraiu da História personagens e factos para recriar a sua estória. Ao evocar uma data gloriosa e promissora de esperança e liberdade, não descurou os desencantos, as dificuldades e sobretudo o perigo de esquecer o passado. Num perfeito cruzamento de realidade e ficção, a autora convoca o leitor a formular as suas próprias reflexões, a estabelecer relações com os protagonistas de Abril; a distinguir sonho e desilusão; a reviver episódios desse dia memorável; a exaltar valores de gratidão, de solidariedade e de amizade.

Ao comemorarmos, este ano, os 50 anos de Liberdade é urgente repensar, refletir sobre o caminho que queremos continuar a percorrer. É urgente lembrar esse “dia inicial inteiro e limpo/ Onde emergimos da noite e do silêncio.” (Sophia)



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